Prezados amigos que acompanham o meu canal do YouTube, começamos mais uma aula da série "A respeito do comentário de Santo Tomás de Aquino ao Pai Nosso". Hoje trataremos do quarto pedido do Pai Nosso, que é "o pão nosso de cada dia nos dai hoje". E, como foi feito anteriormente, como foi feita a correspondência à luz de Santo Agostinho entre os sete dons do Espírito Santo, os sete pedidos do Pai Nosso e as sete bem-aventuranças em São Mateus, e, conforme vocês viram na aula retrasada, quando eu trouxe uma obra sobre os dons do Espírito Santo, é preciso esclarecer realmente do que se trata, para que se tenha a clara compreensão do que Santo Tomás aproveita de Santo Agostinho ao comentar o Pai Nosso e no que ele inova.
Vale a pena falar mais algumas coisas a respeito dos dons, ou seja, repisar algo do que já foi dito sobre os dons do Espírito Santo e trazer alguns acréscimos. Então, a primeira coisa a reiterar é que os dons são disposições habituais permanentes, distintas das chamadas virtudes infusas. Esta distinção entre dons do Espírito Santo e virtudes infusas, ou seja, aquelas que o homem não adquire por esforço próprio, mas que recebe de Deus, é muito importante para Santo Tomás e alguns autores da escola neotomista, como o grande Padre Garrigues Lagrange.
Na sua obra "As Três Idades da Vida Interior", que agora está bem traduzida para o português, o Padre Garrigues, opinião o principal teólogo tomista do século XX, começa a ter toda a sua obra traduzida. Aqui vale elogiar a "Cultor de Livros" pela qualidade editorial que está dando ao Padre Garrigues. Então, ele mesmo, a certa altura deste primeiro tomo da sua obra clássica, "As Três Idades da Vida Interior", assinala, salienta e distingue entre dons do Espírito Santo e virtudes infusas, repito, aquelas que não são adquiridas por esforços humanos, mas que são recebidas do céu.
Todavia, com a seguinte advertência, que eu já fiz em algumas dessas aulas anteriores sobre o Pai Nosso: uma mesma virtude pode ser adquirida ou infusa. Por exemplo, a virtude da coragem pode ser ou adquirida ou infusa. E entre as coisas que eu pus aqui na minha colinha temática, vale ressaltar que esses dons, como disposições habituais permanentes distintas das virtudes infusas, são necessários à salvação, segundo Santo Tomás.
Conforme eu disse na aula anterior, Santo Tomás, nisto, evoluiu no seguinte sentido: nas obras de juventude, como em seu comentário às Sentenças de Pedro Lombardo, ele não diz que os dons são necessários à salvação. Porém, na Suma Teológica, obra de maturidade, ele destaca isso com toda a ênfase. Ele torna os dons ao homem dócil às inspirações divinas a agir; e aqui a expressão é de Santo Tomás: "prompte obediens espíritu sancto", prontamente em obediência ao Espírito Santo.
Os dons tornam-nos, digamos assim, docilmente passivos a esta ação divina. Então, trata-se de uma docilidade passiva. A analogia quem faz é o Padre Garrigues, em sua obra, a de um barco à vela.
O barco à vela está com as suas velas içadas, e as velas ajudam a navegação de acordo com a direção do vento e, também, é claro, de acordo com a meta do navegante e com todas as suas técnicas, as técnicas de que ele faz uso para chegar ao fim visado. Com a diferença que, no caso dos dons, enquanto são recebidos docilmente pelo homem, eles ordenam a criatura racional humana à salvação. Então, a diferença nesta analogia, o que há de semelhança, é esta docilidade, e o que há de diferença é que, no caso dos dons, quem define o fim é Deus.
E, só para não perdermos o fio da meada, antes de irmos ao texto de Santo Tomás, eu fiz questão de apontar aqui, numa espécie de cadinha ontológica, três coisas: três potências distintas ou três modos de atualização e de inteligíveis na nossa alma, que desaguam em diferentes realidades. Nós, como criaturas humanas, temos a luz da razão natural; ou seja, nós já temos na nossa forma entitativa a capacidade de apreender o ser das coisas que contemplamos. Apreender, de modo assimilativo, conhecer é assimilar o ser; e, materialmente, o ser das coisas.
Então, a luz natural da razão produz, na ordem moral, as virtudes adquiridas. Luz natural da razão, virtudes adquiridas. A razão iluminada, esta mesma razão sublinhada pela fé, tem a correspondência com as virtudes infusas.
