Nós sabemos que cada pessoa autista tem o seu próprio jeito de ser. É muito difícil enxergar todas as cores do espectro e, se você conhece um autista, você conhece apenas um autista. Mas será que existe algo em comum entre todas as pessoas neurodivergentes, entre as pessoas autistas?
Pois é, isso é o que propõe a teoria do monotropismo. E então, antes de tudo, o que significa essa palavra "monotropo"? Bom, "mono" vem da palavra "único" ou "um", e "tropismo" vem de "aproximação" ou "afinidade", ou seja, de forma muito simplificada, aqui quem tem essas características monotrópicas: a tendência de manter a tensão em uma coisa só, em uma coisa de cada vez, vai preferir menos variações na sua rotina.
E por aí vai. Então, esse pensamento parece fazer sentido mesmo, e é por isso que, desde os anos 2000, alguns pesquisadores europeus vêm investigando essa tendência que a maior parte das pessoas autistas têm, mesmo de focar em uma coisa só, e a dificuldade que, às vezes, elas têm de fazer transições, de alternar tarefas. Elas preferem, às vezes, ficar focadas em uma coisa só, né?
O hiperfoco. Isso justifica bastante nessa tendência ao hiperfoco. E, em 2005, a Dr.
Dinina Murray descreveu o monotropismo, essa teoria, e agora, em 2023, nós tivemos a validação de um questionário, uma escala para avaliar sinais de monotropismo na população, porque realmente os pesquisadores chegaram à conclusão de que esse é um bom parâmetro de rastreio. E eu vou deixar, então, aqui o link para que vocês acessem o artigo completo, esse artigo, né, com a validação da escala MQ. E, obviamente, como a validação está em inglês, né, e aconteceu agora em 2023, nos últimos meses, nós não temos ainda a validação para o português.
Mas, como eu sei que vocês gostam de fazer um teste, que vocês gostam de refletir sobre as próprias características, então vou compartilhar aqui com vocês, hoje, os oito critérios, né, os oito fatores avaliados por esse novo questionário. E, para aplicar a escala oficialmente, nós sempre perguntamos sobre o quanto a pessoa concorda com cada item, porque, para fazer um diagnóstico de transtorno, é preciso verificar, é preciso constatar a intensidade e a frequência também dos sintomas, suficientes para causar prejuízos clinicamente significativos. Tem que ser um transtorno real, né, na vida da pessoa.
Mas como essa conversa nossa aqui é informal, hoje o objetivo vai ser refletir se você tem mais características monotrópicas ou características mais politrópicas, se você prefere ou precisa mesmo ter mais foco para navegar pela vida ou se você precisa de mais diversidade e até tem uma habilidade maior mesmo para gerenciar múltiplos estímulos ao mesmo tempo. Então, vamos lá! Eu sugiro que você pegue papel e caneta e vá refletindo, vá anotando o quanto você concorda com cada uma dessas frases que eu vou citar aqui, tá bom?
Então, o primeiro fator fala sobre interesses especiais. E aqui nós temos oito itens que falam sobre essa característica de ter interesses especiais, que está até listado como critério no DSM-5 TR. E aqui, então, o primeiro item é o seguinte: quando eu me interesso por um tópico, eu gosto de aprender tudo que eu posso sobre esse tópico.
Então, realmente, né, está claro, fala sobre interesses especiais, sobre hiperfoco. O segundo é: quando eu me interesso por algo, eu tendo a ficar apaixonado ou apaixonada por isso. O terceiro item é o seguinte: geralmente, eu fico apaixonada ou apaixonado apenas por alguns tópicos em cada fase da minha vida.
Quer dizer, até muda, mas em cada fase a pessoa vai ficar hiperfocada por uma coisa. Quarto: eu ainda sou fascinada ou fascinado por muitas coisas que me interessavam quando eu ainda era jovem. Quinto: muitas vezes, eu me envolvo em discussões longas sobre tópicos que eu acho interessantes, mesmo que os meus interlocutores não achem esse tópico também interessante.
Sexto: as pessoas me dizem que eu fico muito fixada em algumas coisas. Sétimo: acho angustiante e difícil abandonar um problema se eu não resolvê-lo. Oito: eu tento fazer as atividades porque as considero interessantes e não porque elas são expectativas da sociedade.
Aqui está dizendo que você não se preocupa muito com o que os outros estão dizendo, com os olhares alheios; você se respeita mais. E o segundo fator fala sobre a ruminação e a ansiedade, que também são características das pessoas que têm um foco aumentado em uma coisa só. O primeiro item fala o seguinte: às vezes eu me torno altamente ansioso ou ansiosa ao focar nas múltiplas situações possíveis que podem ocorrer em um evento futuro.
