Você está no Kinobox! [Introdução] ♪ [Dani] você deve está achando que existem muitas diferenças entre documentário e ficção, ne? Eu vou te falar que as diferenças não são tantas assim, a principal delas é que o documentário usa a realidade como matéria-prima, a ficção cria uma realidade do zero.
A partir do momento em que a realidade vira filme, ela fica sujeita às mesmas regras da narrativa. Documentário também é narrativa. Então, tudo que a gente já falou aqui sobre a construção dos personagens, Expectativa, conflito, primeiras cenas, sentimento universal, até arco dramático dependendo do tipo de Doc, tudo isso deve ser usado no documentário também.
Então, se você aquela pessoa que não tava assistindo as aulas porque acho que nada daquilo ia servir para você, má notícia. Tá aqui a Playlist com as 35 aulas para você assistir, volta lá atrás e pega esse conteúdo que você perdeu, porque tipo 85 porcento do detalhe serve para você também, só que o seu desafio é ainda maior na minha opinião. Porque você não pode criar qualquer coisa para fazer sentido narrativo, você tem que ter um olhar mais aguçado para conseguir perceber na realidade, como você vai criar expectativa no seu público, por exemplo.
Então, o seu desafio, na minha opinião, é ainda maior e tudo começa na escolha da história. [Aula 6 – Roteiro de Documentário] Olá pessoal, sejam bem vindos a academia Kinobox de cinema, prazer, eu sou a Dani e hoje a gente vai fazer uma aula para aqueles que querem contar uma história da vida real. Geralmente, quando a gente quer fazer um documentário é porque a gente esbarrou como história ou com um personagem que a gente achou interessante que a gente quer registrar.
E aí a gente está nesse lugar de cineasta, de diretor e roteirista que geralmente no documentário a mesma pessoa A gente fica se sentindo na obrigação de controlar as coisas, é muito comum a gente querer fazer um documentário sobre um tema que a gente domina ou que a gente vive. Então a gente fica achando que a gente sabe tudo sobre aquilo. Primeira coisa, se livra dessa convicção, se livra das suas certezas porque você precisa se preparar para o que é inesperado, documentário tá muito suscetível ao que é inesperado, isso dá toda a graça para dinâmica da coisa.
Se você começa um filme documentário achando que você já sabe onde você vai chegar. Provavelmente, você vai chegar lugar muito menos interessante do que você poderia. Então, se livra das suas convicções, mesmo que lá na frente elas se mostrem verdadeiras, se livra delas nesse momento para abrir os seus horizontes.
E para isso, é importantíssimo você ter referência, você ler muitas coisas relacionadas, você conversar com pessoas que de alguma forma domina o assunto que você vai falar. Mesmo que nada disso entre no seu filme, porque isso vai te inspirar, isso vai te dar embasamento e isso é super importante. E eu não tô falando aqui só de filme histórico, eu tô falando de filme familiar também.
Se você vai falar sobre a sua família, conversa com a sua família. Isso vai ajudar você a não ser muito raso, por exemplo, ou a não falar alguma besteira. Isso vai te dar insumos, digamos assim.
Porque se eu tô falando que a realidade para um documentário é a matéria-prima, Quão mais matéria-prima você tiver, mais jogo de cintura você vai ter ali para construir uma narrativa interessante. Claro que tem aquele limite para você não enlouquecer. Ainda mais aqui no contexto da oficina, que a gente está fazendo um filme rápido, também não vai arrumar 400 horas de material, tem também o seu limite.
Então vamos lá, antes da gente falar de roteiro de documentário, vamos falar sobre os tipos de documentário que existem. Existe o Doc Expositivo, [Expositivos] O Doc Expositivo é aquele que de fato expõe alguma coisa, expõe com argumentos. Então é muito comum a gente ver em documentário aquela narração em terceira pessoa, que é aquela narração que sabe de tudo e que vai te apresentar os detalhes daquilo ali que tá acontecendo.
Ou, então ser um filme “cabeças falantes”, já ouviu esse termo? “Cabeças falantes” são aqueles filmes bem comuns, que tem várias entrevistas para fazer o documentário, por isso que é cabeça de falante. Esse tipo de documentário é super comum e você já deve estar se ligando em que tipo de filme é esse que eu tô falando.
“O dilema da redes” da Netflix é um desses casos de documentários expositivos. Tem também os documentários observativos, que aquele tipo de documentário que não se envolve, você fica só assistindo aquela realidade se desenvolver na sua frente, mas o filme não se envolve com aquilo. É um jeito muito comum de filmar por exemplo vida animal, vida animal sempre é, sempre não né, não dá para dizer sempre, mas geralmente é desse jeito, tipo “A Marcha dos Pinguins”, que você fica vendo os animais vivendo e não se envolve ali em nada que acontece.
