Há 200 anos atrás, 90% da população mundial estava abaixo da linha internacional de pobreza extrema que adotamos hoje em dia, o que seria o equivalente a ganhar algo próximo de 300 reais por mês atualmente. De lá para cá, essa situação mudou bastante, mas a pobreza ainda afeta várias pessoas em diferentes níveis. Eu sou o André, tenho um doutorado em psicologia e hoje, com a ajuda do amigo e psicólogo Victor Keller, quero falar com você sobre algumas das consequências psicológicas da pobreza e como elas atrapalham a pessoa que vive essa situação a sair dela, mesmo que queira muito.
Se você achou relevante o assunto que a gente vai abordar hoje, não deixa de clicar no joinha que ajuda muito a gente, inscreva-se no canal e siga a gente nas redes sociais! Pobreza não é apenas o mesmo que ter pouco dinheiro. Quem a vive pode não ter ou ter pouco acesso a atendimento médico, educação, transporte, moradia e comida.
Essas pessoas também estão mais vulneráveis à violência, às drogas, à poluição e à condições sanitárias mais precárias. Um exemplo disso pode ser visto na atual pandemia, já que, de acordo com a OMS, as vacinas para proteger as pessoas da COVID-19 são mais escassas em países mais pobres. Também existem dados indicando que, em bairros mais ricos de São Paulo, a vacinação está muito mais avançada do que em bairros mais pobres.
A pobreza é capaz de afetar a mente humana de várias formas e um dos seus piores efeitos ocorre antes mesmo da pessoa nascer. A desnutrição e a exposição de mulheres grávidas à poluição podem ter consequências graves para o desenvolvimento do feto. Durante a infância, a desnutrição e a poluição podem ter um efeito especialmente prejudicial para o desenvolvimento do cérebro.
Alguns estudos já demonstraram que crianças expostas a essas condições costumam ter prejuízos nas suas capacidades de atenção, memória, raciocínio e inteligência. Muitas vezes não é só a presença de coisas ruins que prejudica o desenvolvimento infantil, mas também a ausência de certas coisas muito boas. Para que certas habilidades se desenvolvam da maneira ideal, o cérebro infantil precisa ser exposto a estímulos específicos.
Um dos melhores exemplos disso ocorre na aquisição de vocabulário. Ter um bom vocabulário depende de uma exposição frequente e diversificada a conversas na infância. Crianças com menos oportunidades de educação e de socialização tendem a ouvir um número menor de palavras e isso pode se relacionar com um vocabulário mais limitado na fase adulta.
A pobreza também impacta negativamente os pensamentos e os comportamentos ligados ao dinheiro. Várias das decisões necessárias para acumular bens e sair da pobreza, como investir em um negócio ou guardar dinheiro para o futuro, exigem que você consiga planejar os seus gastos e segurar o dinheiro dentro da carteira. O que algumas pesquisas indicam é que viver a pobreza reduz tanto a capacidade de correr riscos calculados quanto de abrir mão de um ganho imediato para obter um ganho mais elevado no futuro.
Isso tem a ver com um viés cognitivo conhecido como desconto do futuro, que é a tendência a preferir recompensas imediatas do que recompensas futuras, mesmo que a recompensa futura seja maior. Você prefere ganhar 1. 000 reais agora ou 2.
000 reais daqui há 6 meses? A maioria das pessoas tende a preferir ganhar menos agora, do que ganhar mais depois, embora isso também dependa da quantidade de dinheiro envolvida e do intervalo de tempo que a pessoa precisaria esperar. Essa tendência a favorecer o ganho imediato é bem difundida na população geral, mas é ainda mais forte em pessoas que vivem em situação de pobreza, até por geralmente possuírem uma história de vida na qual lidar com as demandas urgentes do presente era o que importava.
Um outro efeito psicológico comum da pobreza é a sobrecarga cognitiva, assunto que já abordamos aqui no canal. Ter poucos recursos muitas vezes significa ter que escolher entre suprir uma necessidade básica em detrimento de outras, como comer ou se abrigar. Quanto mais alguém precisa tomar esse tipo de decisão difícil, mais provável é que a sobrecarga cognitiva surja.
Ela, por sua vez, prejudicará a capacidade de tomar qualquer outra decisão. A pobreza também atrapalha a tomada de decisão através do seu efeito no estado emocional da pessoa. Geralmente, um humor positivo nos ajuda a tomar decisões financeiras melhores, já um humor negativo ou o estresse tem o efeito contrário.
Não ter o mínimo de recursos para garantir seu bem estar ou o da sua família tende a ser uma experiência estressante, e viver isso todos os dias só torna tudo mais difícil. O que algumas pesquisas indicam é que pessoas com um humor negativo são mais propensas a tomar decisões financeiras piores e apresentam o viés do desconto do futuro de maneira mais intensa. Além de afetar o humor, a pobreza também està ligada a um maior sofrimento psicológico e a mais problemas relacionados com a saúde mental.