Às vezes, a pessoa perde o sono pensando na festa, no evento que ela vai ter e tal, e fica ensaiando como ela vai lidar, como ela vai se portar naquela situação, e isso fala sobre a ruminação e a ansiedade. Dois: muitas vezes fico paralisada ou paralisado pensando em todas as alternativas que podem surgir a partir de uma única decisão. Três: muitas vezes experimento ansiedade por questões sobre as quais eu tenho pouca certeza ou que tenho pouco controle; quer dizer, a pessoa tem mais necessidade de controle.
Quatro: às vezes me concentro em um incidente por muito tempo, por um tempo substancial, às vezes dias após o evento. Nós chamamos isso de "autópsia diária". Às vezes a pessoa traz aquele dia que já passou, quer dizer, o dia já morreu, e as interações também que a pessoa teve já passaram, mas ela resgata tudo aquilo e fica ruminando, repassando para ver quais foram os erros dela.
Então, isso trata, claro, de ruminação também. Cinco: frequentemente eu retorno aos meus pensamentos anteriores. Seis: eu me vejo presa ou preso em pensamentos cíclicos.
E aqui nós fechamos o segundo fator que fala sobre ruminação e ansiedade. O terceiro fator avalia a necessidade de rotinas, e nós temos dois itens apenas. O primeiro item é o.
. . Seguindo, as rotinas me oferecem uma fonte importante de estabilidade e segurança, e o segundo item é que eu gerencio a incerteza criando rotinas.
O quarto fator avalia o impacto ambiental no processo de atenção dessa pessoa. Aqui, nós temos oito itens. Mais uma vez, o primeiro item é o seguinte: eu acho perturbador quando a minha atenção é interrompida de repente.
Dois: preciso de um ambiente tranquilo e previsível para mudar facilmente de uma tarefa para outra. Três: muitas vezes eu tenho dificuldade para me concentrar em ambientes que são muito movimentados ou que têm estímulos imprevisíveis. Quatro: eu fico muito chateada ou chateado se alguém me interrompe quando eu estou no meio de uma atividade.
Cinco: é muito angustiante se alguém me tira inesperadamente de perto de algo que seja significativo para mim, com essa atividade que eu estou envolvida ou envolvido. Seis: tenho problemas para filtrar os sons quando eu não estou fazendo algo em que eu esteja super focada ou super focado. Sete: após um período de instabilidade, eu preciso de um ambiente tranquilo e previsível para me recuperar.
Oito: muitas vezes acho difícil mudar de tópicos depois de estar por muito tempo envolvida ou envolvido em uma atividade. E isso acontece mesmo, né? Às vezes, a pessoa está tão hiperfocada em uma tarefa que, mesmo que ela tenha concluído, ela tem dificuldade para passar para uma outra atividade, para aceitar um convite ou mesmo para tomar água ou se alimentar.
Ela precisa de um tempo de recuperação ou um tempo de transição, e se isso estiver previsto na sua rotina, está tudo bem. O problema é que, se a pessoa não se conhece, ela acaba se forçando a passar de uma atividade a outra sem esse período de respeito, de restauração da cognição, sem restaurar o próprio corpo, os pensamentos, né? A energia.
E aí, claro, ela vai ficar sobrecarregada. Agora nós chegamos ao quinto fator, que avalia se a pessoa perde a noção dos outros estímulos quando ela está muito concentrada, quando ela está hiperfocada nos seus interesses especiais. Aqui, nós temos quatro itens.
O primeiro é o seguinte: muitas vezes, quando eu estou focada ou focado em uma atividade que eu gosto, eu não percebo que estou com sede ou que estou com fome. Quer dizer, a pessoa perde a interocepção, perde a percepção das necessidades fisiológicas ou perde a noção do tempo. Às vezes também, aqui, fala mais sobre esse autocuidado.
Item dois: muitas vezes, quando eu estou focada ou focado em atividades, não percebo que eu preciso ir ao banheiro. É outra questão, né? Da falta de interocepção.
Três: muitas vezes eu perco a noção do tempo quando me envolvo em atividades que me apaixonam. Quatro: muitas vezes eu estou totalmente focada ou focado em atividades pelas quais eu sou apaixonada ou apaixonado a ponto de estar alheio a outros eventos ou a outras vozes, ou chamados das pessoas. Isso os professores falam, né?
Que acontece às vezes na escola com algumas crianças, ou os pais também se queixam. Imaginam que seja um descaso, mas às vezes é apenas o hiperfoco mesmo. O sexto fator fala sobre a dificuldade para tomar decisões.
E o primeiro item é: quando há muitas informações a considerar, muitas vezes eu tenho dificuldade para tomar uma decisão. Dois: às vezes, para tomar uma decisão, é tão difícil que eu fico fisicamente exausta ou fico fisicamente paralisada ou paralisado. Três: às vezes, quando eu estou focada ou focado em uma atividade, eu não me lembro de todas as informações de que preciso para tomar boas decisões.
