"'Não Vai Cair no ENEM' Missões 2, Cena 1, Take 1". "Não! Esse vai chamar… Bom, pode chamar 'Missões 2', tá bom".
"Cena 1, Take 1". Ah, era o paraíso na Terra! Um monte de índio dócil, que não praticavam o canibalismo.
Que sabiam o lugar deles e trabalhavam cumprindo ordens. Ainda dormiam tudo direitinho e nunca se revoltavam. É o curral escravista mais maravilhoso que alguém já criou!
Melhor que isso só se fosse ovelhas, ovelhas esperando para o abate. Que lugar maravilhoso que eram essas missões, ou reduções jesuíticas guaranis. Especialmente pelo ponto de vista daqueles que queriam escravizá-los.
Sim, os piratas do sertão; os bandeirantes paulistas. Os homens que destruíram as missões guaranis. Venha conhecer essa história tremendamente trágica de um jeito que nunca te contaram.
"Risca, risca! Risca do mapa essas missões comunistas! ".
Bom, o lugar chamava "república comunista cristã dos guaranis". . .
Pô, já tendo nome comunista, já tem que ser riscado do mapa mesmo, né, cara! Ai, ai, trágico anacronismo, né, porque nem a palavra "república" praticamente existia, comunismo menos ainda. Mas agora, o objetivo dos sertanistas de São Paulo era exatamente esse: riscar do mapa as missões jesuíticas.
E foi isso que aconteceu. E é isso que eu vou te contar, nesse CENTÉSIMO, ÉPICO episódio do "Não Vai Cair no ENEM". Quem diria que esse programa chegaria a cem episódios?
Vamos por o número aqui: CEM, CEM, CEM! Eu preferiria que fosse "cem" com "s", né, mas infelizmente é "cem" com "c". Porque eu preferiria nem estar fazendo isso!
Mas eu tô. E na hora que eu faço eu até gosto. Então, cara, essa história não é que eu goste, mas essa história é incrível que ela nunca nos tenha sido contada, né.
Essa história realmente é que tinha que cair no ENEM. Essa é uma história que todos nós tínhamos que conhecer. Porque cara, a história não se divide entre bons e maus, entre mocinhos e bandidos.
. . Mas nesse caso específico, o lado de lá, o lado que destruiu as missões, sim, é o lado VILÃO.
Não tem outra interpretação. A história é complexa, a história é múltipla, a história é quase furta-cor, né, a história é camaleônica. Além de tudo, se diz que o passado está sempre mudando.
É, o passado está sempre mudando porque ele depende das interpretações do presente. Como o presente está sempre mudando, você interpreta o passado de formas diferentes. Que bela lição, já, nesse centésimo episódio!
Só que, nesse caso específico, só tem um lado. Essa devastação imposta ao primeiro período das missões, o período que vai de 1609 a 1641, não tem desculpa. Bom, na sua origem, São Paulo já se chamava Porto dos Escravos.
São Paulo nasceu a partir de dois personagens inacreditáveis e misteriosos da história do Brasil que, algum dia, vão acabar ganhando um episódio aqui. João Ramalho, o paulista primordial, um cara que apareceu em São Paulo ali em 1508, que ninguém sabe se era um náufrago, se era um degredado, se era um cara que tinha vindo de outro lugar do Brasil colônia e chegado ali. .
. Provavelmente era um náufrago, ou talvez um degredado, que chegou em SP em 1508 e que logo criou um exército particular que alguns dizem que chegou a ter três mil nativos indígenas. E, com esses nativos, escravizava vários outros nativos e vendia eles pra expedições que passavam ali.
Além do João Ramalho, cara, tem o cara que, olha tchê, falando sério, na minha opinião, é o cara mais misterioso da história do Brasil. Algum dia ele vai ter um episódio. Se chama Bacharel de Cananéia.
Ninguém sabe quem foi o Bacharel de Cananéia de verdade e quando ele chegou ao Brasil. Tem gente que diz que ele chegou ao Brasil em 1498. Isso, mil quatrocentos e noventa e oito.
Dois anos antes do descobrimento oficial do Brasil, portanto. Outros dizem que chegou em 1501, trazido pela expedição da qual fazia parte Américo Vespúcio. O fato é que, em 1532, quando Martim Afonso de Sousa chega em Cananéia, já encontra esse cara senhor de várias.
