Quem somos nós afinal quiséssemos nos designar com uma expressão mais velha por ateu, ímpio ou ainda em imoralista? Não acreditamos nem de longe estar caracterizados com isso. Somos as três coisas em um estágio muito adiantado para que se compreenda, pois o humano é um animal venerador mas também o animal desconfiado e quanto mais desconfiança, mais filosofia.
Se você tem uma pergunta que sempre aparece quando a gente fala de Nietzsche é: o Nietzsche é Niilista? O que significa niilismo? Niilismo significa o culto ao nada porque a palavra nihil que vem de niilismo quer dizer vazio, quer dizer nada.
Então é comum a Nietzsche ser atribuído essa classificação: filósofo niilista. Mas porque as pessoas dizem que ele é niilista? Se niilismo é o culto ao nada, Nietzsche é niilista porque o Nietzsche é um crítico da religião, dos três grandes monoteísmos: cristianismo judaísmo e islamismo.
Então o Nietzsche é altamente crítico a ideia desse deus único. Então Nietzsche não valoriza o pensamento cristão e desfaz, provoca, vai conta. .
. não é exatamente contra mas ele combate, ele cria um conflito exatamente com essa ideia de Deus judaico-cristão. Mas o Nietzsche também critica a ciência, a verdade científica, a modernidade, os anseios do humano moderno na sua tentativa de controlar o mundo.
Nietzsche também critica a filosofia. É extremamente crítico a filosofia. Ele chama de filosofia de metafísica e diz que a metafísica se caracteriza por opor valores e que isso é um afastamento da vida.
A filosofia não diz respeito à vida, pelo contrário. Ele também critica as artes. Para ele a arte na verdade só existiu no período trágico grego no século 5 antes de Cristo.
Depois disso não há mais arte? O que se tornou a arte? Produto?
Tem mais coisa que eu poderia criticar. Posso fazer ainda um levantamento. Por exemplo: é crítico a ideia do sujeito, do eu.
O eu não existe, é uma invenção. A felicidade é uma invenção. O Nietzsche tem uma máquina de guerra, ele aponta essa máquina de guerra para a civilização e ataca essa civilização de todas as maneiras.
Para ele não sobra quase nada, porque algumas coisas sobram. Sobra o pensamento de Heráclito que afirma mudança. O Heráclito diz: ninguém se banha duas vezes no mesmo rio porque o rio muda e você muda.
Nietzsche gosta do Heráclito. Afirma o Heráclito. Nietzsche gosta da tragédia grega, e fundamenta o seu pensamento que chama de pensamento trágico na tragédia grega.
. . enfim Nietzsche tem alguns pontos na história que ele valoriza mas ele é extremamente crítico a civilização em todos os seus aspectos.
Por isso você ouviu falar que o Nietzsche é niilista. Mas niilismo não é o culto ao nada? O que ele quer dizer com culto ao nada?
Nietzsche. Ele diz: niilista é a civilização. Porque a civilização cultua o nada.
O que a civilização cultua? Cultua os modelos, as ideias, cultua Deus como uma unidade configurado com características: onipotente, onisciente onipresente. Então o que na verdade a civilização cultua, diz o Nietzsche: o nada.
Porque ela nega a única coisa que seria afirmativa. Só há uma coisa afirmativa que pode ser considerada de fato afirmação. O que é grande afirmação pro Nietzsche?
Que não seria niilismo. O que é a grande afirmação? A que você pode e deve dizer sim sempre, diz Nietzsche: a vida.
A vida é aquilo que nos é dado. Quando você nasce, você entra no processo de vida que tinha antecede. Tudo pode te afastar da vida e te tirar da vida.
A morte pode acontecer a qualquer hora. Então o que deve ser afirmado e dali deve nascer todos os valores humanos? A vida.
Mas a civilização, diz Nietzsche, não valoriza a vida. A civilização é uma contra natureza. Todo o papel da civilização é negar a natureza.