Isso acontece às vezes quando o ambiente é muito estimulante ou quando tem uma conversa com muitas pessoas em um ambiente barulhento. A pessoa, às vezes, não registra as informações, não escuta direito o que o outro fala e, por isso, não sabe dar as melhores respostas ou não sabe mesmo tomar as melhores atitudes ou decisões. Quatro: acho difícil me envolver em uma atividade que não me interessa, mesmo que ela seja importante.
E aí, esse é um ponto que pode trazer realmente prejuízos graves, tanto acadêmicos quanto pessoais e profissionais. A família estranha e, às vezes, a própria pessoa não sabe por quê, né? Se ela tem inteligência preservada, se ela pode tirar boas notas, porque ela está procrastinando tanto, porque está deixando de fazer coisas que são realmente importantes, tanto para ela, como se alimentar bem, tomar água, fazer exercícios ou ler um livro que ela precisa.
E mesmo assim, ela não faz. Isso assusta a própria pessoa e assusta quem está à sua volta. E aí, uma possibilidade, nesse caso, já falando aqui sobre intervenção e sobre suporte, é tornar essas atividades que parecem desinteressantes um pouco mais interessantes.
Com criança, é muito simples, porque a gente traz o hiperfoco, como a Temple Grandin fez, né? Que ela é apaixonada por animais desde a infância. E aí os professores trouxeram os cavalos para as aulas e conversavam sobre o ambiente da fazenda para ensinar matemática, para ensinar inglês, para ensinar história.
Então, esse hiperfoco pode contribuir para a aprendizagem, mas aí nós precisamos ficar muito atentos. E a validação sempre é um ponto que favorece a conexão entre o mediador e aquela pessoa que está aprendendo. Então, já fica a dica: o fator S é o efeito que os interesses especiais têm de reduzir a ansiedade.
E aqui, nós temos três itens. O primeiro é: o envolvimento em uma atividade de interesse frequentemente reduz o meu nível de ansiedade. Dois: muitas vezes, me envolvo em atividades pelas quais eu sou apaixonada ou apaixonado para escapar da ansiedade.
E três: acho as interações sociais mais confortáveis se eu estiver comunicando, se eu estiver falando sobre um tópico do meu interesse. Então, aqui, nós vemos por que as pessoas aderem tanto aos interesses especiais, né? Porque, em geral, eles são autorregulatórios, eles trazem um bem-estar e reduzem a ansiedade.
Que, às vezes, quando isso, né, se torna uma compulsão, aí também vai exigir, ah, uma flexibilidade maior e, claro, uma intervenção, suporte, né, um recurso diferente para que a pessoa também não fique apenas naquele tópico, não chegue a fazer info dumping, que é sobrecarregar o outro com excesso de informações, e, às vezes, é que a pessoa nem quer ouvir. E, finalmente, o fator oito avalia o gerenciamento das interações sociais. Aqui, nós temos seis itens: o primeiro é que, às vezes, eu posso ficar muito angustiada ou angustiado por um tópico que os outros consideram trivial.
Tem uma aluna que fala que gosta tanto, às vezes, de um filme e aí vai apresentar esse filme ao namorado ou à família, e a pessoa não tem interesse. Então, ela fica muito angustiada; às vezes, até deixa de apresentar outras coisas, outros gostos, outras preferências, porque não teve tanta receptividade naquele item ou naquele filme, né, que ela foi apresentar. Item dois: raramente acho confortável manter o contato visual enquanto estou conversando com uma pessoa.
Três: geralmente, eu digo o que eu quero dizer e nada mais do que isso. Quatro: acho difícil acompanhar discussões em um grupo onde todos estão falando ao mesmo tempo. Cinco: frequentemente, acho situações sociais muito caóticas.
E seis: às vezes evito falar porque não posso prever com confiabilidade como os outros vão reagir, especialmente quando são pessoas estranhas. Então, novamente, eu tenho que dizer que esse não é o questionário completo, não é o questionário oficial. Aqui, eu separei os itens por fatores; no instrumento oficial, nós temos 47 frases, e aqui eu li apenas 41 com vocês, porque o objetivo era apenas conversar sobre como o monofocal, a monotarefa pode se apresentar na vida de uma pessoa autista.
Essas características monotrem os autores, e os seis itens que eu excluí, né, seis frases que eu excluí, eles estão no teste como distratores, ou seja, essas frases não falam especificamente sobre o monotropia do teste. Né, eu tirei aqui da nossa conversa porque não eram específicas sobre essa característica. E agora, me conte aqui nos comentários, por favor, em quais desses fatores você mais pontuou, com quais você mais se identifica e o que você acha sobre essa teoria.
Você acha que realmente pode ajudar no processo de avaliação das pessoas neurodivergentes? Pode contribuir para o rastreio das pessoas autistas? E aproveite, então, para curtir, para compartilhar também esse vídeo com os amigos, porque é assim que nós vamos elevando a consciência das pessoas sobre as diferentes apresentações do autismo.
Um grande abraço e até a próxima quinta. Tchau, tchau!