Djamila Ribeiro explica o lugar de fala, racismo e representatividade | Lugar de Escuta #01

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Adriana Carranca
Filósofa, feminista, escritora e acadêmica brasileira. Estamos falando de Djamila Ribeiro, que tam...
Video Transcript:
nós não poderíamos começar esse podcast de forma melhor a primeiríssima entrevista desse primeiro episódio é com ela que é escritora filósofa ativista ex-secretária de direitos humanos e Cidadania de São Paulo na gestão Fernando Haddad que hoje é o Ministro da Economia autora do livro Quem Tem Medo de feminismo negro e do absolutamente necessário pequeno manual ante racista o livro mais vendido do Brasil em 2020 o mais recente que é um livro lindo cartas para minha avó me Fez Voltar ao aconchego da minha própria avó e também a Santos né onde a djamila Ribeiro nasceu e
eu também somos conterrâneas Isso é motivo de enorme orgulho para mim e para todo mundo e de Santos e do Brasil né ela que foi Eleita paraa academia Paulista de Let e inspirou esse podcast com toda a sua obra mas principalmente o seu primeiro livro O que é lugar de fala de Jamila Ribeiro seja muito bem-vinda muito obrigada por estar aqui É uma honra é uma alegria poder te [Música] escutar esse é o nosso podcast lugar de escuta mas o seu lugar de fala obviamente Então queria passar a palavra para você obrigada é um prazer
estar aqui Sobretudo com um podcast que tem esse nome que eu acho que é muito importante que esse lugar de escuta na nossa sociedade seja cada vez mais eh as pessoas consigam né se colocar cada vez mais nesse lugar então tô bastante feliz de estar aqui como eu disse na apresentação lugar de escuta foi inspirado no seu primeiro livro ele apresenta esse conceito que para mim era novo e acredito que para muitas pessoas muitos brasileiros né que é esse lugar de fala e todas as suas implic ações Então eu queria que você começasse essa nossa
conversa explicando para quem ainda não está familiarizado né com esse termo O que é Afinal esse lugar de fala bom lugar de fala foi meu primeiro livro como você falou bem foi publicado em 2017 ele é o primeiro título da coleção femininos plurais que é uma coleção que eu coordeno publicando autores negros e negras porque acho que fazia sentido começar com o lugar de fala numa coleção que a gente tá Ia publicar uma série de autores e agora a gente já chegou no 14º título publicando homens e mulheres negros e negras porque era justamente falar
desse lugar social né que a gente parte de um lugar social como pessoas negras marcado por Profundas desigualdades e que faz com que a gente não tenha oportunidades de acesso a determinados espaços e o que faz também com que as nossas Produções não sejam consideradas justamente porque a gente parte desse lugar né na colonização n escravidão não foi s foi Claro a exploração da mão de obra dessas pessoas mas também foi a desumanização a gente parte desse lugar que não é o lugar do racional da produção de conhecimento o racismo científico foi um elemento infelizmente
que contribuiu para isso de colocar as pessoas negras num lugar de não humanidade de não racionalidade então discutir lugar de fala num primeiro momento é desvelar esses processos históricos que criam essa desigualdades pra gente poder compreender porque que não a nossa presença não é tão massiva nesses espaços de saber mesmo nós seros maioria da população sim e e dessa escuta né O Privilégio da escuta sempre foi de um grupo muito reduzido né de Elite que era eh eh quem tinha a palavra falava por todos nós exatamente que tinha era autorizado né a falar então o
homem branco europeu como esse paradigma moral Intel político e tudo que é fora daquilo é o outro né Simone de buvo no segundo sexo mulher é o outro é o outro e aí você tem intelectuais como Franc fanon Ah o negro é o outro então a gente sempre como outro desse homem branco né então é importante a gente falar sobre isso porque se nós estamos elaborando o mundo escrevendo pensando por que as nossas Produções não estão presentes né Eu estudei Filosofia na Unifesp e O que significou estudar somente o pensamento de homens brancos europeus Ah
então quando eu quis estudar Simone de bvo no mestrado a resposta de um professor meu foi Buá quem é Buá mulher do sre ou seja colocou ela como outro Ah já vivi isso dando razão para buar né mulher como outro então acho que o lugar de fala é isso as pessoas entenderem que não é o que se fala mas de onde se fala porque também com a popularização do conceito que é bom mas traz muitos esvaziamentos então nas redes sociais Às vezes a gente vê as pessoas falando coisas equivocadas a cala boca nesse lugar fala
você não tem lugar de fala quando na verdade todo mundo tem lugar de Fala claro os grupos que partem de um lugar do privilégio né falam desse lugar e os grupos que partem de um lugar desigual falam desse lugar não é o que se fala sim é de onde é eu até ia pedir para você esclarecer uma uma coisa que me chama atenção quando eu comento sobre o seu Liv livro que muita gente me pergunta é justamente esse entendimento equivocado né que você ocupar um lugar de fala que o seu lugar de fala tira o
lugar de fala de alguém e isso tá completamente errado né na verdade é o contrário eh no que eu entendo né do do do seu da sua obra é você entender de que lugar de fala aquela pessoa tá falando né e e e qual é o valor da também dessa fala porque por muitos séculos foi atribuído um maior valor Justamente esse homem branco étero né que tinha aí o privilégio e a e e era autorizado como você falou a a falar por todos nós exatamente que domina que dominou né Esse regime né de autorização discursiva
Então não é o que se fala é de onde todo mundo tem lugar de fala agora um exemplo então quando a gente vai falar de racismo muitas vezes as pessoas acreditam que só as pessoas negras podem falar sobre isso e esquecem que nós vivemos em relações eh raciais Claro se há um grupo que parte do lugar que é discriminado há um grupo que parte do lugar que discrimina claro então é muito importante que as pessoas brancas discutam racismo podem e devem discutir só que vão discutir a partir de um outro lugar e é importante discutir
