atenção este vídeo tem spoilers tem algumas cenas de cinema que se tornam tão emblemáticas e clássicas que mesmo que você nunca tenha visto esses filmes você ainda assim consegue reconhecer as imagens e quando o assunto é faroeste Talvez um dos exemplos mais famosos disso seja o plano final de Rastros de Ódio o longa lançado em 1956 estrelado por John Wayne e dirigido pelo mais famoso diretor de faroeste de todos dos tempos o John Ford essa é uma imagem que já cativa os olhos só pela sua composição visual mas quando você vê essa cena dentro do
contexto do filme Ela fica ainda mais impressionante graças ao seu simbolismo e hoje em dia essa imagem ganha ainda outro significado um que o filme provavelmente nem quis trazer conscientemente uma camada Extra que veio com o tempo e que mostra porque Rastros de Ódio é um filme tão importante de ser estudado e relembrado na história do cinema em Rastros de Ódio somos apresentados a ethan um veterano que perdeu a guerra civil americana e que agora retorna ao lar da família até que um dia enquanto o iany e seu sobrinho adotivo estão longe de casa a
família é atacada por uma tribo de comanches que matam quase todo mundo e raptam a caçula Deby e assim vemos o ethan e o sobrinho Martin embarcarem numa jornada em busca dos comanches para tentar resgatar a criança uma jornada que obviamente vai testar a resiliência da dupla enquanto eles buscam pistas lutam contra comanches reencontram antigas amizades e romances e são alvos de desconhecidos que querem se aproveitar dos protagonistas e assim 5 anos se passam até que chega o dia em que ethan e Martin finalmente descobrem onde a Deb está agora uma moça crescida vivendo com
os comanches então num Resgate final eles atacam matam o líder comand xcar e levam AD Deb de volta para casa e é aí que chegamos na famosa cena final todos vão entrando felizes com o retorno de Deby mas é aí que o ethan hesita para dá meia volta e vai embora mancando sozinho enquanto vemos a porta se fechar em termos visuais esse plano é fascinante em primeiro lugar porque ele é o fechamento de uma rima visual que o Ford traz constantemente pro filme que é a das portas que criam quadros dentro do quadro em diversos
pontos da história mas a rima visual mais poderosa mesmo é com o plano de abertura do filme quando vemos a Martha abrindo a porta de casa e vendo o ean se aproximando pela primeira vez depois de voltar da Guerra quando a gente coloca os dois planos lado a lado a gente vê então que o fechamento traz uma simetria com o início o caubói que antes era recebido de portas abertas agora se afasta na direção oposta enquanto a porta se fecha atrás dele mas apesar dessa semelhança com o começo o plano final traz um peso dramático
muito maior não só por carregar consigo o ponto final de uma história que a gente acompanhou por duas horas mas também pela composição específica desse plano o quadro reduzido criado pela porta deixa o ethan enclausurado enquanto a figura imponente vai se transformando num homem cansado e danificado diminuindo no quadro até desaparecer por trás da porta o que demonstra que muito do impacto da cena vem também da performance silenciosa de John Wayne o olhar melancólico que toma conta do rosto dele destoa da expressão rígida padrão do personagem tem também esse gesto peculiar que ele faz com
os braços é um movimento quase doce e inseguro que sugere a vulnerabilidade que withan tenta esconder do mundo o tempo inteiro e o fascinante é que esse gesto não estava no roteiro na verdade isso foi um improviso de John Wayne mais do que isso essa foi uma homenagem que o ator fez a um dos seus heróis Vale lembrar Afinal que John Wayne não foi o primeiro astro do faroest nas décadas antes dele despontar outros atores se tornaram lendas do gênero e um desses caras era o ator Harry Carry e ele era um ídolo de Infância
do John Wayne que que cresceu vendo o ator nos faroestes e sendo fã do Carry o John Way conhecia muito bem o estilo de atuação do ídolo incluindo um maneirismo muito peculiar do [Música] Carry pois bem agora Corta pro dia em que o John Way estava lá filmando a cena final de Rastros de Ódio a essa altura o herói de Wayne já tinha falecido mas dois familiares do Carry estavam lá no set contracenando com o John Wayne A Viúva de Harry Carry a Olive Carry é a atriz que interpreta a senhora jorgensen e o filho