. . cara, eu sempre associo ele com Marlon Brando em "Apocalypse Now", o coronel Curtis.
O cara morava lá, tinha um monte de mulher dele, tinha um monte de índio servindo ele e tinha um monte de escravo. Por causa disso, dessas duas figuras, São Vicente era conhecido como Porto dos Escravos. Já em 1508, 1510.
Portanto a origem de SP está ligada a escravização dos índios. Só que isso daria uma grande, uma enorme guinada a partir de 1591, quando o Brasil. .
. Portugal e Espanha já estavam unidos sob a tal União Ibérica, já falei dez vezes aqui, blá blá blá… E chega um governador geral pro Brasil chamado Dom Francisco de Sousa. É esse cara que cria essas milícias paramilitares.
De São Paulo, já saíam expedições escravistas, expedições exploradoras, pra toda região em torno de SP, desde 1530, 1532. . .
Mas esse cara que militariza essas incursões! O Dom Francisco de Sousa dá roteiros fixos, estabelece o número de pessoas que deveriam fazer parte da tropa e até capelães. .
. capelões. .
. padres iam junto nessas expedições que serviam, basicamente, pra escravizar indígenas. É inacreditável que quando se iniciou o estudo do "bandeirismo", por volta dos anos 20 do século 20, 1920, 1930, 1940, alguns historiadores, ou com um cinismo gigantesco ou com deliberada ingenuidade, estabelecem a primeira fase do bandeirismo como chamada "bandeirismo defensivo".
Hahaha! Que os paulistas teriam criado essas milícias paramilitares, parecidas com as milícias que hoje assolam e assombram o Rio de Janeiro. .
teriam criado essas milícias pra "proteger" a vila dos ataques indígenas. De fato, tinha havido um ataque indígena incrível em São Paulo em 1562, que algum dia eu também te conto essa história que é incrível que nunca nos contem. São Paulo quase foi destr.
. . a nascente de São Paulo quase foi destruída por um ataque coligado de indígenas que saíram do Rio de Janeiro e do oeste do atual estado de São Paulo e atacaram a nascente de vila de São Paulo!
Que escapou por um triz! E houve outros ataques em 1570 e tal. Então, os historiadores dizem: "não, aí os paulistas criaram o 'bandeirismo defensivo'".
Há! Os ataques se davam justamente porque eles tinham começado a escravizar os caras, como eu falei, desde 1508! Só que daí cara, a partir de 1590, 91, com esse Dom Francisco de Sousa, aí até os historiadores mais cara de pau são obrigados a admitir que se inicia o "bandeirismo ofensivo".
Hahaha. . .
bota ofensivo nisso, né. Os paulistas saem dessas trilhas que saíam todas do coração de São Paulo e começam a escravizar tudo que é índio que encontram ao redor. Só que daí é o seguinte, cara.
. . Você já ouviu no episódio anterior, no nonagésimo nono episódio do NVCNE, se não viu vai lá correndo ver, para esse agora, vai lá ver aquele e depois volta pra esse.
. . Esse é o centésimo, mané!
Esse é o CENTÉSIMO, maravilhoso episódio do Não Vai Cair no ENEM! No nonagésimo, você já viu que, a partir de 1609, os jesuítas, partindo do Paraguai, começaram a estabelecer as missões no Guayrá, né, que é hoje o oeste do Paraná, no Tape, que é o oeste do Rio Grande do Sul, e no Itatim, que é no sul do Mato Grosso do Sul, né. A questão é que o Guayrá, a chamada "florida cristandade", que tinha 13 reduções com cerca de cinco mil índios afeitos a autoridade, ao trabalho disciplinado, ao trabalho agrícola, ficava a 40, 50 dias de marcha de São Paulo.
E São Paulo é uma raça de caminhantes, os caras sempre foram caminhantes! Há relatos do governador Tomé de Sousa, em 1556, que ele encontrou o João Ramalho e disse que o João Ramalho caminhava NOVENTA QUILÔMETROS POR DIA! Já veio aqui uns comentários.
. não que eu leia, mas me disseram, "ah, é impossível caminhar 90km por dia". .
. Tá, talvez ele não caminhasse todos os dias 90km, mas com certeza algumas vezes ele caminhou 90km. E 40, 30 quilômetros, esses bandeirantes paulistas, esses sertanistas paulistas, caminhavam FÁCIL!