A chance de alguém possuir um transtorno mental é maior conforme o seu nível de pobreza é mais grave. Isso não quer dizer necessariamente que a pobreza induz o surgimento de transtornos, já que o próprio transtorno pode ser um dos fatores que levaram a pessoa à pobreza. Alguém com depressão, por exemplo, poderia começar a faltar muito o trabalho até ser demitido.
Só que quando medidas de combate à pobreza são tomadas, as taxas de transtornos mentais tendem a diminuir, sugerindo que a pobreza era pelo menos uma das causas desses transtornos. Pessoas em situação de pobreza também são vítimas do julgamento dos outros. Esse julgamento é uma forma de classismo e ele engloba o preconceito, a discriminação e os estereótipos que existem contra pessoas que são parte de uma classe social vista como menos poderosa.
Elas são frequentemente vistas pelos outros como possuindo menos valor, sendo mais preguiçosas, menos inteligentes, educadas e mais propensas a cometer crimes. Elas também recebem com maior frequência um tratamento de menor qualidade por parte de profissionais da saúde e têm uma chance menor de serem contratadas para alguns empregos. Tudo isso acaba limitando as oportunidades que pessoas em situação de pobreza terão para expandir o seu círculo de contatos e conseguir um emprego, o que contribui para que elas permaneçam nessa condição desfavorável.
Considerando que muitos fatores atrapalham pessoas em condições de pobreza, não seria de surpreender que elas tendessem a acreditar que são menos capazes de alcançar seus objetivos. Chamamos na psicologia de autoeficácia a crença de que você tem a capacidade de alcançar seus objetivos. Alguém com baixa autoeficácia se sente motivado a ter objetivos menos ambiciosos, persistir menos quando encontrar obstáculos e se esforçar menos nas suas tentativas de alcançá-los.
Alguns estudos sugerem que a pobreza está associada a uma autoeficácia mais baixa. Apesar da lista de consequências negativas da pobreza ser longa, existem consequências não negativas também. Um conjunto de pesquisas nos Estados Unidos revelou que pessoas com menos recursos são melhores em reconhecer como as circunstâncias afetam as emoções e os comportamentos das pessoas.
Por exemplo, pessoas que viveram com poucos recursos tendem a ter mais facilidade para perceber que o desempenho ruim de um funcionário pode resultar de fatores externos ao funcionário, como um ambiente de trabalho ruim. Já pessoas com mais recursos tendem a superestimar a influência de características pessoais em situações como essa. É mais provável, por exemplo, que alguém com mais recursos veja o funcionário com um desempenho ruim como alguém incompetente ou preguiçoso.
Ser mais sensível ao impacto das circunstâncias faz com que pessoas que viveram a pobreza sejam mais empáticas, reconheçam melhor as emoções dos outros e estejam mais dispostas a ajudar alguém que precisa. Todos as influências negativas que descrevemos ao longo do vídeo contribuem para manter as pessoas em situação de pobreza no lugar em que elas estão e dificultam bastante a vida de quem quer sair desse contexto. Muitos acham que o que falta nessas pessoas é apenas força de vontade, mas isso não é tão simples assim.
Os fatores que dificultam a ascenção social e financeira dessas pessoas são muito poderosos e mesmo assim alguns conseguem superá-los, mas a um grande custo e geralmente com uma boa dose de sorte também. Nos últimos 30 anos, a pobreza mundial diminuiu drasticamente. Apesar disso, a previsão de muitos economistas é que os países mais pobres do mundo vão diminuir cada vez mais lentamente os seus níveis de pobreza.
No Brasil, a pobreza veio decrescendo desde 2003 até 2014, quando voltou a subir. Com os impactos da pandemia do coronavírus e de outros fatores, os índices de pobreza no Brasil subiram bastante. Hoje existem em torno de 27 milhões de brasileiros em situação de pobreza extrema, e isso sem contar no grande número de pessoas desempregadas, com grandes dificuldades financeiras e de acesso a serviços básicos.
Mesmo que já tenha sido maior no passado, reduzir a pobreza continua sendo um dos maiores desafios dos nossos tempos. Os estudos sobre os impactos psicológicos da pobreza vem demonstrando como ela pode ser prejudicial para o bem estar e como pode ser difícil para alguém vivendo nesse contexto sair dele. Muito obrigado a todos vocês que são apoiadores ou apoiadoras oficiais do Minutos Psíquicos.
Vocês são uma grande motivação para a gente continuar fazendo vídeos educativos aqui no YouTube, e se você gosta do nosso trabalho, mas ainda não é um apoiador nosso, clique em "SEJA MEMBRO" aqui embaixo para saber quais são os benefícios exclusivos que a gente oferece em troca do seu apoio. Hoje eu falei sobre algumas consequências psicológicas da pobreza no desenvolvimento, na tomada de decisão, nas emoções, na saúde mental e na autoeficácia. Também descrevi que viver a pobreza pode aumentar a empatia e a capacidade de reconhecer como as circunstâncias afetam as pessoas.
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