Diversos filmes e séries e até mesmo histórias infantis trazem os ciganos como personagens. No entanto, na maioria das vezes, eles sempre são retratados de modo pejorativo. Você já se perguntou o por disso?
Porque os ciganos são tão odiados ao redor do mundo, onde quer que eles estejam? Até mesmo por aqui no Brasil, esse preconceito é grande. Sendo que nós tivemos um ex-presidente bem famoso, que era descendente de ciganos, mas preferia esconder isso da mídia.
No vídeo de hoje, você vai conferir qual a origem dos ciganos e porque eles carregam esse preconceito tão grande contra eles. Além disso, vai também conferir que, assim como os judeus, eles foram uma das principais vítimas do regime nacista, sofrendo um apagamento que ficou conhecido como pormos, o holocausto cigano. Para começarmos, a própria origem da palavra ciganos é incerta, além de possuir conotações bem preconceituosas.
Há várias explicações para a etimologia dessa palavra, sendo que as mais comuns são termos ciganos do latim, que significa nômade ou viajante. Esse termo faria alusão ao fato de que os ciganos estão sempre em movimento, nunca se estabelecendo em uma única região. Já o termo atsínganos do grego é mais preconceituoso, pois significa algo como impuro ou intocável.
O termo persa, Zigoner, significa comedor de carne de porco e era uma palavra ofensiva usada pelos persas para descrever os ciganos, já que eles se recusavam a seguir seus costumes. Apesar de não ser conclusivo, atualmente o mais aceito pelos pesquisadores é que a palavra derive do latim a egiptanos, mais tarde modificada para egipcio, cujo significado é egípcio. Antigamente acreditava-se que os ciganos vinham do Egito, mas hoje em dia nós já sabemos que a origem deles é outra.
A origem dos ciganos remonta a região do noroeste da Índia, nas regiões onde hoje se localizam os estados do Rajastão e do Punjab. Eles habitaram a região durante o período medieval, sendo obrigados a emigrar entre os anos 500 de e 1000 depois de Cristo. A saída da Índia se deu devido às invasões do sultão Mamut, famoso por invadir o norte da Índia, capturando os povos que viviam por ali.
Durante as invasões, era comum que o sultão capturasse e vendesse as pessoas aos persas. Anos depois, no século XI, ocorreu a segunda onda migratória dos ciganos. Dessa vez devido a pressões políticas, conflitos internos e até mesmo perseguições religiosas.
Somente por volta de 1400 eles entraram na Europa, onde chegaram se apresentando como nobres peregrinos do Egito. Essa narrativa era estratégica. Eles se apresentavam assim, dizendo que estavam em impenitência religiosa por antigos pecados, pedindo por abrigo e esmolas.
Isso fazia com que a população europeia lhes concedesse permissão para circular livremente, principalmente nas regiões em que o cristianismo era mais forte. Em 1425, um grupo chegou a Paris dizendo vir do pequeno Egito, carregando cartas de proteção escritas pelo próprio Papa. O pequeno Egito era uma região real, um local próximo à Grécia, que servia como uma zona de passagem e comércio entre povos.
Muitos ciganos indo para Europa realmente passavam pelo pequeno Egito e utilizavam disso para reforçar a narrativa de que vieram do Egito. Daí surgiu o termo em inglês gipsi, que vem de egípcio. Uma confusão por parte dos europeus que acreditaram nas histórias contadas pelos ciganos.
Mas mesmo inventando essa narrativa para se protegerem, ela não foi muito útil. Ao longo da história, os ciganos foram frequentemente alvos de preconceito, discriminação e até mesmo perseguição. Na Suíça, por volta de 1470, foi instituída uma lei contra a presença dos ciganos.
Na Espanha, os ciganos eram perseguidos e expulsos. Já na Inglaterra, as leis determinavam que alguém tivesse descendência cigana, isso já bastava para que ele fosse acusado de qualquer crime, podendo ser até mesmo sentenciado à morte. No século XIX, eles eram frequentemente punidos e deportados dos países em que estivessem se tornando escravos.
Muitos ciganos chegaram à América do Norte e América do Sul como prisioneiros. O cientista social David Bell chegou a dizer que já temos registros de ciganos transitando desde o século XI. Eles já passaram pela queda do absolutismo, já passaram pelas guerras mundiais, todas, pelos campos de concentração, pelas mudanças de sistema e sempre nas margens.