E eram cheios de trilhas, né. Eram as chamadas "peabirus", né. Peabiru é a principal trilha, mas todas elas se chamavam "apés", né.
"Apé" não é de "a pé", "apé" é uma palavra tupi que quer dizer "caminho". E essas trilhas, eles as percorriam em fila indiana. É, fila indiana porque os índios andavam, os índios brasileiros, os nativos-brasileiros, andavam um atrás do outro.
Porque as veredas, as chamadas "veredas de pé posto". . .
O Sérgio Buarque de Holanda usa muito essa expressão, "vereda de pé posto" pras trilhas estreitas, meras picadas na mata, menos o Peabiru, o principal Peabiru, que era mais largo. . .
e eles andavam em fila. E os bandeirantes, os sertanistas paulistas, eles incorporaram muitos e muitos dos costumes nativos dos tupis, dos tupiniquins, basicamente dos tupiniquins de SP. Então, eles aprenderam a andar na mata com um senso de orientação inacreditável e se alimentando de palmitos (quase extinguiram os palmiteiros), de mel (e dizem que comiam mel com a abelha e tudo!
Haha, paulista macho, meu chapa! ), de mel, palmito, e depois eles passaram, ao longo dessas trilhas, a plantar mandioca e milho. Então, quando eles chegavam, na incursão seguinte, já tinha crescido o milho, já tinha crescido a mandioca e eles comiam.
Essas expedições se movimentavam numa média de 15 a 25km por dia: era a marcha da caminhada deles. Eles saíam logo ao amanhecer, assim que o sol raiava, eles se punham em marcha e, por volta das quatro da tarde paravam, montavam acampamento e no dia seguinte seguiam. Essas expedições eram muito parecidas, todas elas.
Os líderes eram paulistas, sertanistas de São Paulo, mas eles eram uma minoria. Eles eram tipo assim, 15, 20, no máximo 30, com exceções. Depois, vinham os tais mamelucos, filhos de pai branco, de ventre indígena, de mãe indígena, que odiaavam os índios, cara.
Odiavam! Eles eram super afim de escravizar e de matar índio. Esses eram em torno de mil, né.
E às vezes, cara, iam tipo dois mil índios puros. Índios tupis ou temiminós ou guarulhos que eram tribos que viviam ao redor de São Paulo e já tinham sido cooptadas pelos próprios paulistas e que escravizavam as outras tribos. Essas bandeiras se punham em movimento e iam escravizando os índios ao redor de SP.
Só que como disse brilhantemente o Capistrano de Abreu, ele pergunta: "por que aventurar-se entre gente boçal e rara, falando línguas travas e incompreensíveis se, perto de SP, demoravam aldeamentos numerosos iniciados na arte da paz, afeitos ao julgo da autoridade? ". Exatamente, porque os jesuítas, ao criarem essas missões, acabaram criando um curral escravista.
Os bandeirantes de SP olharam e disseram "olha ali cara, um monte de índio, tudo morando numas casinhas. Nós vamos lá escravizar esses caras, cara! ".
E como já havia essa União Ibérica e os limites entre Portugal e Espanha estavam difusos e os paulistas juravam que todo o oeste do Paraná pertencia a eles. . .
porque eles, de certa forma, tinham mesmo sido os primeiros a chegarem lá nessas missões. . .
eles resolveram iniciar uma campanha pra conquistar essas missões. E as primeiras missões que eles atacam são justamente as missões do Guayrá. .
. Porque em 40 dias de marcha eles chegavam lá. Quarenta dias era um passeio na praia pra paulista.
Então, em agosto. . .
Se sabe o dia! Acho que foi no dia 8 de agosto de 1627, um cara chamado Manoel Preto, e outro, que eu tinha ouvido falar, chamado Raposo Tavares, montam uma super, uma hiper bandeira, com 69 paulistas brancos (que era um muito ter um número tão grande assim de paulistas), 900 mamelucos e dois mil índios, muito provavelmente temiminós. Os temiminós mereciam um episódio porque eles eram aqui da ilha, onde hoje é a Ilha do Governador no Rio de Janeiro.
Eram índios cariocas inimigos dos Tamoios. Todo o RJ era um território Tamoio com uma única enclave, como se fosse um enclave gaulês, de temiminó. Os temiminó eram aliados dos portugueses desde 1560, da conquista do RJ, e os tamoios tinham sido aliados dos franceses e, por isso, tinham sido extintos.
