Eu acho que o problema do direito à literatura tem um ponto de partida é o meu ponto de vista. É que a literatura é uma necessidade universal experimentada em todas as sociedades desde as que nós chamamos primitivas até as mais avançadas o homem tem necessidade. .
. Efabular A efabulação porque é complemento da vida e essa efabulação, como dizia Goethe, o homem entra na literatura, quando sai dela sai mais rico e compreendendo melhor o mundo. Entende melhor.
Frequentemente a pessoa não tem noção disso porque se passa nas camadas do inconsciente. Mas ele lendo, lendo poesia, vendo história de fada, quando é menino vendo romance, quando é grande aquilo vai se armazenando nele e vai enriquecendo a maneira dele ver. Sem querer, quando ele vê a realidade ele está vendo as coisas que ele viu na ficção de maneira que.
. . A criação ficcional nos integra ela passa a ser um componente da nossa visão do mundo, da nossa maneira de ser.
Se ela existe em todas as sociedades se ela é uma necessidade fundamental ela é um direito de todo homem. Agora o problema do ponto de vista social é que, com a sociedade iníqua que nós temos, tudo é muito mal distribuído. Tudo é muito mal distribuído.
Então, forma-se, é claro, os diferentes tipos de literatura. Certos tipos de literatura não são acessíveis a um homem muito rústico, mas ele tem a literatura dele, que nós chamamos com o nome de folclore. Tem muita literatura dele.
Uma sociedade que a gente imagina, uma sociedade bem organizada com todos os produtos da literatura em todos os níveis seriam acessíveis a todos os grupos e classes sociais. Certamente. .
. Eu, pessoalmente estou convencido de que a literatura melhora muito o ser humano seja a história de tartaruga, seja a história de coelho seja a história da corrida da tartaruga com o coelho seja isso, até "Os Irmãos Karamazov", de Dostoiévski. Tudo isso enriquece muito enriquece porque ensina a ver a vida de alguma maneira.
O fato é que eu não conheço ninguém que tenha passado pela literatura desde o folclore até Camões e Dostoiévski que não resulte em enriquecimento próprio. Então eu acho uma das coisas mais importantes da sociedade uma sociedade que nós imaginamos uma sociedade ideal seria assegurar não só os mesmos materiais de vida, mas assegurar a possibilidade de ter acesso a todos os níveis de literatura. E é uma brutalidade social fazer que uma pessoa cresça e viva sem ter a capacidade de ler Machado de Assis ou ler Dostoiévski.
É uma privação, é uma mutilação a que a sociedade de modo que pra mim, o direito à literatura desagua na justiça social. O direito à literatura desagua na literatura acessível a todos. Eu termino citando uma coisa muito interessante que a professora Maria Victoria Benevides me contou e que eu cito no meu ensaio.
A prefeitura de Milão, há muitos anos atrás. . .
A prefeitura de Milão conseguiu que os industriais dessem uma hora livre, duas horas aí por semana aos operários pra eles fazerem o que eles quisessem certo de que eles queriam passear. Eles pediram para se aperfeiçoar no estudo da língua pra eles lerem certos livros. Uma coisa muito bonita eu li quando era muito moço eu tinha 15 ou 16 anos eu li numa revista francesa chamada "Europe", que existe até hoje que o escritor chamado Jean Guéhenno no caso eu conheci ele pessoalmente aqui em São Paulo estava muito em moda, no começo dos anos 30, a literatura proletária a literatura para o operário.
Porque eles diziam "não há literatura para o operário. " Tem qualquer literatura, por que uma feita para o operário? Por que discriminal?
Então ele fez uma experiência. Ele pegou e deu. .
. pessoas rústicas que moravam no bairro dele pra ler a literatura proletária que estava se fazendo na Rússia naquele tempo. De romance.
Eles devolveram: "Ah, tá muito chato". Aí ele deu Balzac, Zola, Stendhal e eles adoraram. Por que?
Ele foi vítima de um pecado de orgulho. Ele achou que para o pobre precisava a literatura feita para o pobre enquanto que o pobre queria boa literatura. Com isso eu termino.