As redes sociais que a gente mais conhece estão em crise. Será então que elas vão acabar? A fase é de profunda transformação.
Tem notícia disso na imprensa do mundo todo. Facebook e Twitter em decadência de usuários, com mudanças constantes. .
. Instagram repensando estratégias para competir com o TikTok. E nós, no meio desse fogo cruzado, decidindo: para que lado vai a nossa atenção?
Eu falei com especialistas para entender se essa turbulência significa uma ruptura histórica: estaríamos no começo do fim das redes sociais? É difícil falar em fim de uma coisa tão usada como as redes sociais, até porque existem muitas. Mas olha.
. . tudo indica que vem por aí pelo menos uma temporada de incertezas, adaptações.
E que pode sim representar o declínio dos modelos de plataformas que os usuários mais antigos têm com referência. Aquela história de um app para ficar só ali vendo as fotos dos amigos, onde o vizinho está passando férias, sabe? Isso parece estar se tornando passado.
A avaliação é de todos os pesquisadores com quem eu conversei. E eles estão fazendo algo aparentemente simples: ler os sinais, que estão por toda parte. Os números, por exemplo.
Projeções desta plataforma internacional de pesquisa são de que o Twitter e Facebook, pioneiros do setor, já estavam e vão continuar perdendo usuários nos próximos anos. Em 2023, 2 milhões de meio de pessoas podem abandonar o Facebook só na América Latina. Brasil e México serão responsáveis por 60% dessa perda.
O Twitter, na luta para se reequilibrar após a compra por Elon Musk, também deve enfrentar um êxodo de perfis ativos: mais de 30 milhões a menos no mundo todo até 2024, quase 10% do total de usuários. Nos países latino-americanos, a queda estimada é de 5,4 milhões de inscritos. A gente já já vai falar de Instagram e TikTok, onde a situação é diferente.
Mas antes é preciso explicar por que estudos projetam essa debandada do Facebook e do Twitter. E como isso dialoga com a nossa pergunta ali do início: as redes sociais estão em colapso? Qual o futuro delas?
Bom. . .
dois aspectos, na avaliação de especialistas, resumem o problema: falhas no combate à desinformação e negligência com a privacidade de dados. O primeiro se aplica mais ao Twitter; o segundo, ao Facebook. Você deve se lembrar do escândalo que foi o vazamento de informações pessoais de milhões de usuários do Facebook há alguns anos.
Lançou dúvidas sobre a reputação da empresa responsável, a Meta. O mesmo aconteceu com o Twitter ao longo da última década – embora o motivo tenha sido outro. Diferentes analistas sempre enxergaram o Twitter como um espaço importante de debate, mas onde também circulam teorias da conspiração perigosas – ou mentiras mesmo.
Como essa do ex-presidente Jair Bolsonaro falando em tratamento precoce para covid. Tudo isso com o passar do tempo foi cansando as pessoas, minando a confiança de quem compartilha esses ambientes digitais. E vieram concorrentes (mostrar).
O mercado se ampliou, novos serviços de mídia digital foram lançados, e nós nos transformamos em um público mais exigente, que não dedica atenção a qualquer coisa – especialmente após uma exaustiva pandemia. Foi o que me disse a escritora e pesquisadora Zizi Papacharissi, que dá aulas no departamento de comunicação da Universidade de Illnois, em Chicago. Pois é.
Nós não somos mais os mesmos – e as redes? Será que mudaram o suficiente para se adequar às nossas necessidades de hoje? Esse é um ponto fundamental.
Estamos falando até agora mais de serviços criados há muito tempo: Facebook em 2004, e Twitter logo depois, em 2006. Aquela sociedade onde eles surgiram não existe mais. Os primeiros Iphones, por exemplo, símbolos da revolução dos smartphones, começaram a ser vendidos em 2007.
Desde então, já apareceram gerações e gerações deles, internet das coisas, inteligência artificial. Recursos que 20 anos atrás eram impensáveis ou só existiam na ambição de visionários. Em 2023, as expectativas e vontades são outras.
Só que a gente não pode ser ingênuo a ponto de pensar que essas gigantes da tecnologia ficaram de braços cruzados esse tempo todo – inclusive durante a pandemia, em que foram fundamentais para nossa comunicação. Não mesmo. O Facebook não é mais um site apenas para se conectar com os amigos, contar e mostrar momentos da vida, como lá atrás; nem o Twitter um mero diário com o humor ou a crítica do dia.
Ambos se tornaram lugares virtuais complexos, com mais destaque para vídeo, mais dinâmicos, corporativos, privilegiando inclusive conteúdos de publicidade. Tudo, de certa maneira, para salvar o próprio modelo de negócio. O que não é nenhuma garantia de que vão recuperar a audiência perdida, na opinião da professora da USP Elizabeth Saad, que coordena um grupo de pesquisas sobre sociedade digitalizada.