Aí, os temiminós já estavam a essas alturas morando lá. O Arariboia, por exemplo, índio "fundador" de Niterói, era temiminó. Os temiminós já estavam lá instalados em São Paulo e faziam parte da "tropa de choque" dessas bandeiras paulistas.
Então, no dia 8 de agosto de 1627, o Manuel Preto, que tinha setenta anos de idade (SETENTA! Quase a minha idade, eu tô com 83), 70 anos de idade, e o Raposo Tavares, no fulgor dos seus 29 anos de idade (um pouco mais velho que eu, eu tô com 26), eles partem de São Paulo. Em setembro eles chegam no rio Tibaji e cercam a redução de San Antonio.
Ficam esperando o primeiro pretexto pra atacá-la. Era a primeira vez que essas reduções guaraníticas, essas reduções jesuíticas dos guaranis, seriam atacadas. E era estritamente ilegal atacá-las!
Primeiro, porque o território pertencia à Espanha. Segundo porque os índios, como eu já disse no episódio anterior, eram CRISTÃOS, eram CATÓLICOS! Eram súditos de Sua Majestade Real da Espanha, o Rei Felipe IV!
Os paulistas não tinham o direito legal, nem moral, nem espiritual, nem nenhum tipo de direito para atacá-los. E eles ficam ali, só bisbilhotando, esperando um pretexto fútil e encontram um pretexto fútil e atacaram em janeiro de 1628. Atacaram e destruíram aquela missão.
Quando eles voltam pra São Paulo, em maio de 29, em maio de 1629. . .
cês veem, eles ficaram quase dois anos. . .
Eles tinham escravizado 30 mil índios e tinham destruído nove reduções. E sabe como é que foram esses ataques? Os índios, quando eles atacavam.
. . os índios não tinham armas, não podiam ter arma, eram desarmados por determinação dos próprios jesuítas e da própria coroa espanhola.
Os índios se refugiavam na igreja e eles botavam fogo na igreja, cara. Que nem aqueles filmes de caubói. Sabe aqueles filmes de caubói que os caras.
. . que o bom povo.
. . quando os homens maus, o Clint Eastwood.
. . Não, Clint Eastwood é o nosso herói!
. . .
Chegam na cidadezinha, os caras se refugiam na igreja, os malvados põe fogo na igreja. . .
Pois era assim cara. Olha aqui a descrição, olha aqui a descrição do ataque à redução de São Francisco Xavier, essa no Tape, né. Guayrá e Tape.
Vai lá ver o outro episódio anterior, o nonagésimo nono, que tu vai saber o que é o Tape! Em 1627, olha só: "lá, depois de atearem fogo por três vezes a igreja, os paulistas abriram uma fenda na parede. Quando os indígenas tentaram escapar, a modo de um rebanho de ovelhas que sai do curral, os sertanistas com espadas, machetes e alfanges, lhes derribavam as cabeças, lhes truncavam os braços, lhes desarrejavam as pernas, lhes atravessavam os corpos com lanças e espadas.
Provavam o sabor do aço de seus alfanges e rachavam a cabeça de meninos em duas partes. Abria-lhes o crânio e despedaçavam-lhe os membros". É, na jornada, com todos eles acorrentados pelo pescoço até São Paulo, havia ainda outros horrores adicionais.
É o seguinte cara, se o cara era velho e não podia caminhar eles largavam os cara. Se era criança, eles matavam criança. Tem aqui, tem aqui o relato também, ó.
Matavam os enfermos, matavam os velhos, abandonavam os aleijados e as crianças que impediam seus parentes de seguirem a marcha. Desse jeito eles levaram cerca de CEM MIL, cem mil escravos indígenas pra São Paulo, ao longo de vários anos. Esses massacres se iniciam em 1628 e vão se encerrar, como você vai ver, em 1641.
Esse Manoel Preto tinha uma fazenda na "freguesia do ó", ele devia ser "punk da periferia, é da freguesia do ó": ele chegou a ter mais de 1500 escravos, cara. Se diz que o Raposo Tavares teve dois mil escravos. Esses escravos duravam de 4, de 3 a 4 anos, porque eles recebiam uma espiga de milho por dia de comida.
