O professor e a escola têm o dever de não só respeitar os saberes dos alunos, esses saberes construídos socialmente nas suas práticas cotidianas, como também discutir com os estudantes a relação desses saberes com os conteúdos da disciplina. As matérias que os alunos estudam na sala de aula não podem ser desconectadas da vida. O professor precisa conhecer a realidade dos estudantes para que as disciplinas consigam dialogar com as necessidades e os desejos deles.
Por isso, as experiências que os alunos vivenciam no seu dia-a-dia devem ser refletidas na escola. Os saberes dos estudantes devem se conectar aos saberes da disciplina. E é por isso também que, quando um professor democrático planeja uma aula em uma turma de alunos das classes populares, é importante trazer as questões que fazem parte da vida deles para problematizar o conteúdo no sentido de torná-lo mais próximo de suas realidades.
Paulo Freire questiona: por que não incorporar a experiência que os alunos têm de viver em áreas da cidade descuidadas pelo poder público, para discutir, nas aulas de geografia, por exemplo, a poluição dos riachos e dos córregos, os baixos níveis de bem-estar das comunidades que vivem em torno de áreas degradadas; por que não utilizar a disciplina para analisar e compreender os malefícios que a degradação urbana e ambiental, que muitas vezes fazem parte da paisagem cotidiana do bairro onde eles moram, impõem à sua saúde e à sua vida? E por que há lixões no seu bairro, mas não naquele outro bairro? Por que o poder público cuida bem das ruas, das calçadas e das praças de alguns outros bairros, mas o mesmo poder público não cuida do bairro em que a sua escola está situada.
Algumas pessoas dizem que a escola não deve misturar os assuntos da realidade com as disciplinas escolares. Que o ensino deve ser neutro e não deve interferir na vida social dos alunos. Há quem diga que trazer as questões reais das condições de vida dos estudantes para dentro da sala de aula é demagogia e não tem nada a ver com educação.
Mas Paulo Freire pensa diferente. Ele argumenta que essa tradição das escolas de não relacionar os conhecimentos escolares com a realidade precisa mudar. Paulo Freire é o maior crítico desse modelo tradicional da escola brasileira, que sempre foi autoritária e que não ouve os estudantes.
Que fala "para" eles. Mas não "com" eles. Paulo freire argumenta que a pedagogia precisa criar mais pontes entre os saberes curriculares fundamentais aos alunos e a experiência social que eles têm como indivíduos.
Por isso, sabendo que existem questões políticas e ideológicas que concorrem para construir e organizar uma sociedade – e por consequência, para construir e organizar a escola, que está inserida na sociedade - o que observamos é que o ambiente escolar foi historicamente construído no Brasil como um espaço autoritário em que os alunos não têm o direito de participar do processo de transformação dos conhecimentos escolares, porque o aluno é tratado como uma caixa vazia que deve apenas receber o conteúdo e aceitar a escola, independente de suas necessidades ou curiosidades. Paulo Freire critica esse modelo. Por que não relacionar os saberes das disciplinas que eles devem aprender com a reflexão crítica sobre o descaso dos governantes pela escola que eles frequentam, pelo bairro em que eles moram, e que afetam diretamente a sua vida e a sua aprendizagem?
E ao refletir criticamente, por que os conhecimentos escolares não podem ser usados para mudar a situação? A escola não tem nada a ver com isso? Conhecimentos escolares devem se manter distantes da realidade?
Não podem ser usados para pensar e para transformar a vida dos alunos? A vida deles não pode entrar na escola? Por isso é preciso ficar claro que a opção por desligar a escola do mundo, neutralizar a crítica e impedir que alunos e professores transformem os conhecimentos escolares para refletir sobre as suas vidas e a sua realidade, é uma opção política e ideológica autoritária de quem tem medo da liberdade e de quem quer produzir alunos, trabalhadores e cidadãos passivos, resignados e submissos.
Ensinar exige respeito às necessidades, às curiosidades, aos desejos e às questões vivas que os alunos devem ter a liberdade de trazer à escola, para que possam, no contexto da disciplina, pensar sobre elas. O próximo vídeo apresenta o que Paulo Freire quer dizer quando argumenta que ensinar exige criticidade. Todos estão convidados a curtir a nossa página no Facebook e continuar os debates.
O link está aqui na descrição.