também o que é branquitude a gente acha que discutir raça é só discutir Negritude assim como a gente acha que discutir relações de gênero é só discutir o feminino e não discutir o masculino uhum dessa construção desse masculino na nossa sociedade ligado à violência ligado à força como seria importante que os homens discutissem eh debatesse isso a partir desse lugar O que que significa a ausência de um pai o que que significa exatamente se posicionar chegar pros colegas e dizer olha isso é assédio Isso tá errado então é importante que eh as pessoas entendam que
a gente tá falando de lugares diferentes mas que todos podem e devem porque esse tema di respeito a todos nós a Principalmente ao aos brancos porque foram os que criaram a o conceito também de raça de racismo para oprimir uma parte da população e e e explorar essa população né então a gente fala eh a gente tem muo essa ideia ainda de que o racismo é um problema do negro não é um problema do que o branco inventou e e que precisa resolver Claro eh em em em parceria né né em colaboração de toda a
sociedade né nós todos juntos né Não adianta eh e a própria ocupação desses espaços né porque a Às vezes você tem hoje muitas pessoas falam Ah mas eu não sou racista e não entendendo que não se trata de uma questão individual né que se trata de uma questão coletiva eu não sou racista mas se eu frequento Lugares só brancos né se eu não contesto a branquitude no meu espaço de trabalho ou no meu na escola da minha filha ou eh nos lugares onde que eu frequento eu estou na verdade sendo racista ou colaborando né participando
legitimando ess é mais do que colaborando legitimando esse esse sistema Exatamente porque a pessoa pode até não se entender mas a sociedade é estruturada dessa forma n Então por mais que a pessoa branca diga eu não sou racista ela vive numa sociedade racista exatamente então o correto é dizer Como que eu posso criar ações para enfrentar esse racismo que é estrutural porque por exemplo por mais que um homem branco não seja não se Entenda como racista estruturalmente ele vai ganhar 30% a mais que uma mulher branca exato Então mas se ele é chefe se ele
tem uma empresa que que ele pode fazer para mudar isso dentro do da empresa dele se ele é um gestor público como que ele pode propor políticas públicas para enfrentar essas desigualdades É nesse sentido porque senão a pesso só simplesmente se exime da responsabilidade de transformar a sociedade que ela vive então é muito importante que as pessoas brancas entendam esse lugar sobretudo nos lugares onde a gente não acessa porque pelo fato de virmos de lugares muito desiguais a gente não vai acessar determinados espaços então é fundamental que o lugar de escuta sim também seja colocado
se porque claro que o que as pessoas negras vão trazer como grada quilomba fala são verdades desagradáveis Claro pessoas brancas T que eh aprender a escutar essas verdades desagradáveis e a ficar nesse lugar do incômodo porque se a gente acha que tá tudo bem se a gente tá num lugar confortável a gente não vai propor mudança se a gente acha que tá tudo bem ou que não é o meu papel papel então Sem dúvida nenhuma o lugar do desconforto ele também ele vem a partir desse momento que a pessoa se coloca para escutar Porque de
fato são verdades desagradáveis desconfortáveis mas eu incômodo como uma mola sim propulsora para mudança porque senão a gente não muda quando a gente percebe que a gente foi a pessoa que não sabia disso quando a gente se pega Nossa eu já fui a pessoa que falou isso eu já fui a pessoa que que não percebeu isso mas aí não é o lugar da culpa porque a culpa não leva a lugar nenhum é a lugar da responsabilidade agora que eu sei exatamente o que que eu posso fazer para mudar e a questão da representatividade para as
mulheres negras para as meninas negras isso é muito importante que é que você falou dúvida acostumar o olhar a ver mulheres negras em posições que antes a gente eh não imaginava elas mesmas não se imaginavam né as mulheres eu não me imaginava quando eu era criança porque eu não via né então você se se eu não tivesse tido um pai ativista talvez eu tivesse sofrido muito mais Uhum E eu acho que é importante eu sou uma escritora que viaja muito pelo Brasil que conversa com meninas de Periferia e eu fico muito feliz quando eu chego
numa comunidade as meninas negras sabem quem eu sou sim que sentam para falar comigo e falam Nossa eu quero estudar também eu também quero estar nesse lugar Eu também quero viajar eu acho tão legal é possível é possível e como e como é importante essa imagem de uma mulher negra que simplesmente está vivendo sua vida porque as pessoas sempre esperam de nós que a gente continue carregando o mundo nas costas que a gente dê conta de tudo às vezes eu tô de férias as pessoas me escrevem assim ah aconteceu tal coisa você não vai falar
sobre isso eu falo não Eu já escrevi meus livros já tenho Instituto eu já faço tanta coisa mas parece que você nunca pode estar num lugar de simplesmente está vivendo a sua vida mesmo a gente já fazendo um monte de coisa então volta e me as pessoas me escrevem Você não vai falar não gente eu já faço isso já porque também eu não quero ser uma pessoa que só reage uhum porque a gente fica muito num lugar só da reação e eu me incomoda a esse lugar eu acho que a gente não pode só reagir
a gente tem que construir e propor por isso que eu coordeno um Celo editorial publico autores negros eu tenho Instituto tem biblioteca tem atendimento jurídico psicológico para pessoas negras porque se a gente fica num lugar de quem eh reage a gente não transforma e como é que eu consigo ter um instituto como é que eu consigo ter uma coleção como é que eu consigo publicar pessoas negras se eu não se eu não tiver condições de bancar esses projetos CONSEG escrever também escrever e como que eu vou bancar esses projetos eu falo gente como vou chegar
lá no dono da gráfica vou falar Ah então publica não preciso pagá-lo então eu acho que a gente tem que falar da questão do dinheiro sem tanto Tabu porque eu não sou a dona do meio de produção Eu também dou uma pessoa tentando acessar recursos para manter os meus projetos isso não me torna eh uma capitalista eu vivo no capitalismo logo eu preciso encontrar meios de viver nele sim mas quando são pessoas negras a falar disso sempre vai para um lugar muito desonesto eu acho da crítica e hoje a gente tem mesmo toda essa luta