do Falecido ator o Harry Carry jior interpretou Brad jorgensen pois bem no momento de filmar essa cena final a Olive Carry estava lá assistindo tudo por trás das câmeras e quando o Wayne viu a atriz ali no set ele decidiu improvisar uma homenagem discreta ao marido dela eternizando o herói de John Way no que acabaria virando uma das imagens mais famosas do [Música] [Música] cinema agora veja bem não é como se fosse novidade terminar um farest assim mostrando o protagonista indo embora se afastando das pessoas que passou o filme inteiro ajudando na verdade a essa
altura isso já era uma tradição mostrando que o protagonista agora partia para a promessa de Novas Aventuras mas em Rastros de Ódio o Ford subverte esse final Triunfante porque aqui o protagonista não tá indo na direção de um Recomeço pelo contrário Esse parece ser o Fim da Linha pro ethan um homem que vai embora destruído e desiludido consigo mesmo entendendo que ele não tem mais lugar nessa realidade e que nunca vai se ajustar ali é uma versão muito muito mais amarga do tropo do Caubói indo embora sozinho e por isso a cena acaba se tornando
um dos exemplos mais singulares dessa tradição do faroeste e o impacto dessa imagem foi imenso com o passar do tempo Rastro giod foi sendo cada vez mais tido como uma das obras primas de John Ford não é à toa que tantos filmes que vieram nas décadas seguintes Puxaram várias de suas ideias desse longa às vezes até reproduzindo certas cenas do clássico E é claro que a imagem mais marcante do longa acabaria ganhando releituras em outros filmes indo de KB que fez duas releituras dessa imagem passando por Os Vingadores A Era de Ultron e chegando a
títulos mais recentes como nomad Land e predador A Caçada só para citar alguns exemplos então deu para ver que por trás dessa cena famosa estão vários detalhes e várias histórias fascinantes mas também é muito importante que a gente não caia em uma certa armadilha ao falar dessa imagem que é a armadilha de analisar a a cena isolando ela do restante do filme Como Se ela existisse no vácuo e não se relacionasse com as partes de Rastros de Ódio que também fazem esse filme ser controverso Principalmente quando o assunto é o discurso racial da obra porque
se tem algo que nos choca quando a gente assiste ao filme é o fato do protagonista ser abertamente racista e orgulhoso disso quando ele fala dos nativos é com um ódio profundo um sentimento que fica ainda mais forte depois que os comanches atacam a família dele e raptam a Deb o od doan cresce tanto depois disso que ele quer arruinar a vida dos nativos até mesmo no pós-vida é o que a gente vê quando ele encontra um Comanche morto e atira nos olhos dele porque segundo a crença dos comanches isso condenaria a alma do homem
morto e esse racismo dele é tão profundo que afeta até mesmo o jeito como ele trata as pessoas brancas próximas dele quando ele descobre que o sobrinho adotivo tem descendência de nativos ele passa a detestar o cara imediatamente e depois quando ele descobre que a sobrinha Deb que ele tanto adorava foi raptada para crescer entre os comanches ele tomou uma decisão drástica ele resolve que vai encontrar a Deb não para trazê-la de volta para casa mas sim para matá-la porque segundo wian viver entre nativos é pior do que a morte toda essa postura choca a
gente hoje em dia e chocou o público lá nos anos 50 também porque antes desse filme Os Heróis que o John Wayne interpretava nos forests de John Ford eram escritos para parecerem nobres admiráveis mocinhos mesmo só que com Rastros de Ódio John Ford trouxe algo diferente pro seu Astro mais famoso agora o diretor trazia o John Wayne fazendo um homem explícitamente odioso que bradava o seu racismo pro público inteiro ouvir veja bem não é como se os personagens anteriores do a não fossem racistas era mais que esse racismo Estava sim presente mas o filme não
ficava apontando o dedo explicitamente para essa questão mas Rastros de Ódio rompeu com essa ideia trazendo pras palavras do protagonista todo aquele racismo e isso foi impactante pro público da época que não esperava ver o John Wayne ser representado como um personagem questionável e escandaloso Como é o ethan Aliás mais do que trazer o racismo do whan de forma explícita o filme usa esse ódio do personagem como um dos seus principais temas todo o arco do ean é baseado nesse sentimento mostrando como o ódio cresce se transforma numa obsessão e quase leva o protagonista a