Então, luz da razão natural, virtudes adquiridas com esforço; luz, razão iluminada pela fé, virtudes infusas. Esta é a correspondência e a efusão do Espírito Santo, que gera os dons e imprime os dons, os sete dons, na alma humana. Então, no caso da virtude adquirida, o fim é a vida moral; o fim visado é tornar o homem bom.
Então, o homem bom é o ponto de deságue, né, deste movimento de aperfeiçoamento humano no plano natural. O homem fiel na vida religiosa é o objeto, por sua vez, das virtudes infusas. E a vida religiosa, não custa lembrar, ela é uma virtude.
A religião, segundo Santo Tomás, é uma virtude moral e, das virtudes morais, é aquela que mais se aproxima das virtudes teologais, porque, pela vida religiosa, o homem presta o culto devido a Deus. E, por fim, o Espírito Santo, no caso dos dons, gera o homem santo: é vida de perfeição espiritual. Para não perdermos o foco, o homem bom no plano moral é o fim da vida de virtudes adquiridas; o homem fiel na vida religiosa é o fim da virtude infusa; e, por fim, o homem santo, vida de perfeição espiritual, a santidade é o fim desta ação do Espírito Santo na alma.
E outra coisa que. . .
O que o Gargo diz é que os dons dirigem outros dons. Há uma hierarquia, então, entre os sete dons do Espírito Santo. Esta hierarquia culmina no Dom da Sabedoria: a sabedoria é o principal dos dons do Espírito Santo e ela começa, como vocês já viram, no temor de Deus.
O maior deles é a sabedoria; os outros são, eu anotei aqui, instrumentais em relação a este Dom da Sabedoria. Todos os dons, de alguma maneira, se coordenam entre si em ordem ao Dom da Sabedoria, e este é, por meio deste, melhor dizendo, que o homem fará uma imersão na vida espiritual profunda e, se levar a cabo, se for dócil neste sentido, de maneira perfeita, ele já começa a encaminhar-se neste mundo de contingências à Pátria Celeste. E outra coisa que Santo Tomás afirma é que todos os dons, estes mesmos que no Pai Nosso estão correlacionados a cada um dos pedidos, estão conectados; eles estão em conexão com a virtude da caridade, que, de todas as virtudes — das três teologais e das quatro cardeais — é a mais importante de todas.
Santo Tomás é enfático ao dizer que a caridade empresta sua forma a todas as demais virtudes; todas as demais virtudes, sem este molde espiritual da caridade, tendem a desfazer-se rapidamente. E aqui uma frase do próprio Gagu, que eu anotei: depois eu vou ler aqui um trechinho desta obra magnífica que é "As Três Idades da Vida Interior". Abramos aspas: “As graças das virtudes e dos dons — a graça, perdão, das virtudes e dos dons — é mais perfeita que o dom de milagres, o dom de línguas e o dom da profecia, porque estes são, de certa forma, exteriores e não necessariamente implicam uma união efetiva com Deus.
Então é melhor estar na graça do que ter o dom da profecia, utilizá-lo e depois cair em desgraça. ” Então a graça atual, que é importantíssima, é com ela e nela que a vida de santidade encaminha-se para o seu ápice, o seu cume. Eu estou aqui com o livro do Garrigues; ele faz uma correspondência importantíssima: os dons, o que cada um dos dons aperfeiçoa.
Então, nós temos as duas potências superiores da alma, a inteligência e a vontade, e temos como o plano inferior da nossa forma, a sensibilidade. Então, os dons aperfeiçoam, diz o Gigu: no caso da inteligência, iluminada pela fé, e aí ele vai dizer para que serve cada um. Para a penetração da verdade, nós recebemos o Dom do Entendimento.
Isto, no plano da fé, é para julgar as coisas divinas; nós recebemos o Dom da Sabedoria para julgar as coisas criadas; recebemos o Dom da Ciência para julgar as nossas próprias ações, e as alheias também, diga-se, recebemos o Dom do Conselho. Então, para a penetração da verdade, o Dom do Entendimento, a virtude correspondente teologal é a fé; para julgar as coisas divinas, o Dom da Sabedoria, a virtude correspondente à caridade, para julgar as coisas criadas; o Dom da Ciência, a virtude correspondente é a da esperança, para julgar as nossas próprias ações; o Dom do Conselho, a virtude, neste caso, cardinal, é a prudência. E, no plano da vontade e da sensibilidade, e relativamente ao culto devido a Deus, temos o Dom da Piedade.
