O que a luta indígena de Eunice Paiva tem a ver com a Constituição de 1988? | Podcast

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DW Brasil
O papel de Eunice Paiva vai muito além da viúva que lutou pelo reconhecimento da morte do marido dur...
Video Transcript:
[Música] Eunice Paiva se até pouco tempo atrás você ainda não tinha ouvido falar dela agora Muito provavelmente já ouviu interpretada por Fernanda Torres eice está no centro da trama do aclamado filme ainda estou aqui de Walter Salles e é no final do filme assim como na última parte do livro de mesmo nome escrito pelo filho dela Marcelo Rubens Paiva que o papel da eí é expandido para além da viúva que lutou pelo reconhecimento oficial da participação do estado na morte do marido o engenheiro Rubens Paiva foi morto por agentes da ditadura militar em 1971 depois
de se formar em direito aos 47 anos eice se tornou uma das pioneiras na defesa dos direitos de povos originários pesquisou escreveu e publicou textos sobre o tema e atuou ativamente pela causa Principalmente nos anos 80 ela influenciou debates que acabaram por mudar a forma como os indígenas são oficialmente tratados pelo Estado a partir da Constituição de [Música] 1988 e está no ar o DW revista o podcast semanal produzido pela redação brasileira da DW Eu sou o Guilherme Becker e falo diretamente de Bon na Alemanha nesta edição vamos relembrar a luta por direito indígenas de
eice Paiva e quem vai conversar comigo sobre o assunto é o repórter Edson Veiga meu colega de DW o Edson entrevistou especialistas sobre o tema para uma reportagem que foi publicada no site da DW Brasil esse quadro de violência contra os povos originários essa situação enfrentada pela eice persiste até hoje [Música] indicado a Oscar em três categorias e reconhecido com o Globo de Ouro pela atuação de Fernanda Torres ainda estou aqui levou o Brasil novamente aos principais palcos do cinema mundial e tornou a história de aice Paiva mais conhecida dentro e fora do país Edson
De onde veio essa motivação dela de além de lutar contra a ditadura militar trabalhar em prol da causa indígena olha Guilherme Acho interessante trazemos uma reflexão aqui a eice Paiva seria personagem importante da história do Brasil mesmo que nunca tivesse sido casada com um político como Rubens Paiva mesmo se nunca tivesse ficado viúva por conta da brutalidade da Ditadura Militar Brasileira é claro que esse papel dela como ativista como precursora e do direito indígena acaba sendo pouco abordado tanto no livro Como no fil filme porque ainda estou aqui é sobre a ausência de alguém é
sobre o impacto que a ditadura causou nas famílias de tantos que tiveram perdas por conta do autoritarismo e da violência dos militares mas eu unice é mais do que a viúva de alguém que foi assassinado pelo regime e aqui Respondendo a sua pergunta podemos dizer que o drama vivido por ela aguçou a sua sensibilidade para os direitos humanos e quando ela resolve veu voltar a estudar e se formou em Direito ela logo se tornou uma ativista para uma questão até então muito pouco desenvolvida no Brasil a cidadania dos povos originários essas pessoas os indígenas tinham
direitos muito limitados antes da Constituição de 1988 e se Hoje finalmente os indígenas são constitucionalmente cidadãos plenos é graças à luta de pessoas como Eunice pivan a Constituição de 1988 é um Marco paraa sociedade civil brasileira e consolidou a democracia brasileira depois de mais de duas décadas de ditadura Edson qual foi o papel ou Quais foram os papéis da Eunice Paiva em relação à Constituição de 88 a atuação da eice na maneira Como a Constituição de 1988 passou a enxergar e a definir e a considerar o indígena um cidadão foi fundamental tal isso é todos
os os especialistas que eu ouvi os ativistas é uma opinião Eh unânime aí nesse meio isso porque ela como advogada como consultora como conhecedora eh do direito ela permitiu ela definiu eh corretamente eh essa contextualização dos indígenas enquanto pessoas de direito enquanto cidadãos enquanto pessoas e esse entendimento que para isso Isso não foi um da noite pro dia né ela participou de debates na TV publicou artigos representou o Brasil no Congresso Mundial das populações nativas que ocorreu na França em 84 assessorou o Banco Mundial circulou no meio intelectuais antropólogos especialistas em meio ambiente enfim ela