matar a própria sobrinha mas no último segundo a gente descobre que ele mudou de ideia o ean deixa o ódio exacerbado de lado e leva a sobrinha de volta ao lar e talvez por ter finalmente compreendido como o ódio que ele sente é capaz de quase destruir até mesmo quem ele ama talvez por isso ele decida não fazer parte da comemoração no final dar a meia volta e se isolar para o homem odioso não existe final feliz mais do que isso pro homem odioso resta a condenação Porque como muitos críticos já apontaram esse final não
deixa de ser uma ironia com o ethan lembra que mais cedo ele quis condenar a alma do nativo morto ao atirar nos olhos dele pois é no final essa é exatamente a punição que o iton recebe e quando a gente percebe que o ciclo do ódio e do racismo é um tema que o Ford quis debater pode ser fácil a gente achar então que esse não é um filme racista mas sim um filme que quer criticar o racismo ainda mais se a gente lembra que em outros momentos o longa também parece mostrar parte da perspectiva
dos comanches Afinal em certa cena os protagonistas encontram uma tribo completamente massacrada por soldados brancos já em outra cena a gente descobre que o líder dos comanches que atacaram a família do ethan tem um motivo para isso ele revela que homens brancos mataram os filhos dele e por isso ele quer se vingar a violência cometida pelos americanos é questionada aqui mesmo que brevemente E isso não era de prae no faroeste da época então Alguns podem ver isso tudo e chegar mesmo à conclusão de que o Ford estava subvertendo a tradição que ele mesmo ajudou a
criar no faroeste a de vilanizar de forma racista os nativos e de transformar o genocídio Contra esse povo em entretenimento para o público Branco porém por mais que o filme comece sim a desconstruir um pouco essa tradição Cruel a verdade é que Rastros de Ódio Não é uma verdadeira crítica ao racismo ele ainda é um filme extremamente racista basta olhar pro restante do longa que isso fica evidente para começo de conversa tem o racismo do ethan sim é verdade que o longa quer representar esse ódio do protagonista como algo chocante E se ele fosse a
única fonte de racismo do longa se todos os outros personagens confrontem o ean sobre o racismo dele isso poderia fazer a gente enxergar a obra como uma crítica a esse ódio Mas se a gente observar nenhum personagem questiona isso todos eles odeiam e temem os comanches também para eles isso é natural e justificado pelo menos até certo ponto mas o ethan claramente passa desse ponto então quando os demais personagens confrontam ele não é para colocar o racismo do ethan em cheque mas sim para demonstrar que talvez ele esteja sendo um pouco racista demais e quando
a gente olha para representação que o filme faz dos comanches o racismo da obra fica ainda mais Evidente tem por exemplo o uso do Red Face a prática de escalar atores brancos para interpretar personagens nativos que é o caso do Henry Brandon escolhido para interpretar o chefe Scar fora isso tem a representação estereotipada dos comanches como seres ou puramente cruéis ou puramente risíveis por serem supostamente atrasados e selvagens entre aspas e o efeito dos comanches nos brancos também seria supostamente terrível porque quando ethon e Martin encontram mulheres brancas que foram resgatadas após viverem entre os
comanches elas são retratadas como mulheres que tiveram a sanidade arruinada só por se associarem aos nativos O resultado é uma desumanização total dos comanches até mesmo o Scar que ganha um pouco mais de tridimensionalidade ainda se mostra como uma grande caricatura porque a motivação de Vingança dele surge e some num piscar de olhos ao invés de ser um ponto de partida para uma representação verdadeiramente humanizada não toda a humanização de Rastros de Ódio toda a tridimensionalidade dramática ainda é reservada somente aos personagens [Música] brancos também é essencial observar como são retratadas as violências do filme
quando a violência é cometida pelos comanches ela é magistralmente dirigida por Ford para criar suspense e horror mas quando a violência é cometida pelos homens brancos aí ela não é terrível ela é heróica a gente percebe essa diferença especialmente graças à trilha sonora composta pro filme por Max Steiner quando os comanches atacam a música é tensa e inquietante e quando os brancos atacam a música é [Música] triunfal ah Max mas você não acabou de falar que tem uma cena que mostra um massacre cometido pelos homens brancos sim de fato mas esse é um massacre que