para que a Disney tivesse princesas negras né ou representativas de outras populações eu me lembrei agora também de um rapaz que eu entrevistei no harlen eh sobre a mudança né para ele era um entregador meu entregador de jornais a mudança para ele entre o governo Obama e o governo trump e ele foi muito sincero ele falou olha assim na minha vida não tem na prática em termos de acesso não mudou não muda tanto mas no na sensação né no sentimento de que é possível aí ele falou nossa o harlin era um outro bairro né o
harlin o Bronx quando o presidente Obama foi eleito era um outro lugar Um lugar de possibilidades e de pertencimento e acho que você traz isso eh Sim e eu acho que é importante também lincar agora com a questão da GM né porque eu não dirijo e e eu acho que nós mulheres a gente já dirige nossa vidas de muitas maneiras né às vezes dirige a casa família concilia várias coisas a gente já dirige só que tem tantos estereótipos em relação à mulher na direção sempre quando a gente imagina um diretor a gente imagina um homem
diretor de cinema um diretor de redação Então as mulheres nunca ficam nesse lugar de dirigir apesar de dirigirem né Muitas das coisas na sociedade e eu não consegui tirar carta antes primeiro que quando fiz 18 anos eu tinha que trabalhar para ajudar em casa era muito caro e depois com tempo aí mãe faculdade mestrado sempre fui adiando e essa campanha da GM eu sou co-criadora dessa campanha né eu escrevi ela porque é a minha história de uma mulher que já dirige a vida mas não dirige um carro e essa realidade de muitas mulheres no Brasil
né 35% somente da CNH são de mulheres tem milhões de mulheres que não dirigem ou que até tiram a CNH mas tem medo de dirigir 33% você falou 35 35% e é muito legal porque quando eu fui eh fui dar uma palestra lá e eu falei da campanha eles adoraram Porque é a minha história é a minha verdade eh quem eu sou E aí eu tô agora no processo de tirar a carta e essa campanha veio junto também com financiamento Uhum Então em duas semanas 12.000 mulheres se inscreveram para tirar a carta tirar a carta
porque a questão Econômica é uma barreira para muitas das mulheres porque é caro Uhum Então e agora a GM tá indo atrás de mais parceiros para que mais mulheres consigam também se inscrever uhum para conseguir tirar sua CNH porque isso é autonomia para muitas mulheres Isso significa que elas para muitas mulheres pode significa uma significar uma mudança de impressão tantas coisas que possibilita sim e que a gente acaba não acessando e quando eu fiz o primeiro vídeo contando a minha história foram centenas de comentários de mulheres ali falando Nossa meu pai quando eh eu tenho
irmãos quando a gente completou a maioridade ele só pagou pros homens mulheres falando Ah meu marido me criticava e dizia que eu não tinha eu tirei a carta mas eu não deixava eu pegar o carro outras é eu não tinha condição de pagar e eram tantas histórias Então acho que Tima manda falou isso para mim né quando a gente estava conversando sobre isso é que dá para fazer coisas legais a partir de ações como essa e eu gosto de me envolver nisso assim quando a gente consegue até porque eu recebo muitas propostas todos os dias
de marcas Eu nego 90% porque eu não sou uma pessoa sempre falo isso né Eu não sou tem pessoas para isso nada contra que vai só oferecer um produto sim para mim quando eu ganhei a bolsa Prada eu acho legal mexer com o Imaginário bagunçar o Imaginário desestabilizar esse Imaginário quando é com agm é legal porque essa ação vem com uma campanha coletiva para outras mulheres eu gosto de me envolver em coisas que TM um significado dentro da própria GM também né Tem esse esforço também de trazer de levar você para para falar née lugar
de F Quintas maravilhosa que me convidou as duas vezes a rede de diversidade para também mudar a ali o ambiente corporativo e eu acho que a iniciativa privada ela tem também essa obrigação de transformar a gente claro que o estado né Eu precisa de políticas públicas sou muito a favor disso do Estado forte mas as empresas também TM o seu papel e a sua responsabilidade nisso e que legal que a gente consegue a partir de ações como essa falar de estereótipos de gênero fortalecer economicamente essas mulheres para que elas consigam tirar CNH falar sobre o
medo por que que elas têm medo de dirigir de onde que esse medo vem a pressão falar de liberdade falar de autonomia a partir de uma campanha publicitária Então isso é muito legal porque a essas marcas T um poder de mobilização muito grande então para mim eu tô bem feliz porque eu também tô nesse processo agora de estudar te fazer a prova teórica vai vai conseguir tirar a carta de conseguiu como dizem as minhas amigas você já dirige agora só falta você concluir esse processo né e para mim vai ser uma vitória pessoal mesmo porque
eu venho de uma família que as mulheres da minha família não dirigiam né então para mim vai ser legal quebrar com esse ciclo minha filha que fez 18 anos já vai partir de um outro lugar de oportunidade É verdade e as mulheres realmente como você falou né a gente tem tantas líderes de que lideram a casa e a família né já dirigem o o destino dos filhos e do da família toda e a liderança feminina faz a diferença né que é uma coisa que eu tava percebendo as mulheres quando são comprometidas a liderança delas transforma
Jamil eu achei super impactante a forma como a Bárbara Karim ela é fundadora da primeira escola afrocentrada do Brasil que fica em Salvador e numa eh numa num dos cursos que ela dá sobre letramento racial uma pessoa que é uma negra de pele clara perguntou a ela como é que eu me me identifico Negra Em que momento eu passo a ser uma mulher negra uhum eh e a eh Bárbara respondeu não é pela cor é pela dor Uhum é quando você percebe né quando você vivencia nos Espaços que você frequenta o preconceito contra por conta
da cor da pele Então eu queria que você falasse um pouco sobre isso sobre colorismo né e dentro do movimento negro o colorismo para mim é um tema muito importante da gente conversar porque no Brasil a gente tá falando de preconceito de raça barra cor e é importante entender que como pessoas negras a gente pode ser ter a mesma raça mas ser de cor diferente então você tem negros que são de pele escura que são os pretos e você tem os negros de pele clara que seriam os pardos segundo IBGE Uhum Então pro IBGE o