A gente até falou isso em outros episódios. Então se a civilização nega a natureza o que é civilização afirma? A felicidade?
Mas isso é uma ideia, não? Qual concretude tem nessa ideia de felicidade? Não é uma imagem?
Eu digo como como alvo. Mas não é só a felicidade. E a liberdade, já pensou nisso?
Liberdade, olha que palavra que promete muito e dá pouco. O que é liberdade? A gente cultua a liberdade, a gente cultua a honestidade.
O que é honestidade? Isso é tão relativo dependendo da situação, né não? Claro, a gente tem leis.
As leis determinam um caminho mas como você pessoalmente lida com cada uma dessas determinações? Por isso tem a ética. Porque a gente não tem clareza sobre os princípios ou como agir diante deles.
Enfim, para o Nietzsche, os valores que temos na civilização são valores niilistas porque eles cultuam tudo que é imagem. Isso a gente lembra alguma coisa né? Mas o Nietzsche tá falando no final do século 19.
Ele está dizendo: a civilização é niilista, tá dizendo naquela época, porque cultua imagens e signos. Ele está falando de linguagem, ele não tá falando de imagem ainda. Não tá falando de internet.
Ele não tá falando de audiovisual. Ele só está se referindo a linguagem. Então nós, humanos, nos utilizamos da linguagem para nos afastar da vida.
As produções de linguagem, de conhecimento, as produções que aconteceram até agora, não todas, ele estabelece em várias exceções, como eu falei tragédia grega e tem outros momentos também, mas a base da civilização é produzir afastamentos, negações, substituições. . .
então ao invés de me relacionar com o fenômeno de viver, que é o que de fato me compete, eu prefiro disputar com vocês as minhas roupas ou se eu tenho rugas ou se eu tenho curtidas na rede social. . .
E ele diz não existe alguma outra coisa que acontece. E esse acontecimento é a vida. Começando a finalizar.
Nietzsche é niilista? Se você diz que niilista é negar a civilização, Nietzsche é niilista. Mas o Nietzsche nega civilização em nome da vida.
Então o Nietzsche diria nessa pergunta: Não, eu não sou niilista. Quem é niilista é a civilização. Tem 3 tipos de niilismo, 4 na verdade.
Mas isso não foi o Nietzsche que falou. A ideia de vários niilismos é uma ideia do Gilles Deleuze, que é um filósofo francês que comentou muito obra do Nietzsche. Ele tem um livro chamado Nietzsche e a filosofia nesse livro, para nos ajudar a entender, ele faz essa ponte, nesse livro e diferencia o niilismo em quatro momentos.
Eu vou mostrar pra vocês rapidamente. Outro dia a gente fala de cada um com calma. Ele diz: a civilização começa com niilismo negativo que a primeira grande ordem de conhecimento que temos que é o judaico cristianismo.
Então o judaico cristianismo nega a vida em nome da vida depois da morte. Então o judaico cristianismo nos trata, a nossa experiência de vida, como erro e pecado. O corpo é fonte do pecado, o desejo é a fonte do pecado.
A uma série de negações da experiência do viver e isso é transferido, esse prazer de viver, essa alegria, para uma vida que viria depois da morte: o paraíso. E o paraíso exatamente onde não tem velhice, não tem tempo, não tem morte. Onde há uma eternidade e é algo que ele não consegue conceber, muito difícil conceber esse paraíso mas ele seria o alvo e não a vida.
Então, diz o Deleuze, esse nilismo chama-se neles negativo ele nega a vida em nome de uma vida depois da morte. Isso o Nietzsche chama de niilismo. Então o Nietzsche não afirma isso, o Nietzsche não seria niilista, pelo contrário.
O segundo niilismo da cultura da civilização chama-se niilismo reativo. É quando a negação já não é mais a negação da vida. É a negação do presente em nome do futuro.
Quem faz isso? A ciência. Ai vem a ideia da morte de Deus.