É, eles serviam basicamente pra carregar as cargas entre São Paulo lá em cima e o porto de Santos lá embaixo pela via Anchieta. É, foi isso que aconteceu. Todas essas missões.
. . Já contei, né.
. em 1630, o Padre Ruiz de Montoya, consegue evacuar DOZE MIL índios das missões que ficavam ali entre o rio Paraná e o rio Uruguai. E aí cara, eu prometi que eu ia te contar no centésimo, no nonagésimo nono eu te falei o que que ia acontecer em 1641 na batalha de M'bororé.
Quantos minutos tem aí, quantos minutos tem aí? Ahn? Tem 21 e eu vou ficar mais 86 minutos contando pra ti o que aconteceu na batalha de M'bororé.
Já falei no episódio anterior que, depois da devastação dessas missões e quem liderou esse êxodo de 12 mil guaranis lá pro Paraguai onde daí os paulistas de fato não chegavam. . .
Porque pelo menos o Paraguai eles admitiam que pertencia à Espanha! O Padre Ruiz de Montoya primeiro veio pro Rio de Janeiro em 1638. .
. Perdi a minha anotação aqui em algum lugar, vou ter que fazer de cabeça. .
. Em 1638 ele veio pro Rio de Janeiro e aí depois ele foi pra Espanha. Na Espanha, ele foi recebido em janeiro de 1638 pelo Rei Felipe IV, que autorizou os guaranis a se armarem.
Autorizou os padres jesuítas a armarem os guaranis para que eles pudessem resistir a esse ataque infame, a esse ataque ilegal, a esse ataque injusto dos sertanistas de São Paulo. E aí também o mesmo Ruiz de Montoya convenceu o Papa Urbano VIII a promulgar uma bula excomungando, EXCOMUNGANDO, todo e qualquer homem branco que atacasse essas reduções. No caso, os homens brancos evidentemente eram os sertanistas de São Paulo.
Quando essa informação chega na cidade SP, que vivia única e exclusivamente do tráfico de escravos. . .
A primeira fonte de renda de São Paulo foi a escravização de indígenas, especialmente da nação guarani. . .
Quando essa bula chega a São Paulo há uma revolta total e os caras disseram: "agora vamos destruir, acabar de vez com essas missões, vamo ver se alguém vai nos excomungar! ". E um cara chamado Jerônimo de Barros monta uma expedição em fins de 1640 para atacar as reduções do Tape, que já tinham sido atacadas pelo Raposo Tavares, que tinha começado atacando o Guayrá, mas que depois continuou atacando o Tape.
O Tape era onde hoje é o Rio Grande do Sul. Esse Jerônimo de Barros parte de São Paulo em fins de 1640 e, no dia 11 de março de 1641. .
. Anote esta data no seu calendário, cara! 11 de março de 1641.
. . Ele tá vindo pelo rio Uruguai com uma.
. . com cento e trinta canoas, tá, com 30 paulistas, 300 mamelucos e 600 índios tupi.
Só que aí os guaranis tinham sido autorizados a se armar. E sob a liderança dos padres Pedro Romero e Pedro de Mola, e com a liderança indígena do cacique Ignacio Abiarú, três mil índios guaranis estão acantonados, estão atocaiados nas matas ciliares de um arroio chamado M'bororé. Não se sabe, nunca foi identificado plenamente onde é este arroio, mas se acha que era um afluente da margem esquerda do rio Uruguai, lá no oeste do Rio Grande do Sul.
Muito provavelmente onde hoje fica uma pequena localidade chamado Porto Vera Cruz. Espero que seja lá porque é longe pra cacete e eu fui até lá só pra saudar os nossos queridos heróis guaranis e jesuítas. Afinal, estudei no colégio Anchieta, colégio jesuíta, portanto, no fundo, eu sou um jesuíta.
Não se sabe se é lá mas se acha que foi lá. Na verdade, se houvesse pesquisas mais intensas e mais profundas, a gente poderia descobrir exatamente onde isso foi mas parece que ninguém se interessa muito por essa história. .
. NÃO INTERESSA! O canal Buenas Ideias se interessa e vou te contar o que que aconteceu cara: eles vinham vindo, pá pá pá pá, pelo rio Uruguai, descendo ali com suas 130 canoas e seus mais de mil homens ou cerca de mil homens, quando três mil índios guaranis armados com canhões feitos de taquaraçu.