negro são a soma de pardos e pretos então todo mundo é negro Só que alguns a Negritude também ela é diversa ela também é plural e é muito importante a gente discutir isso colorismo foi um termo cunhado por Alice Walker a escritora eh justamente para chamar a atenção da própria a comunidade eh negra para não utilizar eh esse mecanismo de opressão que foi criado pelas pessoas brancas para nos diferenciar então quanto mais claro mais tolerado se é socialmente as escolhas que se fazem na publicidade as escolhas que se fazem enfim sempre eh priorizando as pessoas
de pele mais clara só que a pessoa de pele mais clara Negra ela não é privilegiada porque privilégio é só quem é branco mas ela vai ter algumas vantagens sociais que as pessoas de pele retinta não vão ter viola Davis fala muito disso Lupita nongo Então eu acho que é importante a gente conversar sobre isso mas é claro isso não significa de forma alguma negar a Negritude de ninguém mas é só a gente entender que nós partimos de lugares diferentes e que as pessoas negras de pele clara são negras não tem que ter uma questão
em relação a isso de onde eu pertenço não você é uma pessoa Negra só que você tem uma vivência diferente das pessoas negras que tem a pele mais escura Então acho que isso uma coisa que não precisava gerar divisão nem confusão basta a gente reconhecer essas diferenças e nos unir para enfrentar de fato o racismo como uma estrutura Mas isso não significa que as pessoas não tenham que porque muitas vezes a gente escuta ah mas somos todos negros sim mas a depender da sua tonalidade você vai vivenciar uma experiência diferente então por exemplo eu tenho
amigas negras de pele clara que foram se descobrir negras ao longo da vida Exato eu não desde cedo eu sabia que eu era uma menina negra Até porque não tem como na escola apontavam para mim a do cabelo tal desde muito cedo eu nunca tive essa passabilidade vamos assim dizer e Que bom que essas minhas amigas com esse processo de consciência racial conseguiram se entender como negras isso é maravilhoso mas assim como a minha vivência é outra eu tive que desenvolvendo uma autoestima uhum por ser negra porque desde criança já sabiam que eu era Negra
porque eu sou Como diz kabenguele munanga um grande intelectual os negros indisfarçáveis desde muito cedo já são apontados então a minha vivência foi diferente dessas minhas amigas agora isso significa que elas não passaram por violências não as também passam mas isso significa que a gente tem vivências diferentes e que precisam ser faladas e a gente não pode ter Tabu ou medo de falar sobre elas são lugar de fala diferente também né de vivência porque no Brasil não é como nos Estados Unidos né que tem a questão mais da origem no Brasil é pelo fenótipo ex
então quanto mais claro se é no Brasil mais tolerado se é quanto mais escuro mais dor mais dor se tem então acho que num país como nosso que tem essa questão do fenótipo é importante a gente reconhecer e que a constituição Fala raça barra cor existem negros de cor mais clara e existem negros de cor mais escura eh você em termos de políticas públicas isso Muda alguma coisa não acho que o movimento negro no Brasil eh tem esse acordo né de que as políticas públicas são para negros pardos e pretos isso foi super importante no
Brasil obviamente Mas é claro que intelectuais como Carla ciren que é uma mulher negra retinta vem trazendo essa discussão que eu acho que é importante S de que as políticas públicas também precisam levar em consideração o quesito cor porque na grande maioria das vezes elas vão atingir os negros de pele clara os negros de pele escura acabam ficando mais eh excluídos dessas políticas Entendi então eu acho que importantíssimo que se tenha para negros no geral concordo mas eu também acho importante claro com os resultados que a gente teve das da implementação das últimas décadas é
importante também a gente reconhecer que essas pessoas de cor mais escura acabaram ficando excluídas e como que a gente pode enquanto coletivo pensar maneiras também que essas pessoas também sejam incluídas n nessas políticas eh como você falou Esse é um assunto polêmico e existe um outro assunto polêmico que é sobre eh propaganda né você participou de algumas propagandas de algumas marcas como Prada e eu vi que na internet nas redes sociais as pessoas atacaram muito mas eu gostei muito da sua resposta que foi o luxo para mim é uma conquista Então queria que você falasse
sobre sobre isso né E sobre a nova campanha que você tá fazendo agora pra GM né que vai dar cartas de motorista à mulheres é interessante esse foi um assunto que eu conversei com a chima Amanda né porque ela fez para Dior né ela fez eu vi é verdade e a época foi uma a também a gente conversou muito sobre isso demos muita risada inclusive juntas sobre isso porque não é uma questão né A Prada todo mundo acha que eu assinei contrato com a Prada eu ganhei uma bolsa Prada Uhum E aí foi todo um
Huawei em torno disso de que mas as você tá usando essa marca as mulheres negras no usam eu falei é interessante porque as mulheres brancas historicamente elas eh foram colocadas no lugar de representar todas na publicidade Mas então por que que as mulheres brancas não podem se sentir representadas quando é uma mulher negra que está lá ess um questionamento interessante esse é questionamento porque a gente sempre vi eu cresci vendo mulheres brancas em capas de revista anunciando produtos isso nunca foi uma questão é quando é uma mulher negra ah não mas as mulheres como você
não estão nesse lugar tá mas por que que você não pode se sentir representada por mim por que que não é uma troca eu acho que esse é o primeiro ponto o segundo ponto que eu acho é como se faz isso eu não tava ali dizendo que tal marca tá fazendo tal coisa era uma mulher um indivíduo porque além de ser ativista e tudo sou um indivíduo era um indivíduo que ganhou uma bolsa e estava fazendo um vídeo dessa bolsa e por que que isso tem que gerar tanta questão tanto questionamento é pelo simples fato
de eu ser uma mulher negra porque muitas mulheres brancas fazem mulheres que estão envolvidas com ativismo e isso nunca foi uma questão polêmica para elas eu vejo várias fazendo agora quando é uma mulher negra sempre fica nesse lugar do estranhamento então eu banco esse debate porque primeiro a gente tá falando de um lugar social em que né minha mãe era trabalhadora doméstica e meu pai é um trabalhador braçal a gente não acessa eh dinheiro quando a gente vem desse lugar social e aí quando a gente começa a acessar de alguma maneira Claro ainda sendo classe