No plano da religião, que é a virtude moral, vocês já viram em aulas anteriores desta série que pedido está relacionado a que pedido do Pai Nosso está relacionado com o Dom da Piedade — contra o medo do perigo. O Dom da Fortaleza, ainda no plano da religião, e aqui é o caso de muitos mártires tão conhecidos da história do cristianismo. Então, relativamente ao culto de Deus, Dom da Piedade, isso na vontade, contra o medo do perigo; na vontade e em parte na sensibilidade, já que o perigo nos afeta sensivelmente; Dom da Fortaleza, ainda no plano religioso, contra as concupiscências desregradas.
Dom do temor de Deus, a virtude cardinal correspondente é a virtude da temperança. E aqui vale ler — vou ler um trechinho do Garrigues, de Santo Tomás, e vocês vão ver que maravilha — só um trechinho: “Os dons são necessários para a salvação. Por fim, se os dons são necessários para a salvação, segue-se que eles estão em conexão com a caridade, segundo a palavra de São Paulo aos romanos, na epístola aos romanos 5:5: 'O amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo Espírito Santo que nos foi dado.
'” O Espírito Santo não vem a nós sem os seus sete dons que acompanham, assim, a caridade, e que, em consequência, são como ela, perdidos pelo pecado mortal. Eles pertencem, assim, ao organismo espiritual. A expressão "organismo espiritual" é reiterada pelo padre Gigu em diferentes obras.
Eles pertencem, assim, ao organismo espiritual da graça santificante, que, por essa razão, é chamada "graça das virtudes e dos dons". E aqui ele cita Santo Tomás, Suma Teológica, Tercia Parte, questão 62, artigo 6: “Não se concebe, pois, que um cristão tenha uma elevada caridade, aquela que convém à perfeição, sem ter, ao mesmo tempo, os sete dons do Espírito Santo em grau proporcionado, embora, talvez, nele os dons do entendimento e da sabedoria sejam exercidos de forma menos contemplativa que em outros e mais prática, como acontecia, por exemplo, com São Vicente de Paulo e com tantos outros santos chamados a dedicar-se ao próximo nas obras da vida ativa. ” Então, outra informação importante é que os dons contemplam tanto a vida ativa como a contemplativa.
Cada um de nós tem uma vocação específica e ser dócil, passivamente dócil, aos dons, entre outras coisas, ajuda-nos a descobrir qual é a nossa vocação. Esta graça é. .
. perdão, trataremos mais adiante da docilidade ao Espírito Santo e das condições que ela exige na terceira parte desta obra, mas podemos perceber desde já o valor desse organismo espiritual que. .
. É em nós a vida eterna começada, mais preciosa que a visão que a vida física, que o uso da razão, no sentido em que a perda do uso da razão no justo não lhe tira esse tesouro que nem mesmo a morte nos pode roubar. Esta graça das virtudes e dos dons é mais preciosa também que o dom dos milagres, que o dom das línguas ou, eh, da profecia; pois estes são apenas sinais sobrenaturais.
Como eu disse, de certa forma, exteriores. E eu, aliás, fiz publicar no Brasil, pela Editora Concreta, a obra de profecia sobre a profecia de Santo Tomás, que eu indico a vocês. Eu não sei se ela ainda está à venda.
Creio que sim. Basta fazer uma busca aí pela internet que, certamente, quem o fizer encontrará, eh, em dois volumes, essa obra que eu fiz editar aqui no Brasil sobre a profecia. Então vamos lá, eh, vou achar aqui o texto.
Tô aqui com um livrinho que é a base. Eu tenho tanto a edição latina, evidentemente, como outras traduções, mas estou valorizando a nossa tradução recente para o português que foi levada a cabo pela Editora, que é da minha biblioteca católica. Então, já falamos no primeiro artigo, já falamos do prólogo do Pai Nosso, já falamos do primeiro pedido do Pai Nosso: "santificado seja o vosso nome", do segundo: "vem a nós o vosso reino", do terceiro: "seja feita a vossa vontade, assim na Terra como no céu", e agora trataremos do quarto pedido: "o pão nosso de cada dia nos dai hoje".