Nós sabemos muito bem como os sistemas culturais majoritários se comportam com quem vive nas margens. Mas o que poderia justificar tanto ódio contra eles? Para os historiadores, esse ódio é antigo e tem origem na idade média, principalmente na Igreja Católica.
Aqui os motivos não são devido a crenças religiosas dos ciganos, até porque há uma grande diversidade entre eles. Atualmente, há ciganos que se identificam como católicos, protestantes, muçulmanos, hindus e até mesmo comunidades brasileiras com ciganos evangélicos. O sincretismo religioso entre as comunidades ciganas é vasto, não sendo este o principal motivo pelo qual eles foram condenados.
Na idade média, os valores medievais estavam em alta e os ciganos eram malvistos por se recusarem a seguir tais valores. Devido ao seu modo de vida nômade, eles eram conhecidos por viajar de região para região, promovendo entretenimento, riso e diversão, sempre trabalhando com venda de carnes ou como ferreiros. Em algumas dessas viagens também era normal que vendessem remédios caseiros, produtos feitos com sabedorias ancestrais ou então práticas místicas, como a leitura do futuro de uma pessoa.
Aos olhos da Igreja Católica, da Idade Média, tudo isso era visto como manifestações demoníacas, afastando os homens dos princípios cristãos. Nesse período, diversos mitos foram sendo criados contra a população cigana, visando instalar o preconceito contra eles no imaginário da população. Um desses mitos diz que o ferreiro que fabricou os pregos que fixaram Jesus na cruz era cigano, aumentando ainda mais o ódio que a população tinha sobre eles.
Ainda dentro de suas comunidades havia também normas rígidas que dificultavam relações com pessoas de fora, o que em alguns casos levava até mesmo a expulsão de membros que não seguem essas regras. Um dos motivos que contribui para o preconceito, principalmente na sociedade atual, é o modo de vida itinerante dos ciganos. por não se estabelecerem necessariamente em casas, mas sim em trailers e acampamentos, muitos os enxergam de modo pejorativo, como pessoas preguiçosas que se recusam a viver em sociedade.
Além disso, um dos motivos que contribuiu para que os ciganos fossem vistos com maus olhos, além de suas tradições e costumes, era a língua falada. Os ciganos possuem seu próprio dialeto conhecido como Romani, o qual é falado pela maioria dos grupos de ciganos, mas não por todos eles. Isso porque o termo cigano, na verdade, não corresponde a todos eles.
O que nós chamamos de ciganos são, na verdade, um conjunto diverso de povos, os quais se dividiram em grupos diferentes durante seu período de migração. Ou seja, apesar de cigano ser um termo geral, há diversos povos espalhados ao redor do mundo, cada qual seus próprios costumes, tradições e dialetos. O maior grupo cigano do mundo são os Roma, presentes em vários países do mundo e que utilizam o dialeto romani, mas eles não são os únicos.
No Brasil, por exemplo, os ciganos do grupo Calon foram os primeiros a chegarem por aqui. E além do português, eles também se comunicam no dialeto Shibi. Por aqui, os ciganos chegaram durante o período colonial, lá em 1574, o primeiro cigano a chegar no Brasil, conforme registro documental, foi João Torres, deportado pela coroa portuguesa.
Ele pertencia ao grupo Calon e chegou aqui diretamente pela política de banimento dos ciganos do reino de Portugal, o qual desejava se livrar deles de qualquer modo. Muitos ciganos eram condenados pela coroa portuguesa por crimes como vadiagem, Leitura de Sorte e Comércio ambulante. Ao invés de serem enviados para a prisão, recebiam a sentença de serem deportados para o Brasil.
A vinda deles desde o início estava associada a um grupo de indesejados, ajudando a criar o preconceito que ainda hoje perdura sobre os ciganos. Durante o império e a república existiam leis e decretos proibindo os ciganos de acamparem, venderem produtos ou até mesmo se reunirem. A Guarda Nacional os expulsavam sempre que eram vistos, os rotulando como vadios, ladrões e trapaceiros.
Eles eram sempre classificados como uma raça degenerada. Mesmo fazendo parte da história do Brasil há mais de 450 anos, os ciganos seguem apagados dos livros de história, debates políticos ou até mesmo da mídia. Das poucas vezes em que eles são citados, é sempre de maneira pejorativa e carregada de preconceito.
Apesar da grande maioria desconhecer o ex-presidente Jcelino Kubichek era descendente de ciganos. Houve um apagamento histórico sobre esse fato, mas o bisavô materno de JK era cigano. O próprio Juscelino evitava falar sobre isso.