trabalhadora né porque a gente é classe trabalhadora gera todo um estranhamento quando você tem uma série de pessoas brancas de esquerda que são ricas de famílias ricas e que estão na política e isso nunca foi um questionamento para elas né eu conheço várias pessoas que são até muito comprometidas Mas vem que vem de famílias quatro acent tonas sim ninguém vai lá falar para ele Ah você não pode estar aqui no movimento de esquerda porque você é herdeiro mas quando é uma mulher negra ai mas ela não pode porque ela é E aí sempre e acho
que interessante a branquitude não se questiona a branquitude não pensa a si mesma porque quando a gente tá falando de eh a economia a gente tá falando quem é que domina homens brancos sim tem cor tem tem sexo né mas quando são as mulheres negras gera todo um debate achim Amanda foi a mesma coisa ela falou ah eu não posso ser uma escritora fazendo e qual é o problema acho músicos também emici começam a ter sempre negros negros como se a gente também não pudesse acessar esses espaços Então as pessoas naturalizam o lugar da pobreza
paraas pessoas negras não reconhecendo que a pobreza foi um lugar imposto para nós Porque nossos ancestrais durante quase quatro séculos construíram a riqueza desse país sem ter acesso a ela a escravidão foi a base da economia do Brasil e é por isso que a maioria da população negra é pobre porque essa população trabalhou quase quatro séculos sem receber por isso então como é que a gente vai discutir classe sem discutir raça então gera um questionamento porque as pessoas naturalismo no lugar da mulher negra sempre no lugar da submissão da subid e nunca num lugar de
humanidade por isso que gera tanto a mas por um outro lado também eu acho importante dizer gera muita coisa boa também porque muita gente fala para mim mulheres negras falam Puxa que legal pude me ver num lugar a partir de uma representação positiva Exatamente porque o que as pessoas querem é sempre a representação da mulher negra de cabeça baixa sofrendo violência eh Enfim no lugar da pessoa que está ali reivindicando políticas públicas não no lugar de quem tá sentada pensando Então acho que isso como dizia bem Tony mors Isso não é um problema meu com
a pessoas as pessoas brancas que T que resolver entre elas isso Isso não é um problema para mim elas que tem que resolver entre elas porque que elas se incomodam quando uma mulher negra não está nessa representação que elas estão acostumadas Então me deixe fora de sempre falo isso o problema que se vocês estão incomodados são vocês que TM que resolver mas essa é questão da pluralidade exatamente né Porque quanto mais pluralidade mais se transforma claro né outro olhar nós conversávamos aqui antes né do início do da nossa conversa dentro aqui do podcast eh e
eu contava aqui pra damila eu tenho uma filha uma filha negra de 3 anos né e eu trabalho há mais de 20 anos com jornalismo eh questões sociais acompanhando movimentos sociais etc e precisou que a minha filha de 3 anos me chamasse atenção para os lugares predominantemente brancos que nós frequentávamos então né a escola ela com três aninhos né então você vê que eh eh uma uma coisa que eu achei até bonita que uma bonita Embora triste que uma uma psicóloga Negra Que com quem a gente eh faz acompanhamento me falou é como corpo da
da da da mulher negra mesmo pequena né Mesmo sendo ainda tendo 3 anos é um corpo político porque ele transforma por onde ele passa né seja pelo ou incômodo ou pela eh motivação para que se mude alguma coisa e isso foi muito assim minha filha me colocava contra a parede Por que que na minha escola só tem pessoas brancas né e eh você também mencionou isso antes da gente começar o podcast a lei de 2003 que obrigou as escolas né a mudar currículo a adotar uma educação antirracista queria que você falasse um pouco sobre essa
lei e sobre o papel das escolas que me parece fundamental né na luta antirracista é incrível né quando a gente fala de lugar de fala Liz deu a resposta né porque do lugar dela ela conseguia ver e perceber examente coisas que talvez as pessoas brancas do lugar dela não estavam percebendo Então isso é uma explicação muito concreta do que é lugar de fala né E as escolas nesse sentido T um papel imprescindível porque geralmente o primeiro lugar onde a criança negra vai sentir o racismo institucional é na escola exatamente então quando a gente tá no
nosso lar muito ali amada protegida vai pra escola e se a escola não é preparada ela acaba legitimando todas essas violências Então os movimentos negros durante muitos anos no Brasil lutaram para transformar a nossa educação Até que em 2003 essa lei 10639 ela foi eh estabelecida no Brasil ela alterou a lei de diretrizes B dauca para incluir a obrigatoriedade do ensino da história afro-brasileira e africana nas escolas durante o primeiro governo Lula Dad era o ministro da educação acatando essa demanda dos movimentos negros então isso significou que as escolas tinham que mudar o seu currículo
eh os livros didáticos adotados o MEC teve que adotar livros que de fato estavam eh trabalhando da forma como a lei estabelecia petronila Beatriz que é uma grande Educadora profess da Federal de São Carlos foi a relatora dessa lei Então teve muita gente envolvida para que isso acontecesse só que Adriana como é uma lei que não prevê sanção muitas escolas não trabalham e no Brasil infelizmente as políticas são mais de governo do que de estado exatamente então mudo o governo a depender da vontade política eles não fazem E aí fica essa luta dos educadores do
chão da sala de aula ali tentando fazer alguma coisa sim e esse é o nosso grande problema no Brasil a gente tem iniciativas interessantes como em São Paulo a época que eu fui secretária de junta de direitos humanos a gente fez todo um trabalho com a própria petronília que foi a relatora da lei é aquele aquelas obras monumentais da Unesco de África desenvolveu material didático baseado nesses livros distribuiu para todas as escolas eu participei de formação de professores Porque também tem que formar os professores o poder público porque foram eh educadores que foram formados numa