É um jeito também muito comum de filmar manifestações culturais, então tipo festas ou protesto, por exemplo, geralmente é filmado do jeito observativo, aquele filme sobre o impeachment da Dilma, “O processo”, por exemplo, ele é bem observativo nesse sentido. Tem também os documentários participativos, [Participativos] que é quando o cineasta realmente se envolve naquilo, eu vou dar um exemplo de um filme que também fala sobre o impeachment da Dilma, para você poder perceber as diferenças de como uma mesma história, um mesmo tema a ser lido de forma completamente diferente, que é o “Democracia em Vertigem”, o “Democracia em Vertigem” é participativo, diferente do processo ele não fica só observando. A Petra Costa que é a diretora, ela fala ativamente na em primeira pessoa o filme inteiro.
Têm os documentários reflexivos, [Reflexivos] que são, que propõe um pensamento, mais do que necessariamente argumentar um ponto de vista. O “The Gooplab”, por exemplo, daquela série é um desses tipos de documentário que ela fala de experimentações psíquicas e meio que convida o espectador a abrir a mente com relação a isso, a refletir com relação a isso. Têm também os documentários performáticos, [Performáticos] que acabam sendo meio próximos da ficção, “Jogo de cena”, do Coutinho é um exemplo.
E tem também documentários poéticos, [Poéticos] que são aqueles que não tem nenhum compromisso com uma estrutura ou como fazer você entender determinado assunto. Eles querem mais eu te despertar um sentimento ou uma sensação sabe? São filmes mais artísticos, mais Cult, para você ficar viajando nas imagens e narrativas ali que são criadas.
Esses são os documentários mais comuns no estudo de documentário, mas para mim essas categorias não são suficientes. Eu diria pelo menos que tem também os Docs biográficos, tem os Docs históricos, tem os Docs que são mais expositivos, são os Docs denúncia mesmo, que aponta o dedo para uma ferida, tem os Docs investigativos, tipo a série “Making a murder”. Tem, também, um tipo de documentário que eu gosto muito, que é o Doc dispositivo, que é quando você estabelece umas regras para aquele documentário e essa é a única coisa que tá redondinha no seu filme.
Todo o resto acontece a partir dessa regra que você estabeleceu, é tudo muito imprevisível. Eu acho esse tipo de documentário muito interessante. Tem um filme que talvez seja um pouco difícil de assistir, mas que eu vou citar mesmo assim, que é “Rua de Mão Dupla”, do Cao Guimarães, o quê que ele faz, ele pega pessoas que não se conhecem e fala para elas trocarem de casa por 24 horas.
Esse é o dispositivo do filme, essa é a regra que ele criou. E aí a partir dessa troca, várias coisas acontecem que ele não tem como prever, o filme é a partir do que surge desse dispositivo, dessa regra que ele criou. Eu gosto de falar de tipo de documentário porque você não precisa, necessariamente se manter fixo a um deles, eu gosto de falar disso para gente poder expandir um pouco mais essa percepção.
Pode ser que você queira misturar tipos diferentes de documentário em um só, isso pode ficar super interessante. Isso também não significa que se você se delimitar a um tipo de documentário você vai estar limitando a sua linguagem, por exemplo. Por linguagem o quê que eu quero dizer, eu quero dizer os recursos que você vai usar para contar sua história, ela vai ser mais cabeça de falantes só entrevistas, ela vai usar mais imagem de arquivo, você vai pegar a sua câmera aí você vai dar na mão de uma pessoa para ela que filma a realidade dela?
Tudo isso é questão de linguagem, quais são os recursos que você vai usar para contar aquela história. Eu vou te dar 3 exemplos de curtas-metragens documentários que usam linguagens bem diferentes, para você ter um pouco de noção do que eu tô falando. O primeiro curta-metragem é “Sair do armário”, ele é um curtas sem uma imagem, é tudo tela preta e a gente escuta a conversa entre uma mãe e uma filha, mesmo assim, a primeira vez que eu assisti eu fiquei arrepiada dos pés à cabeça.
Já o curta-metragem “Guaxuma”, o link está aqui na descrição, ele usa a animação, ele é uma autobiografia linda que usa animação. O quê que te impede de usar animação numa história real eu te pergunto? Para os alunos da oficina vai ficar um pouco mais complicado porque animação costuma levar um tempo para ficar pronta.
Mas, entende o que eu quero dizer, as possibilidades são muitas. Eu ainda vou falar aqui sobre o clássico “Ilha das Flores”, esse filme se você não assistiu para tudo, inclusive essa aula. Vai lá assistir porque é um documentário genial, que fala sobre desigualdade social, que é um tema relativamente batido, mas de um jeito e com uma linguagem que mistura ficção e que vai indo e voltando evoluindo como se fosse uma mola, sabe?