O que a gente precisa se perguntar é se isso basta para dizer que o Facebook ou Twitter vão deixar de existir. Será que indícios de decadência, redução de protagonismo e mudanças de comportamento do usuário servem como parâmetro para condenar ao ostracismo produtos de corporações tão poderosas? O Instagram, por exemplo, virou o jogo.
Incorporou características do concorrente TikTok e, junto com ele, está entre as redes sociais mais promissoras da América Latina. O TikTok, aliás, é a que vai crescer mais rápido. O Instagram, quando surgiu em 2010, era praticamente uma galeria de fotos online.
Hoje, um misto de vídeos, fotos e recomendações de serviços e conteúdos de influenciadores. Tudo baseado no perfil de cada um e na rede de contatos. Uma baita evolução!
Mas podia ter ficado para trás. O avanço só aconteceu, segundo especialistas, por causa de novas possibilidades da tecnologia e da pressão do TikTok, que veio em 2016, e rapidamente se popularizou entre os jovens com vídeos curtos. .
. músicas. .
. Onde eu estou querendo chegar é que não se pode tão facilmente preparar o obituário das redes sociais mais populares, porque elas têm a chance de se reinventar. Em vez de morrer, elas podem evoluir, se transformar.
A ruptura é real e vai ficar mais evidente nos próximos anos. Eu volto a perguntar: é o fim das redes sociais? Bom, essa fase de transição vai pôr em xeque as big techs – não as redes sociais como espaços públicos de interação online.
Uma coisa não tem a ver com a outra. Foi o que me disseram os pesquisadores e que é uma perspectiva interessante pra gente refletir sobre o assunto. Vou explicar melhor.
Em geral, quando falamos em redes sociais, falamos de empresas que dominam o mercado: Meta, dona do Instagram, Facebook e Whatsapp. . .
Aí tem Twitter. . .
TikTok. . .
YouTube, que é propriedade da Google. . .
para ficar em alguns exemplos mais conhecidos. As empresas, por mais indispensáveis que se apresentem, podem sim ir à falência, demitir funcionários, como ocorreu com o Twitter. No pior dos casos, cair no esquecimento, como o Orkut.
Porém, o conceito que elas difundiram, o que a gente chama de rede social, esse lugar onde nós de alguma maneira nos relacionamos uns com os outros há anos na internet, esse não deve desaparecer. Os provedores talvez mudem. Só que a tendência, na verdade, é que cada vez mais a nossa vida se intensifique nesse aspecto bidimensional: uma fusão entre o que experimentamos como realidade física e virtual - com a virtualidade ganhando protagonismo.
Qual empresa vai dominar no futuro. . .
ou que novos serviços serão oferecidos. . .
é o que a gente fica querendo saber. A Zoetanya Sujon tem alguns palpites. Ela é autora do livro A Era da Mídia Social, publicado em inglês, e coordena o London College of Communication, no Reino Unido.
As empresas atualmente hegemônicas podem perder força, até acabar, mas as redes sociais não. É mais ou menos isso. Elas apenas vão ter quem sabe outros donos, se adaptar aos novos tempos, incorporar novas ferramentas.
Serão também menos sociais porque vão estar dominadas por recomendações, posts patrocinados e de influenciadores, que é o que vai fazer o dinheiro circular. Especialistas apostam ainda no surgimento constante de redes com grupos menores, onde os membros compartilham interesses. .
. e numa maior presença da realidade aumentada ou inteligência artificial nas interações. Pode ser na forma de uma máquina que conversa com a gente, como o chaGPT.
Talvez algo que ainda virá. São muitas as possibilidades. Fato é que, para isso acontecer, para as gigantes da tecnologia conseguirem se manter onde estão.
. . e pra novas surgirem.
. . os especialistas são categóricos: a regulação é inevitável.
Há um consenso de que a gente precisa confiar naquilo que a gente vê numa rede social, por mais democrática que ela precise ser, por mais liberdade de expressão que o usuário exija. É a opinião de todos os pesquisadores com quem eu conversei, incluindo o Nicolo Zingales, professor no curso de direito e regulação da informação na FGV Rio. É inegável que as redes sociais vêm sendo usadas de forma mal-intencionada para desinformação.
Em 2018 no Brasil, ajudaram a eleger um populista de extrema direita. E em 2022 estavam no centro do jogo político nacional. Foram ferramentas de preparação, segundo as autoridades brasileiras, para os atos golpistas de 8 de janeiro deste ano.
Tudo isso levou o Brasil a se apressar no debate do PL das Fake News. Um instrumento para colocar freio nos discursos de ódio e nas notícias falsas. A União Europeia aprovou em 2022 justamente uma lei com essa finalidade.
Chama Lei de Serviços Digitais. Uma forma de proteger os usuários, a liberdade de expressão e as oportunidades para negócios, como a própria presidente da Comissão Europeia falou na época. E essa parece ser uma tendência global.
Um caminho sem volta se as big techs por trás das redes sociais mais populares do mundo – ou as nem tão bigs assim – quiserem continuar existindo.