Vamos a Santo Tomás. Muitas vezes acontece de alguém, por causa do seu grande conhecimento e sabedoria, tornar-se tímido. Provavelmente, Santo Tomás estava falando de si mesmo; está aqui fazendo alusão a si mesmo: ele, que era reservado, e muitos o tomavam por tímido.
E eu acredito mais essa suposta timidez a uma atitude profunda de decoro, de modéstia. Repito a frase: muitas vezes acontece de alguém, por causa de seu grande conhecimento e sabedoria, tornar-se tímido. E por isso é necessário ter coragem no coração.
Que bela expressão! É preciso ter coragem no coração para não esmorecer diante da necessidade. Abramos aspas aqui com Santo Tomás para Isaías 40:29: "O Senhor é que dá força ao fatigado e que multiplica a fortaleza e o vigor daqueles que não são fortes.
" Fecha aspas. Essa coragem, porém, é dada pelo Espírito Santo. Abramos aspas para Ezequiel: "Entrou em mim o espírito e me firmou sobre os meus pés" (Ezequiel 2:2).
O Espírito Santo dá essa coragem para que o coração do homem não fale por medo de lhe faltar o necessário. Mas acredite firmemente que tudo o que é necessário será provido por Deus. Deus proverá; é um preceito, não uma ordem dada pelo Senhor ao modo de conselho, né, para que nós não nos preocupemos demasiadamente com o que vamos comer, vestir, etc.
Ou seja, cada dia com a sua preocupação. Muitas pessoas são esmagadas no presente pelo passado, do qual não conseguem livrar-se, e pelo futuro, pelos futuros que imaginam muitas vezes de maneira patológica. Por isso, o Espírito Santo, que dá essa coragem, nos ensina a pedir: "o pão nosso de cada dia nos dai hoje".
Por isso, é chamado de Espírito de Fortaleza. Note-se, porém, que os três pedidos anteriores — isso é muito importante termos em vista — rogam por coisas espirituais, as quais começam neste mundo, porém só se completam na vida eterna. Quando pedimos que o nome de Deus seja santificado, pedimos que a santidade de Deus seja conhecida; quando pedimos que o reino de Deus venha a nós, pedimos que sejamos partícipes da vida eterna; e quando oramos para que a vontade de Deus seja feita, pedimos que a vontade dele seja cumprida em nós.
Todas essas coisas, embora comecem neste mundo, não podem ser obtidas perfeitamente senão na vida eterna. E continua Santo Tomás: portanto, convinha pedir algumas coisas necessárias que pudessem ser perfeitamente obtidas nesta vida presente. Então, como em tudo há hierarquia, não poderia ser diferente com a oração dominical, a oração que o Senhor nos ensinou, eh, a coisas espirituais e materiais.
Devemos preferir aquelas a estas sempre, sem, no entanto, pensar ou imaginar que estas coisas, as coisas do mundo, são desimportantes. Elas só têm uma importância relativa em sua relação com aquelas que têm valor absoluto em si mesmas, porque terão o seu complemento na vida eterna. Por isso, o Espírito Santo nos ensinou a pedir coisas necessárias à vida presente, que são perfeitamente obtidas aqui.
Ao mesmo tempo, isto serve para mostrar que também as coisas temporais são providenciadas por Deus. Neste sentido, dizemos: "o pão nosso de cada dia nos dai". Aqui, na tradução do Gadot, está na segunda pessoa do singular, "nos dá hoje", mas vou manter aqui como se na leitura, como nós rezamos, na segunda pessoa do plural: "nos dai hoje", só para, né, não gerar confusão na cabeça de desavisados.
Por essas palavras, Cristo ensina-nos a evitar cinco pecados que costumamos cometer por causa do desejo das coisas temporais. Aí vamos ver uma vez mais, e como Santo Tomás, nestes comentários, alcança uma espécie de cume contemplativo espiritual. Então, são cinco os pecados que as pessoas costumam cometer por causa das coisas temporais.
O primeiro pecado é que o homem, por um apetite desmedido, busca coisas que excedem o seu estado e condição, não se contentando com o que lhe convém. E aqui então, cobiça: digo eu, se deseja roupas, não quer roupas de soldado, embora seja soldado, mas de conde; não quer as vestes de clérigo, se é clérigo, mas as de bispo. Este vício, a cobiça, afasta os homens das coisas espirituais na medida em que o seu desejo se apega demasiado às coisas temporais.