Nossa, o jeito que ele faz é muito interessante e tem uma linguagem completamente inusitada para um documentário. Eu tenho certeza que vai te inspirar muito na hora de fazer o seu filme, mesmo que você não use nada do que tem ali, você vai começar a perceber o mundo de possibilidades na hora de contar uma história real. O que que eu quero dizer com isso tudo?
você que achava que a realidade era o seu fator limitante, se enganou meu bem. O fator limitante é a sua criatividade, os recursos para contar uma história real são tão infinitos, quantos os recursos para contar uma história de ficção. [>>>Escrevendo o Roteiro] Show de bola Dani, como é que eu escrevo um roteiro de documentário então.
Vamos lá, o roteiro de documentário é bem mais flexível do que um roteiro de ficção e um dos motivos para isso é que o documentário nunca para de ser escrito, nunca mesmo, enquanto você está pesquisando você vai descobrir coisas novas, você vai reescrever esse roteiro. E quando você tá filmando então, nem se fala. Roteiro de ficção geralmente termina antes da filmagem, o de documentários é impossível, ele nunca vai terminar antes da filmagem, quando você tá ali em campo filmando aquele documentário, você vai ouvir uma frase maravilhosa que vai resumir toda a sua proposta, com muita clareza você vai descobrir um negócio novo que você não sabia e tudo isso vai fazer o roteiro do seu documentário mudar.
Na hora da Montagem então nem se fala. Talvez seja a hora em que mais acontece, na verdade, o roteiro do documentário. Porque ali você ainda tem muita flexibilidade para pegar uma coisa que você achou que ia entrar no final e jogar para frente, pegar uma entrevista que foi tão maneira que você vai mudar ela de lugar, para aquilo fazer mais sentido, para aquilo construir o seu arco dramático de uma forma mais legal.
Então, o roteiro de documentário realmente é algo muito flexível, porque ele nunca para de ser escrito e na verdade é importante que ele nunca pare de ser escrito por conta daquilo que a gente falou lá atrás, de que você precisa estar aberto para o inesperado. Mas, mesmo assim, eu vou te dar algumas dicas num primeiro momento, escreva sem se preocupar se existe um registro para aquilo ou não. Você está contando por exemplo a história de uma região que você sabe que aquilo ele já foi um quilombo.
Escreve isso, deixa registrado no roteiro mesmo, que você não saiba se existe uma foto daquilo ou mesmo que você não saiba se existe alguém vivo para contar aquela história, deixa ele registrado e descobre depois como é que você vai mostrar aquilo. Mas, é importante registrar. Ou se você tá contando por exemplo a história da sua família e você quer contar como seus avós se conheceram, você não sabe muito bem ainda como você vai contar aquilo, mas deixa ele registrado também pode ser que talvez, uma outra história substitua aquela no futuro quando você for filmar.
Outra coisa que vale a pena falar é sobre narração, tudo que a gente falou sobre o roteiro não ser literatura, quando chega na narração, principalmente na narração de documentários, esquece, a narração do documentário ela é muito parecida com a literatura, ela é mais lúdica, ela é mais poética e tudo bem também você usar de figuras de linguagem e coisas desse tipo para envolver o seu espectador naquela história. Por fim, tenta equilibrar falas e momentos que são mais explicativos e mais argumentativos com falas e momentos que são mais íntimos e mais emocionantes. Esse jogo entre o que é o objetivo e o que é subjetivo vai fazer o seu espectador ficar mais envolvido, vai fazer o seu filme ser informativo sem esquecer que ele é uma história e que ele precisa ser emocionante e envolvente também, sabe?
Falar de Doc é bem mais difícil do que falar de ficção porque não existe uma estrutura tão rígida para contação de uma história documental. Então, a gente fala muito sobre os estudos que existem, sobre as nossas próprias experiências, mas se tiver ficado alguma dúvida, não deixa de comentar que a gente dá um jeito de responder nos próximos vídeos ou no vídeo Extra. Recado para os alunos da oficina, hoje à noite tem aula prática e hoje é sábado, tá?
não tem desculpa, não dá nem para sair para fazer farra porque estamos em quarentena, então não tem desculpa para você perder aula de hoje. O Vítor, amanhã, vai falar sobre formatação de roteiro. Pode parecer um assunto meio chatinho né, mas é importante para a equipe inteira ficar por dentro do que está rolando ali, caso você não saiba esse vídeo aqui faz parte da 1ª turma da oficina Kinobox de cinema.
As aulas teóricas estão disponibilizadas gratuitamente para todo mundo no YouTube, mas as aulas práticas são restritas a um grupo de 60 alunos, vários curtas-metragens vão ser produzidos na oficina e você vai poder assistir a todos eles aqui nesse canal. Se você se interessou e quer saber quando a próxima turma estiver aberta, Deixe o seu contato no formulário que tá aqui na descrição desse vídeo, a oficina Kinobox de cinema é realizada com fomento do Governo Federal, do Estado do Rio e da Secretaria de Estado de cultura e economia criativa, através da Lei Aldir Blanc. Até a próxima aula!