A ciência moderna vem negar Deus em nome de um outro paraíso que agora não vem depois da morte, ele vem no futuro. Um dia a ciência construirá no mundo um lugar perfeito, como paraíso. Vamos construir aqui.
Então a modernidade nasce como uma promessa de paraíso aqui na terra e a gente viu que paraíso bacana que nós herdamos. Aquecimento global, instabilidade climática. .
. então realmente chegamos a um paraíso. É isso que Nietzsche critica na ciência.
Na necessidade de consertar o mundo, como se pudéssemos como humanos. Como se o mundo fosse o quintal da nossa casa. Então isso é o niilismo da morte de Deus que o Deleuze chama de niilismo reativo.
Eu nego o presente em nome do futuro. Um dia, no futuro, eu penso no futuro dos meus filhos. .
. As pessoas costumam dizer: vamos preparar um futuro para as crianças. Ao invés da gente falar vamos preparar um presente para as crianças, a gente fala o futuro.
Tem sempre um futuro. O último niilismo chama-se niilismo passivo. Penúltimo na verdade.
É o niilismo passivo. O niilismo passivo vem quando a religião foi negada porque a gente não quer esperar morrer para atingir esse paraíso no niilismo negativo. No reativo a gente confiou na ciência, mas agora a gente já viu o aquecimento global, como acabei dizer, então diante de tudo isso, hoje, eu não posso acreditar que a ciência vai me produzir um futuro.
Então sem Deus, e sem o humano no centro de tudo resolvendo para mim, me dando um futuro, o que me sobra? Nada. O niilismo passivo, que é o nosso contemporâneo, é a hora em que a gente diz: nada vale a pena porque eu acreditei no futuro religioso, acreditei no futuro científicos por assim dizer, mas por meio de uma tecnologia e hoje eu vejo que nada disso aconteceu.
Esse niilismo passivo é extremamente difícil porque ele pode colocar em risco a humanidade. Esse momento que parece que nada vale a pena, ele pode significar exatamente o contrário: a inversão que é: eu não quero mais construir paraíso nenhum, eu quero viver a vida como ela é. Esse é o niilismo ativo, que seria o último niilismo.
Porque ainda se chama niilismo? Porque o niilismo pode significar afirmativamente: eu não quero acreditar em nada. Mas não é que eu não quero acreditar em nada porque eu acho que nada vale a pena, eu não quero acreditar em nada que me tira do presente, então eu não quero nada, é um niilismo.
Mas o que eu quero é a vida. O último niilismo é quando, ao invés de ter um alvo de felicidade, de casamento, de relacionamento, de amor, você tem o meio que é a própria vida em si. O amor, o casamento, relacionamento, trabalho são apenas acontecimentos na sua vida mas é preciso resgatar a vida como experiência, como existência, única e individual que é só sua.
Nietzsche é que cria essa coisa toda. O comentário é de Deleuze sobre a obra do Nietzsche. Então Nietzsche não é niilista.
Nietzsche é crítico radical da civilização. mas no momento a sei lá, 100 anos atrás, a civilização ia muito bem a 100 anos atrás. Então quando Nietzsche criticou toda a civilização há 100 anos atrás, ele era niilista, ele não acredita na ciência e não acredita no futuro né, há 100 anos atrás.
Hoje o Nietzsche é niilista? Não. Tudo que o Nietzsche criticou desaba na nossa cabeça, especialmente a verdade.
A maior crítica do Nietzsche é a ideia de verdade. Vivemos a época da pós verdade. Da Terra plana.
. . enfim também falaremos sobre isso, mas, no finalmente podemos dizer, Nietzsche não é niilista.
Nietzsche é um crítico da civilização. E ele traz de verdade uma grande afirmação, que a afirmação da vida. Para Nietzsche vale as pequena coisas, vale a relação imediata que a gente tem com um gesto de existir, resgatar a dignidade de viver, de existir, de estar no mundo, inclusive a dignidade do sofrimento, porque não?
Já que ele é inevitável. Então esse é o Nietzsche. exatamente não é niilista.
A gente se vê na próxima.