se tornou aí uma voz eh não só uma voz ativa e defensora dos dos indígenas como uma uma voz de alguém que conhecia sabia que tava falando conhecia o direito indígena ela se tornou uma autoridade na na questão isso é é reconhecido como dissemos aí por pelas entidades pelas instituições e essa atuação acabou ajudando então a chegar no conceito do indígena como cidadão pleno bem como ter esse entendimento da necessidade da correta demarcação das terras o historiador Carlos trubo eh professor da universidade Federal de Rondônia e assistente na Fundação Nacional dos povos indígenas na Funai
assistente técnico na na Funai ele ainda lembrou que foi fundamental aí no debate a contribuição da Eunice pra formulação do artigo 231 da Constituição e segundo ele esse artigo ele é um Marco jurídico inédito no país é o que garante a que é fundamental tanto na garantia como na proteção dos direitos das populações indígenas é o que assegura a Esses povos o reconhecimento da sua organização social dos seus costumes da suas línguas das suas crenças das suas tradições e importante do direito às terras que tradicionalmente eh eles ocupavam Vale lembrar que o o Marcelo Rubens
Paiva no livro ele ele faz uma analogia Assim entre essas duas lutas da mãe né ele escreveu que para sua mãe a luta era a mesma ou seja Lutar em defesa dos do das famílias dos desaparecidos políticos daqueles que foram torturados e mortos pela ditadura era equivalente a tratar a questão indígena a tentar salvar nas palavras do do Marcelo Rubens Paiva Esses povos numa ditadura enfraquecida com uma sociedade civil que estava se organizando cada vez melhor e com a Imprensa Livre ou seja tinha também a Imprensa Livre como uma aliada eh nesse debate Edson na
reportagem que tá no site da DW Brasil você menciona que um ponto bastante simbólico da luta indígena da Eunice foi um artigo publicado em 1983 no jornal Folha de São Paulo com o título defendam os patachos esse artigo foi escrito em parceria com a antropóloga Manuela Carneiro da Cunha hoje aposentada na Universidade de São Paulo e professora na universidade de Chicago nos Estados Unidos por que esse artigo foi tão importante Pois é Guilherme esse artigo ele foi importante porque ele trouxe o debate à tona no Brasil na época a Eunice e sua colega Manuela Carneiro
da Cunha trabalhavam na comissão pró-índio de São Paulo uma ONG que havia sido fundada no finzinho dos anos 70 ao trazer o tema da importância do reconhecimento dos direitos dos Pataxós as autoras acabaram inspirando com seus argumentos outros ativistas e outras etnias e não só do Brasil como diz o escritor Marcelo Rubens Paiva no livro que virou este aclamado filme O texto de sua mãe Serviu de modelo para que outros povos indígenas inclusive africanos americanos e esquimós também lutassem por seus direitos na época da ditadura como bem lembra o Marcelo os povos nativos eram tratados
como um estorvo por fazendeiros Aliados do regime [Música] antes de seguir com esse episódio eu queria lembrar que o DW revista pode ser acessado por meio de plataformas como o Spotify onde basta procurar pela playlist DW revista Além disso t o dezer iTunes Google Home e Alexa em tablets ou celulares É só baixar o aplicativo Google assistente para Android ou iOs Edson além de tudo que ela pesquisou escreveu e publicou como era a atuação da eonice como ativista bom eh Guilherme eu acho que a gente não pode esquecer que em paralelo a toda essa atuação
indigenista a eonice continua lutando como uma vítima aí da ditadura né como alguém que teve a família destruída pela ditadura podemos dizer que o auge dessa luta dela foi o reconhecimento oficial da morte do marido do político Rubens Paiva em 1990 se apenas quando ela conseguiu o atestado de óbito e do marido mais de 25 anos depois do desaparecimento dele né e sem dúvida isso Acabou também se tornando aí um um Marco de reparação um Marco de de reconhecimento público mesmo das atrocidades praticadas pelo regime ditatorial brasileiro e servindo aí de modelo para também outras