Atualmente, conforme dados do IBGE, há cerca de 500. 000 ciganos do Brasil vivendo espalhados em 21 estados. Somente 13,7% deles possui acesso à educação e saúde.
As famílias ciganas encontram dificuldades em registrar os filhos nas escolas, pois devido ao estilo de vida nômade, eles não possuem alguns dos documentos requeridos como comprovante de endereço. Para aqueles que conseguem ingressar nas escolas, acabam sendo vítimas de um enorme preconceito, sendo que até mesmo nos livros escolares a palavra ciganos é apresentada de maneira preconceituosa. Miriam Alves de Souza, professora de antropologia da Universidade Federal Fluminense, diz: "Os ciganos são obrigados a lidar com estereótipos de que roubam crianças, de que não são confiáveis, que dançam, que cantam e prevêm o futuro, de que são itinerantes e vivem em barracas.
Embora a maioria ainda viva de modo itinerante, há diversas comunidades já estabelecidas, mas que ainda assim continuam a sofrer preconceitos. Em 2016, a ONU divulgou um documento relatando sobre a situação degradante na qual comunidades ciganas se encontravam nas Américas. Sobre o Brasil, o documento dizia: "Poucas políticas oficiais ou programas existem dedicados a promover e proteger os direitos dos ciganos na região.
Mas do que isso? A identidade dos ciganos como um grupo distinto é frequentemente desconhecida ou mal interpretada. No documento, eles também dizem que no Brasil as famílias de ciganos estão frequentemente em situação de extrema pobreza, sem acesso à eletricidade, água potável e saneamento básico adequado.
No dia 24 de maio é celebrado o dia dos povos ciganos no Brasil em reconhecimento à contribuição deles na formação da identidade brasileira. Em 2022, um projeto de lei foi aprovado pelo Senado para fundar o Estatuto dos Povos Ciganos, o qual ainda aguarda análise na Câmara dos Deputados. Esse projeto prevê inclusão social, política e econômica dos ciganos, além de proteger seus direitos étnicos e combater a discriminação.
No entanto, além desta data e deste projeto que ainda não foi aprovado, a maioria das iniciativas que se iniciam em prol deles acabam não indo para a frente. A Associação Nacional de Etnias Ciganas, a ANEC, busca até hoje encontrar meios para ajudar essa população que vem sendo tão renegado e maltratada em nosso país. Você aí já teve contato com a população cigana na região em que você mora?
Já ao redor do mundo, a população de ciganos é bem maior do que no Brasil. A Romênia conta com cerca de 2 milhões de ciganos, com comunidades espalhadas por todo o país. Na Turquia, o número varia de 2 a 5 milhões, representando uma das maiores minorias éticas do país.
Na Bulgária e em Hungria, a população gira em torno de 800. 000, na Eslováquia 700. 000.
Além desses países europeus, os ciganos se encontram espalhados por todos os continentes, geralmente representando uma grande parcela da minoria étnica do país no qual estão presentes. Porém, independentemente de onde se encontra, o preconceito contra eles permanece forte. Independente dos preconceitos que sofrem atualmente, nenhum período foi mais difícil para eles do que durante a Segunda Guerra Mundial, no que ficou conhecido como o holocausto cigano, assim como os judeus.
Os nacistas também consideravam os ciganos como uma raça inferior, os perseguindo e exterminando de maneira sistemática. Para os nazistas, os ciganos eram vistos como racialmente impuros, degenerados, antissociais e incontroláveis. A pseudociência que eles utilizavam para tentar justificar uma pureza racial fazia com que classificassem os povos ciganos como primitivos, utilizando isso como justificativa para seu extermino.
No início do regime nacista, os ciganos eram obrigados a portar documentos apenas para se locomover, ao mesmo tempo em que eram constantemente vigiados pela polícia. Com passar dos anos, foram-se desenvolvendo campos especiais para ciganos, como o Marza, onde famílias ciganas viviam cercadas por arame farpado em péssimas condições. Com o tempo, eles foram deportados aos campos de concentração em Auschwitz, onde milhares morreram, fosse por fome, doenças ou nas câmeras de gás.
Heinich Himler, o chefe da SS, liderou diversos programas de eugenia sobre a população cigana, principalmente as mulheres. Existem até mesmo relatos dizendo que as crianças ciganas eram utilizadas em experimentos. No dia 2 de agosto de 1944, 3.