escola em que essas questões não eram trabalhadas é todo um trabalho mas aí a gente perde a próxima a gestão seguinte não trabalha isso são políticas públicas são políticas partidárias de governo ex governo e esse é um grande problema mas essa lei é bom que as pessoas saibam Porque um pai uma mãe um responsável um avô pode ir até a escola e cobrar sim que era isso que eu fazia quando a minha filha era pequena essa escola trabalha lei 20139 e às vezes eu escutava da diretora pedagógica quê eu falava Nossa essa essa escola não
sabe então é bom também a gente conhecer o instrumento legal até para que a gente consiga cobrar Exatamente porque eu vejo muito também a escola pública ela é a gente às vezes fala que a escola pública né não tem qualidade tal mas ela é bem mais vigiada vamos dizer assim pelo poder público do que a escola particular a escola particular Ela depende de concessão não é qualquer um que pode abrir uma escola e educar Então deveria haver também um acompanhamento né uma uma vigilância das escolas particulares porque eu passei a fazer essa pesquisa em escolas
aqui em São Paulo e eu realmente não vi uma educação antirracista realmente eh estabelecida exceto em poucas escolas muito recentemente e a gente percebe que é iniciativa dos Pais os pais se unindo para pedir isso porque aí também tem uma outra coisa que eu gostaria que você comentasse sobre isso que eu vejo muito é quando a gente vai conversar com escolas né sobre essa questão da luta antiracista eles eles recebem isso muito Como assim uma ajuda Ah mas eu já Ajudo mas eu já não é uma ajuda né uma escola dominantemente Branca espaços predominantemente brancos
me parece que são espaços fatalmente menos educativos né do que um espaço div a gente aprende na diversidade Nós não somos robôs Nós aprendemos conv vivências e lugares de fala né ao escutar falas que vem de lugares diferentes e do nosso Então hoje eu eu me pergunto essas escolas 100% brancas essas crianças que crescem nesse ambiente elas vão sair dali e vão trabalhar como com três ministros negros hoje que nós temos né com Jamila como uma grande escritora membro da academia Paulista eh de de letras então o né como é que a gente muda isso
as e faz com que as pessoas entendam que a pluralidade é uma riqueza é uma ótima pergunta até porque as escolas particulares como você falou muito bem né Elas receberam concessões para isso e deveriam acompanhar o que o que Foi estabelecido né na enquanto acordos coletivos uhum e espaços predominantemente brancos não ajudam né eles têm que ter o compromisso em transformar a sociedade a gente tem alguns exemplos recentes na pandemia de escolas antirracistas como você falou bem fo na iniciativa dos pais e das Mães uhum de trabalhar isso na escola de cobrar da escola que
tivesse professores negros porque isso é importante para além da mudança do currículo que estabeleceu bolsas de estudos Mas são poucas escolas pouquíssimos e de fato deveriam e como não tem uma fiscalização então infelizmente essas escolas elas acabam eh trabalhando de uma maneira somente contemplar uma visão hegemônica de mundo e isso é ruim para todo mundo porque como que essas crianças você falou muito bem vão sair de lá e depois vão aprender a lidar com o mundo cada vez mais diverso e quando a gente esse movimento não tem volta né não tem volta e quando a
gente fala de diversidade eu gosto muito também do que grada quilomba traz no seu livro Memórias da plantação que ela fala assim eh a pessoa o homem branco olha para mim e diz Ah você é diferente de mim só que ele também é diferente de mim Nós somos mutuamente diferentes é necessário inclusive questionar essa Norma da qual eu defiro porque ele diferente exatamente e reconhecer a diversidade é tão somente reconhecer uma pluralidade que já existe na sociedade Claro Exatamente é as pessoas negras existem mulheres pessoas LGBT já é uma uma pluralidade existente então a diversidade
é tão somente o reconhecimento dessa pluralidade porque às vezes as pessoas pensam Ah agora a gente tem que falar falar de diversidade nãoa sociedade brasileira ela já é diversa super é se a gente vai pro norte do Brasil é um Brasil se a gente vai pro Nordeste é outro Brasil se a gente vai pro sul é outro Brasil são vários brasis dentro desse Brasil então a gente só tá tão somente aumentando ampliando essa lente para reconhecer o que já existe uhum e um hoje a gente vê por exemplo empresas que às vezes fazem uma campanha
que dá problema porque foi preconceituosa por algum motivo na hora a gente fala bom a equipe não era diversa exatamente então um grupo homogêneo tem muito mais dificuldade de dar conta de pensar coisas para uma para uma sociedade cada vez mais plural exatamente E aí às vezes perdem dinheiro porque não implementaram diversidade nas empresas porque sempre são as pessoas dos mesmos lugares que vieram do mesmo lugar social então é muito importante que a gente continue cobrando e que as pessoas entendam que isso não é favor Uhum que isso não é ser Politicamente correto não é
ajuda não é ajuda que é tão somente a gente trabalhar para que amplie a visão de mundo das pessoas e das crianças porque se eu leio somente pessoas uma pessoa branca só ler pessoas como ela tem uma visão de mundo muito restrita da sociedade agora Se ela ler pessoas indígenas se ela ler mulheres que lolas ela vai ter uma visão de mundo muito mais rica e que vai ser bom para todo mundo ela vai ter um olhar que ela vai conseguir reconhecer a humanidade ela vai conseguir trocar reconhecer a autoridade e é melhor pra sociedade
como um todo forma melhor né uma formação muitíssimo melhor a pluralidade a diversidade do Brasil é uma das nossas maiores riquezas né se a gente pensar nos povos indígenas eram 300 etnias culturas diferentes línguas e e mesmo a população negra que foi escravizada no Brasil Jamila você fala no seu livro né Eh que como eles foram Unidos num bolo né pessoas negras né quando na verdade eles vinham de partes diferentes da África de eh reinos né S haviam diferentes comunidades diferentes com também línguas diversas culturas diversas né que também foram objetificadas né nesse bolo de