famílias que tiveram situações semelhantes mas acho que também é importante mostrar que eh o a defesa dela da causa indígena voltando aqui ao tema principal da nossa conversa ela não se limitou a esse e envolvimento em instituições em debates nessa circulação aí no meio acadêmico né ela também teve um papel institucional como ativista ela fundou com outros parceiros com outros colegas em 1987 um instituto chamado Instituto de antropologia meio ambiente uma ONG que funcionou até 2001 na defesa e na autonomia dos povos indígenas ela também participou de outras organizações por exemplo a Mata Virgem e
a fundação pró-índio e de que forma a Eunice como advogada atuou diretamente pela causa indígena Edson o papel dela como advogada como defensora transcendia e as defesas coletivas de cada causa ela virou aí também uma causa maior de vida virou um uma dedicação muito exclusiva ao tema e a à questão e indígena eu conversei também com o historiador Carlos trubo que tem uma trajetória interessante porque ele é professor na Universidade Federal de Rondônia e atua como assistente técnico na Fundação Nacional dos povos indígenas né na Funai ele não só reconheceu aí o pioneirismo da voz
da eice eh na causa indígena como lembrou que ela acabou sendo a advogada de várias causas específicas né Por exemplo ela atuou para que a companhia do Vale do Rio Doce indenizasse as comunidades nativas eh em terras que foram construídas nas terras que foram construídas uma ferrovia a estrada de ferro Carajás entre o Pará e o Maranhão e também em outros vários processos de questões fundiárias né e o o trub Milano o historiador lembrou que muitas vezes ela fez isso de forma voluntária mas sempre em defesa da causa agora Edson conversando com o Aílton krenak
primeiro indígena membro da Academia Brasileira de Letras que conviveu com a eonice e também com outros especialistas no tema é possível dizer que o trabalho e a luta dela são ainda bastante atuais em 1985 2 anos depois da publicação do artigo na folha a Eunice publicou um livro em coautoria com a antropóloga Carmen Junqueira a obra se chama o estado contra o índio e traz um histórico da precária legislação indigenista brasileira até então elencando ali as violações dos Direitos Humanos contra esses cidadãos eu conversei com a pesquisadora da USP Mariana festucci Greco que analisou a
trajetória da eice como ativista ela comentou que a Inovação do livro está no fato de que as autoras propunham perspectivas de soluções para a chamada causa indígena a chamada questão indígena e traziam ideias que são relevantes até hoje elas defendiam por exemplo a criação de entidades de apoio à causa indígena e o fortalecimento da organização indígena com a promoção da Autonomia cultural e a autodeterminação das Nações e comunidades e claro a demarcação de suas terras e aqui acho que cabe Guilherme um comentário para que nossos ouvintes não estr no título do livro da Eunice e
no nome de entidades da época o termo que era usado era índio hoje em dia essa terminologia está ultrapassada para esse contexto é vista como pejorativa o ativista e político Márcio Santi fundador do Instituto socioambiental definiu a Eunice como uma precursora na defesa dos direitos indígenas quando ainda não havia a Constituição de de 88 e o krenak que comentou também que esse quadro de violência contra os povos originários essa situação enfrentada pela eice persiste até hoje e vem sendo segundo ele agravado por decisões recentes do congresso que buscam mudar o que prevê a constituição nessa
tentativa de impor o Marco temporal um dispositivo que proibiria demarcar terras de ocupação após a data da regul ção [Música] Constitucional a edição desta semana do DW revista uma produção da DW em Bona Alemanha fica por aqui fica aqui também meu Muito obrigado ao Edson Veiga pelas informações compartilhadas neste episódio mais conteúdos você encontra no nosso site dw.com barbrasil e também no canal da dwbrasil no yoube a produção apresentação e edição técnica do DW revista são minhas Guilherme Becker a revisão final é da lua Fray e a cordenação é do Rafael o DW revista volta
na sexta-feira que vem Obrigado por acompanhar a gente e um bom final de semana
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