000 ciganos que ainda estavam em Auschwitz foram exterminados em uma única noite. Hoje, essa data é conhecida como o dia da memória do holocausto cigano. Após o período da guerra chegar ao fim, ao contrário dos judeus, durante décadas os ciganos não foram reconhecidos oficialmente como vítimas do holocausto.
O governo alemão negou indenizá-los, dizendo que os ciganos eram perseguidos durante a guerra, não por motivos raciais, mas sim por sua conduta antisocial. Somente em 1982 eles foram devidamente reconhecidos como vítimas do holocausto. Além dos diversos monumentos que existem em homenagem às vítimas ciganas da Segunda Guerra, organizações como o Romany Hose e o European Roman Rights Centry seguem lutando tanto pela preservação da memória cigana como pelo reconhecimento do genocídio cigano.
Devido ao enorme preconceito que sofrem e que perdura até os dias atuais, há diversas personalidades famosas que preferem esconder a sua origem cigana, tá qual o exemplo de JK. Além dele, também sabemos que a bisavó de Elvis Presley era cigana, porém o próprio cantor jamais falou abertamente sobre isso. Além dele, outra importante figura de renome mundial com descendência cigana foi o ator Charlie Chaplin.
A família de Chaplin era composta por ciganos Romanichal e apesar de todo o tabu, o ator não tinha problemas em falar abertamente sobre sua origem. Aliás, falava com muito orgulho na TV, nos filmes e até mesmo nas histórias infantis. A maneira negativa com a qual os ciganos sempre eram retratados contribuiu para o preconceito contra eles.
Era comum eles serem associados a ladrões, charlatões, trapaceiros e até a práticas de vadiagem. Até mesmo em animações infantis, como em o corcunda de Notredame, a personagem Esmeralda, uma cigana, era retratada como uma feiticeira, além de objeto de desejo e ameaça à ordem cristã. No entanto, uma série da atualidade ganhou fama mundial ao tratar de uma família de ciganos, Pick Blinders.
Você já havia reparado que eles são, na verdade, uma família de ciganos? Em Pick Blinders, a família Shelby é retratada como uma família de origem cigana e há diversos episódios nos quais isso é bastante explorado. Rituais, crenças, dialeto próprio e até mesmo cenas de interação com outras famílias ciganas são bem comuns na obra.
A série jamais especificou sobre qual grupo cigano os Pick Blinders faziam parte, mas ainda assim é possível traçarmos algumas teorias pela localização na Inglaterra. Isso os aproxima da linhagem conhecida como Romanichal, uma categoria dentro do grupo Ron que migrou para a Inglaterra. Já o dialeto que eles utilizam na série pertence ao idioma romani.
O modo como eles realizam leituras espirituais e, principalmente, os códigos familiares internos deles, são práticas bem comuns utilizadas pelos Rome. A rivalidade dos casamentos arranjados com outras famílias ciganas também demonstram uma estrutura bem comum aos home. Isso significa então que os pick blinders são ciganos home.
Na verdade não é bem assim. Apesar das similaridades, a série utiliza uma licença poética, instruando elementos r e dos travelers irlandeses, que não são necessariamente ciganos, mas sim conceitos estereotipados da mídia sobre como é ser cigano. Por ser uma obra televisiva mundial, há diversos elementos que precisaram ser ficcionalizados de modo a dar prioridade ao drama e não à precisão histórica.
O exemplo de Pick Blinders é interessante para analisarmos como a cultura cigana é utilizada na televisão para construir algo mítico e exótico, enquanto na vida real essas comunidades enfrentam preconceitos extremos. Muitos dos que assistem e torcem pelos pick blinders são os mesmos que apresentam um enorme preconceito contra os ciganos da vida real. Atualmente, cerca de 8 milhões de ciganos vivem na Europa, sendo que juntos eles formam a maior minoria sem um país que existe.
Os ciganos já passaram por todos os principais acontecimentos da sociedade moderna, sendo inclusive vítimas diretas em vários deles. Já na mídia, a ficcionalização deles acaba abrangendo os dois opostos, onde ou eles são tratados como ladrões e degenerados, ou na figura de heróis e salvadores da pátria. Seja no Brasil, na Europa ou em qualquer outra parte do mundo.
Continuam a seguir suas tradições, manter seu dialeto próprio e estabelecer comunidades onde seguem pedindo apenas por igualdade e respeito.