O Senhor nos ensinou. A evitar esse vício, ensinando-nos a pedir apenas o pão. Isto é o necessário para a vida presente, de acordo com a condição de cada um.
Tudo isso é representado pela ideia de pão. Portanto, não nos ensinou a buscar alimentos delicados, diversos e requintados, o que faz o glutão, o vício capital, pecado capital da gula. Ele não apenas se refere ao excesso no comer, como também à busca de comidas sofisticadas.
Então, repito a frase: portanto, não nos ensinou a buscar alimentos delicados, diversos e requintados, mas o pão, sem o qual o homem não pode viver, porque é comum a todos. Abre aspas: "O essencial da vida do homem é água e o pão" (Livro do Eclesiástico). Tendo, pois, os alimentos necessários e com que nos cobrir, contentemo-nos com isso (1 Timóteo 6:8).
Então, o primeiro dos cinco pecados que costumamos cometer por causa das coisas temporais é a cobiça. O segundo vício é que alguns, na aquisição dos bens temporais, prejudicam e defraudam os outros. Então, fraude e rapina são o segundo tipo de pecado que se costuma cometer, ou melhor, que costuma cometer quem está buscando mais do que o pão, no sentido de buscar coisas temporais excessivas.
Este vício é muito perigoso, diz Santo Tomás, porque é difícil devolver os bens roubados. Ainda assim, esse pecado não é perdoado a menos que se restitua o que foi tomado, segundo Agostinho. E aqui ele cita uma carta de Santo Agostinho, a carta 153.
O Senhor nos ensinou a evitar esse vício, ensinando-nos a buscar o pão, o nosso pão, e não o alheio. Que coisa simples e funda ao mesmo tempo! O Senhor nos ensinou a evitar esse vício, ensinando-nos a buscar o nosso pão e não o alheio, pois os ladrões não comem o pão que é seu, mas o de outros.
Então, o primeiro vício, pecado que se comete por causa das coisas temporais, é a preguiça; coviça, perdão. O segundo é fraudes ou rapinas. O terceiro é a preocupação excessiva, ou seja, a solicitude excessiva com as coisas temporais — uma busca desenfreada, frenética, às vezes sempre pecaminosa.
Aqueles que nunca estão satisfeitos com o que têm, mas sempre querem mais, o que é desmedido, pois o desejo deve ser moderado de acordo com a necessidade. No meu livro de aforismos, "Provérbios do Abismo", que será publicado em breve, há uma máxima que é a seguinte: "Quem não se contenta com pouco, não se contenta com coisa nenhuma; não deixe nem a pobreza e nem as riquezas" (Livro dos Provérbios). "Dá-me, só não me dês nem a pobreza nem a riqueza; dá-me somente o que for necessário para viver" (Provérbios 30:8).
Então, esse vício da preocupação excessiva é realmente mais comum. Santo Tomás salienta isto não só na obra que estou comentando, como em várias outras. O quarto vício é a voracidade desmedida, aqueles que querem consumir em um dia o que seria suficiente para vários dias.
E estes pedem não o pão de cada dia, mas o de dez dias. E, por gastarem demais, consomem tudo. Então, o pedido do Pai Nosso é simples, é para o aqui e agora: o pão para os demais dias deixamos essa preocupação.
Não é que nós não devamos olhar para o futuro, mas porque no futuro, claro que devemos olhar para o futuro, já presumimos que haverá obrigações a cumprir, necessidades a suprir, porém com tranquilidade e não com o coração turbado. Abre aspas: "Passando o tempo a beber e a pagar escotes, se arruínam" (Livro dos Provérbios 23:21). Outra citação agora que Santo Tomás faz do Livro do Eclesiástico: "O operário dado ao vinho não enriquecerá.
" Então, quarto vício: voracidade sem freio. O quinto vício, este é gravíssimo: ingratidão, quando alguém se orgulha de suas riquezas e não reconhece que tudo que tem vem de Deus. Isso é péssimo, porque tudo o que temos, seja espiritual, seja temporal, vem de Deus.
Abre aspas: "Tudo é teu e o que recebemos de tua mão, isso mesmo te oferecemos. " Fecha aspas. Por isso, para remover esse vício, dizemos: "Dá-nos o pão nosso", a fim de que saibamos que tudo que é nosso vem de Deus.