. . que era a taquara grande, tinha uma boca desse tamanho, um bambu, uma taquara enorme.
. . que eles criaram canhões.
. . esse Pedro Romeiro, esse jesuíta que era um jesuíta engenhoso fez uns canhões que eram mais ou menos desse tamanho e com uma boca assim ó, e a parte de trás eles fechavam com couro e enchiam de pólvora e com um pedregulho e BUUM!
, cortavam um pavio e PÓÓ! Era um canhão, cara! Um canhão de madeira!
Só dava pra usar uma vez, mas uma vez já era bom. PÁ! Atacaram!
E aí cara, fizeram catapultas. . .
Eles pegavam troncos, toras, envolviam elas com óleo e PUFT, PUFT! Cara, e desbaratam os caras, cara! Por TRÊS.
. . a batalha, na verdade, a principal batalha foi dia 11 mas ela se promulgou por três dias.
. . e por três vezes seguidas os CAGALHÕES dos bandeirantes, dos sertanistas, só falavam "paz!
Paz! ". .
. e os índios diziam: "não tem paz! ".
Cara, mataram quase todos. Só 120 conseguiram voltar pra SP, de mil! E nesse dia se encerra o bandeirismo ofensivo.
O ciclo de caça ao índio ia acabar nesse momento e, a partir de então, os bandeirantes paulistas iam se dedicar à caça ao ouro. É, porque bem nessa mesma época estava sendo descoberto o ouro das gerais. As reduções de qualquer forma já tinham sido amplamente desbaratadas, os paulistas já tinham acabado com a Província do Itatim, onde havia 13 reduções.
. . já tinham ARRASADO o Guayrá.
. . não sobrava nada do Guayrá, no oeste do Paraná, não sobrava nada!
Tanto é que hoje não sobra nem o Salto de Guaíra, né. . .
As Sete Quedas de Guaíra, que eram lindíssimas, que foram afogadas pela represa de Itaipu. Não sobrava nada do Guayrá e não sobrava nada do Tape. Os índios tinham todos se refugiado pro Paraguai.
E é aí que vai se iniciar a história das missões que as pessoas conhecem. Porque isso que eu contei pra ti no nonagésimo nono episódio e no centésimo, espetacular, maravilhoso, épico e de chorar. .
. ESPERO QUE TU ESTEJA CHORANDO! .
. . nesse episódio.
. . as pessoas não sabem nada, cara!
O que as pessoas sabem é a história do renascimento das missões. Quando as missões são recriadas a partir de 1700 e duram até 1756, por aí, um pouco mais, quando se inicia a tal guerra guaranítica e daí elas são destruídas de novo! E são ESSAS as missões, os tais sete povos das missões que as pessoas conhecem.
Só que essa história que as pessoas conhecem foi CEM ANOS, cem anos depois dessa que eu acabo de te contar, entendeu. E agora, por que que não nos contam essa história eu não sei! Acho que de vergonha, né, cara!
Mas é isso! Porque teve. .
. Já falei e vou repetir: a história não se divide entre mocinhos e bandidos, entre vilões e homens bons, mas NESSE caso, sim, cara! Tinha vilão!
Eles não tinham o direito de ter atacado e destruído esse projeto civilizatório! E aí você pode discutir "ah mas será que os padres não faziam lavagem cerebral nos guaranis! ?
". . .
TALVEZ FIZESSEM, MAS OS GUARANIS TAVAM VIVOS! E tinha um florescente modelo civilizatório que foi arrasado, destruído, em nome do NADA! Porque não ficou NADA ali, NADA!
E aí esses escravos levados pra São Paulo morreram e aí que os bandeirantes paulistas vão fazer o ciclo do ouro. E eu ainda não fiz o ciclo do ouro, talvez eu faça algum dia, e ainda não contei a história das missões (que também é incrível, que também é épica) de 1700 a 1760. Mas talvez eu nunca conte.
Porque esse é o centésimo episódio e eu não sei se eu vou dar continuidade a esse programa. . .
Só se você vier rastejando de joelhos até mim com um monte de dinheiro na mão. . .
Porque eu sou um dinheirista que nem um sertanista paulista. . .
Eu sou um PIRATA! "O que você acaba de ver está repleto de generalizações e simplificações, mas o quadro geral era esse aí mesmo. Agora, se você quiser saber como as coisas de fato foram.
. . Ah, então você vai ter que ler!
".