é justificado pela história já que esses comanches tinham sequestrado mulheres brancas Então se os brancos matam esses nativos é só porque Eles teriam supostamente merecido não é à toa então que os meus sentimentos em relação a Rastros de Ódio sejam tão mistos é inegável que o long é dirigido com maestria E cria imagens deslumbrantes para embalar uma história poderosa sobre ódio e também é fascinante perceber como Ford aqui faz a suas primeiras tentativas de fazer um certo revisionismo pro gênero que ele mesmo moldou no cinema introduzindo timidamente certas reflexões e questionamentos sobre racismo e violência
Mas no fim esses primeiros passos vão sempre me parecer isso primeiros passos esforços iniciais de desconstrução que acabam sendo engolidos pela dema partes da obra que ainda estão presas na reprodução de tradições mais perturbadoras do faroeste e que fazem a experiência do filme ainda ser Muito desconfortável mas aí entra outra questão também acontece que esses primeiros passos de revisionismo do Ford ainda que cambaleantes também foram essenciais para mudar a filmografia do diretor e o cinema como um todo porque com o passar do tempo o Ford pode desenvolver esse revisionismo ainda mais a ponto de criar
obras primas que trabalham essa desconstrução do faroest com muito mais destreza como é o caso do longa que ele lançou se anos depois o homem que matou o facinora um dos meus filmes favoritos da vida e quando o maior diretor de faroestes começa a fazer revisionismo do gênero isso abre caminho para que mais cineastas façam o mesmo não à toa mais e mais diretores foram lançando filmes que questionavam como faroest moldou o Imaginário Popular sobre homens brancos sobre na sobre como os Estados Unidos foram construídos e desses novos esforços foram nascendo ainda mais obras primas
sob essa perspectiva a gente começa a enxergar que apesar dos seus problemas Rastros de Ódio é inegavelmente um ponto de virada na história do faroeste uma obra que mesmo com as suas contradições Conseguiu dar indícios de novas possibilidades pro gênero a ponto de inspirar filmes que revolucionariam o faroeste mais adiante e assim a gente chega no momento atual em que o que não faltam são exemplos de como o faroeste não precisa mais ser sobre homens brancos sendo enaltecidos por matarem nativos esses dias Ficaram para trás e é assim que a gente volta pra cena final
de Rastros de Ódio porque com toda essa perspectiva histórica que a gente trouxe a despedida do ethan começa a parecer quase uma Premonição do que aconteceria com o faroeste da li em diante uma profecia de que os cowboys antes Idol trados por sua violência racismo e genocídio se tornariam coisa do passado figuras que não teriam mais lugar no mundo cada vez mais consciente dos problemas que esses homens de ontem representavam é o início do fim pro herói tradicional de faroest condenado a virar cada vez mais um fantasma que vaga sozinho enquanto o restante do mundo
fecha a porta em suas [Música] costas perceb então que destrinchar hoje o final de Rastros de Ódio Não significa que a gente precise se ater somente à sua proeza de composição visual ao seu simbolismo e às homenagens que essa Cena ganhou não é perfeitamente capaz e talvez até mesmo necessário que o estudo dessa cena se lembre também do lado mais desconfortável de Rastros de Ódio porque esse lado questionável é essencial pra gente apreciar o quão rica é essa imagem e perceber como o tempo trouxe uma nova camada para essa cena uma camada que fez o
desfecho extrapolar a intenção original da obra e ganhar significados muito maiores que nem mesmo John Wayne e John Ford poderiam ter previsto são pouquíssimas as cenas de cinema capazes de fazer isso de não só manter Mas também de aumentar a sua aura de Fascínio com o passar dos anos e o fato do desfecho de Rastros de Ódio fazer isso com tanta complexidade até hoje é a maior prova de que essa definitivamente é uma imagem que não deve ser esquecida galera muito obrigado por terem visto o Episódio de hoje Rastro Jó foi o último filme que
a gente debateu no nosso cineclube entre planos e se você também quiser fazer parte dele você pode entrando na nossa comunidade de apoiadores assim você ajuda a financiar o nosso trabalho todos os meses e ganha acesso a conteúdos e eventos exclusivos tem recomendação de filme toda semana no inbox do seu e-mail grupo fechado lives exclusivas E também o nosso Cine Clube entre planos para fazer parte dessa comunidade é só clicar no link que tá aqui embaixo na descrição e lembrando também que se quiser me acompanhar nas redes sociais é muito fácil basta vocês me procurarem
usando os nomes que estão aparecendo aqui embaixo de mim mais uma vez muito obrigado pela audiência um abraço e até a próxima [Música] sessão Y