Podemos aprender uma grande lição a partir disso, diz Santo Tomás. Às vezes, alguém tem muitas riquezas e delas não tira proveito algum, apenas malefícios espirituais e temporais. Com efeito, algumas almas pereceram por conta das riquezas.
E aqui é uma citação do Livro do Eclesiástico: "Ainda outro mal que eu tenho visto debaixo do sol" — (Livro do Eclesiastes). "Um homem a quem Deus deu riquezas, bens e honra, nada falta a sua alma de quantas coisas deseja. Deus não lhe concedeu faculdade para comer delas, mas virá um estranho que há de devorar tudo.
" Fecha aspas. "Ainda há outra dolorosíssima miséria que eu vi debaixo do sol: as riquezas conservadas para a ruína de seu dono" (Eclesiastes 5:1). Volta a Tomás: devemos, portanto, pedir que as nossas riquezas sejam úteis para nós, e pedimos isso quando dizemos: "Dá-nos o pão nosso.
" Isto é fazer com que nossas riquezas nos sejam úteis: "O seu pão da iniquidade nas suas entranhas se converterá interiormente em féu de áspides" (Livro de Jó 20:14-15). "Vomitará riquezas que devorou, e Deus lhas fará sair das entranhas. " Outro vício que envolve as coisas do mundo é essa preocupação excessiva.
Aqui Santo Tomás reitera — ele já havia falado antes desta excessiva solicitude e dessa preocupação excessiva. Quando deu esta catequese, estava com isso muito na cabeça. Há aqueles que se preocupam hoje com as provisões temporais para daqui a um ano, e quem tem esse tipo de preocupação.
. . Nunca repousa, está sempre inquieto.
Não vos aflija, pois dizendo que comeremos ou que beberemos, ou com que nos vestiremos. Mateus 6:31. Por isso, o Senhor nos ensina a pedir que nos seja dado o nosso pão para hoje, ou seja, aquilo que é necessário para o tempo presente.
Há também dois outros tipos de pão, diz Santo Tomás: o pão sacramental e o pão da palavra de Deus. Pedimos, portanto, o nosso pão sacramental, que é preparado diariamente na Igreja, para que, assim como recebemos em sacramento, também nos seja dado para a salvação. Abre aspas: "Eu sou o pão vivo que desci do céu.
" João 6:51. Abre aspas novamente: "Aquele que come e bebe indignamente, come e bebe para si a condenação. " 1 Coríntios 11:29.
Portanto, o pão sacramental, Santo Tomás está fazendo uma advertência profilática: não necessariamente será ordenado à nossa salvação, só o será se, entre outras coisas, o consumirmos com as predisposições espirituais e morais necessárias. Outro pão é a palavra de Deus. Abre aspas: "Não é só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus.
" Fecha aspas. Mateus 4:4, conforme Deuteronômio 8:3. Pedimos, portanto, que nos dê o pão, ou seja, a sua palavra.
Assim, o homem alcança a beatitude, que é fonte da justiça. Pois, uma vez experimentadas as coisas espirituais, tornam-se mais desejáveis, e desse desejo surge a fome, e da fome, a saciedade da vida eterna. Então, aqui o paralelo é com a bem-aventurança dos que têm fome e sede de justiça.
Então, só para recapitularmos um pouco do que foi dito nesta aula: o presente pedido do Pai Nosso tem esta conexão com a referida bem-aventurança. Que é muito importante. Tenhamos em vista que os sete dons, estando todos eles implicados no Pai Nosso, como referência, é tudo uma coisa só na mente divina.
Porém, na nossa, que é finita e que precisa compor e dividir raciocínios para chegar à verdade, o que é verdade una e única na mente de Deus é, na nossa mente, ainda que cheguemos a certas verdades com claro sentido de unidade. Este sentido de unidade se dá em meio à multiplicidade. Não percamos de vista que as virtudes, como eu disse no início, adquiridas, geram o homem bom; as virtudes infusas geram o homem fiel; e os dons do Espírito Santo geram o homem santo.
Então, meus caros, até a próxima aula desta série, que eu entrego a Deus aqui como um trabalho de partilha, mesmo, de um tesouro espiritual, um pequeno tesouro espiritual dos muitos que Santo Tomás deixou em sua vasta obra, e que seja de proveito para alguns. Se uma só pessoa das que me assistem aqui, nesses vídeos, melhorar o padrão de sua oração do Pai Nosso, eu já me sentirei pago e recompensado. Um grande abraço e até o próximo pedido.