falara homogeneização que é bem a visão Colonial né os negros como se nós fôssemos todos iguais os índios o que fazem também com as mulheres as mulheres então todo aquilo que não é homem branco hétero os outros é colocado nesse Balaio como se nós f todos iguais não tivéssemos individualidade não fôssemos diferentes e isso faz com que as pessoas e reproduzam racismo A partir dessa lógica Colonial muitas vezes como por exemplo e v uma pessoa negra por exemplo tocando não sei violino ah nossa um negro tocando violino Qual o problema se a música é um
Patrimônio da Humanidade exatamente aí uma menina minha filha quando era criança jogava futsal num time de meninos porque na idade dela não tinha feminino então significava que que a sociedade estava dizendo bom menina não pode jogar futsal e quando ela jogava ela ela era goleira e ela tomava um Gol os meninos diziam ela tomou um gol porque ela é menina quando qualquer pessoa tomaria Gol então quando a minha filha ia pro campeonato chegava eu levava não tinha vestiário para ela eu tinha que improvisar um lugar para trocá-la e quando ela ia jogar ela já ia
com uma pressão ela ia tão nervosa porque pros meninos era tão somente mais um jogo para ela era provar que ela merecia estar naquele lugar é e quando ela tomava um Gol às vezes ela chorava tamanha a pressão e que que as pessoas diziam tá vendo menina no futsal T chorando mas ninguém tava tava percebendo toda a pressão que estava por trás de uma menina ter que jogar num time masculino e como ela tinha que se provar o tempo inteiro coisas que os meninos não precisavam se provar exatamente então é muito important as pessoas também
entenderem esse lugar e essa lógica da homogeneização ela é muito violenta porque ela também não quer reconhecer a diferença entre nós como se todos nós pessoas negras tivéssemos que pensar igual como se a gente não pudesse discordar entre si e a cultura né você simplesmente ignora quanto que a gente perdeu no Brasil de história perdeu né e de cultura dos povos eh que vieram da África dos povos indígenas dos povos originários eh de outras comunidades tradicionais que a gente vai se perdendo nossa é uma pena e você a própria aa Amanda né que você mediou
o quando ela veio ao Brasil o evento da ler né Eh no ano passado a chima Amanda ela fala quando quando ela era pequena como ela reproduzia nas brincadeiras o que ela lia nos livros que eram tinha um personagens só brancos e moravam em lugares que havia Neve e e ela queria reproduzir isso morando na Nigéria né Eh sendo que a Nigéria não tinha não nevava né era completamente as frutas eram diferentes então a descoberta que ela fez da riqueza da próprio país dela quando ela passou a ler os quando ela descobriu que havia autores
negros exatamente e isso é muito importante é realmente e é uma riqueza e isso é importante que as pessoas entendam a diversidade é uma riqueza né uma ambiente predominantemente branco é fatalmente pobre mais pobre do que um ambiente que tenha diversidade social também né sim e que essa diversidade seja respeitada não simplesmente figurativa muitas vezes e que a gente também se coloque nesse lugar de aprendiz de escuta Porque como é rico né quando a gente aprende Eu lembro que quando eu lancei a coleção no começo a gente só lançou autor de São Paulo porque a
gente não tinha dinheiro e a gente chamou os amigos mais próximos mas quando eu fui ao Piauí fui pra Teresina e a gente convidou uma autora de lá eu descobri um outro Brasil descobri Esperança Garcia que foi considerada a primeira advogada né do Brasil Negra aí você fui pro Maranhão aí descobri no Maranhão a riqueza cultural do Maranhão o tambor de mina E aí o reg no Maranhão o reg é super Popular o Maranhão é o único lugar fora da Jamaica que tem o museu do reg aí eu fui pro Acre e aí eu aprendi
então assim e é muito bonito isso da gente se colocar nesse lugar de escuta uhum para aprender para conhecer o quanto que eu desconhecia das realidades eh do norte do país de e por mais que eu seja uma mulher negra a realidade da do povo negro amazônico é diferente da das pessoas negras que estão aqui no sudeste em São Paulo na cidade São Paulo na cidade no interior no campo quando a gente publicou o livro mulheres quilombolas o quanto que eu aprendi com a história daquelas mulheres eu acho que é muito importante a a gente
se colocar nesse lugar de escuta porque isso amplia a nossa visão de mundo e a gente começa a valorizar essa riqueza de fato da gente também aprender a escutar porque quem sempre foi autorizado a falar tem dificuldade de escutar Uhum E aí no primeiro incômodo já quer falar e eu falo não fique em silêncio porque todos nós tivemos que aprender eu sempre dou esse exemplo quando eu fui pro eh para belé pela primeira vez em 2015 participar de um evento eu estava na mesa com a pesquisadora lá de Belém do Pará e eu tava falando
ah não porque o norte o norte o Norte no dado momento ela me interrompeu e falou olha Jamila Com todo o respeito você tá falando o norte você tá falando de Belém de Manaus do Acre de onde você tá falando porque quando você fala de onde você vem você não fala o Sudeste você fala São Paulo você não se marca como sudestina e você está me marcando como nortista mas que Norte é esse que você tá falando na hora eu levei um choque eu falei gente realmente não sei do que eu tô falando eh e
que que eu fui fazer fui aprender fui escutar fui ouvir as mulheres negras do Pará fui fazer eventos lá fui entender e falar nossa realmente eu era uma ignorante nesse assunto não conhecia nada e Que bom que agora eu tô conhecendo Então acho que esse exercício de humildade ele também é muito importante pra gente poder estabelecer um exercício de escuta de qualidade de escuta ativa e e eu queria que você falasse da da Infância em Santos um pouco da sua infância como é que foi né Eh a gente nasceu Adriana também na na nessa mesma
cidade em Santos e a gente tava comentando sobre Santos ter sido uma cidade muito de de que marcou vários momentos do Brasil né em políticas públicas e hoje tá muito eh enfim a própria arquitetura né tá muito caracterizada né do que a gente conheceu na infância Santos eu tenho muitas memórias boas mas voltar a Santos que eu gosto de voltar é sempre um choque né porque a cidade se transformou totalmente né acho que é importante as pessoas saberem eu sempre falal para meus amigos né Vocês descem a serra e acha que Santos é só o
lugar da praia uhum e não conhece a história né Santos teve uma política Pioneira em relação a HIV aides Santos teve uma política de saúde importante com as policlínicas eh saúde mental saúde mental na cultura também o SESC de Santos é incrível quando Ten o mirada o festival de teatro lá em Santos da América Latina vão grupos de vários lugares da América do Sul Santos tem uma uma tradição interessante na cultura na saúde na música música também só que infelizmente a cidade que já foi considerada cidade vermelha né Foi se tornando uma cidade muito conservadora
E como você disse muito bem a arquitetura acho que vai acompanhando esse pensamento parece né porque a gente vê a transformação na cidade né como você eh ignora ou destrói o o velho para construir algo novo que se acredita ser moderno exatamente e e depois a gente vai eh quer conhecer lugares com história né imagina o porto de Santos maior porto da América Latina por Porto o centro histórico de Santos bolsa do café oeiro de Santa Catarina todos os imigrantes que passaram por lá imigrantes que passaram a a a militância em Santos movimentos sociais de
base meu pai era Sindicalista sindicos ativadores do movimento negro a gente teve figuras muito importantes o organizações negras muito importantes em Santos como a Casa de Cultura da mulher negra onde eu trabalhei trabalhou sim por alguns anos e que pautou o debate sobre educação né antes da lei 10639 A Casa de Cultura organizou vários seminários sobre educação antirracista no início dos anos 2000 quando ninguém falava ninguém falava sobre isso estava debatendo cotas e 1999 eu lembro de eu participar de eventos ali na casa de cultura da mulher negra falando de coisas que muito tempo depois
foi ser implementada então acho que é muito importante as pessoas olharem Santos ao mesmo tempo não é esse lugar que as pessoas pensam né que é só das férias Santos tem a zona noroeste S que é uma região mais empobrecida da cidade Santos tem a maior favela de palafitas do Brasil que é o Dick da Vila Gilda há uns anos atrás eu fiz um trabalho ali de reportagem com a entrevistando as mulheres do Dick da Vila Gilda que vive em palafitas em condições absolutamente desumanas indignas então é muito importante também virar esse olhar de conhecer
a cidade que é uma cidade de muitos trabalhadores os morros de Santos Uhum Então acho que eh conhecer essa história é importante e a gente também eh questionar para onde essa cidade tá indo infelizmente e essa visão de gentrificação de apagamento de tantas coisas históricas na cidade Como que essa Juventude Santista talvez nem conheçam muito da história da própria cidade que teve vários Quilombos também em Santos sim existem pessoas que eu conheço até hoje lá Augusta França que é uma lutadora ali da cidade que ela faz todo um um passeio pela pelos pontos negros das
cidade de Santos mostrando PR as pessoas aqui foi um como que as pessoas ficam surpresas porque elas desconhecem então tem muita gente ainda fazendo coisa boa eu tenho uma conexão ainda com a cidade de tá próxima ainda dessa militância que foi uma militância que me formou sim eu sempre volto Eu participo de eventos ali porque o pessoal ali tá Resistindo é uma resistência porque há um processo de apagamento de destruição do passado mesmo que se revela mais visível na arquitetura exatamente acho que é muito forte desse desse passado e e até o o você me
chamou muita atenção para isso no seu livro de Jamila do apagamento da história eh dos negros que vieram para o Brasil e que a gente na escola só só conhece eh eles como escravos como se não não existissem antes e nem depois né e não são escravos São pessoas que tinham um passado não é sim que tinha história foram tinham história e a gente por que que houve né como é que a gente fala democracia racial quando a gente o nosso currículo escolar nos conta eh uma parte só que é o lado do colonizador né
que a gente aprende sobre a população negra na escola como dizia o Walter bjam né a história contada pelo ponto de vista dos vencedores né E se a gente não contar a história contrapelo ele vai dizer Os Vencedores nunca cessam de vencer e acho que essa que é a grande questão né Depois o Brasil foi o último país das Américas a abolir a escravidão isso é muito importante de ser dito e depois a lei a hora ela tem um parágrafo está extinta a escravidão e essa lei não veio acompanhada de políticas públicas de reparação pra
população negra Então imagina o que é trabalhar quase quatro séculos forçadamente e depois acaba a escravidão e não se tem nenhum tipo de política para incluir a população negra na sociedade pelo contrário se incentiva a vinda dos Imigrantes europeus para cumprir essa política do branqueamento porque acreditava-se que negros representavam um atraso e claro vieram em condições difíceis mas não vieram como escravizados e muitas pessoas não desconhecem que esse muitos desses europeus receberam Terras do estado brasileiro que muitos intelectuais negros vão dizer que é um dos primeiros atos de ação afirmativa Então o que a gente
chama de colônia colônia italiana colônia alemã colônia portuguesa sim e a população negra não recebeu nada é quando começa o processo de favelização porque que que onde elesin e que é a realidade até hoje então escravidão não é algo do passado escravidão é algo que estrutura as desigualdades no nosso país N E aí quando a gente vai lutar por cotas muitos tempos muito tempo depois muitos descendentes desses Imigrantes europeus Foram contra sem saber que os ancestrais também foram beneficiados então é muito importante conhecer a história né e o mito da democracia racial que vem no
pós Abolição também não é à toa então a maneira do Estado brasileiro não se responsabilizar por reparar todos esses séculos de exploração econômica da população negra porque se eu reconheço eu tenho que reparar Então vamos dizer que não existe foi deliberado e isso atrasou demais o avanço da população negra os movimentos negros foram fundamentais em refutar esse mito para que o estado brasileiro se reconhecesse um estado racista para a partir disso poder criar políticas públicas para reparar a população negra por esse local causto negro de quase quatro séculos que foi a escravidão e são políticas
que são absurdamente recentes inacreditavelmente recentes Mas você já tem hoje uma população muito preparada porque você tinha muito antigamente uma coisa Ah nós não encontramos pessoas qualificadas e hoje você tem pessoas qualificadas pessoas negras qualificadas em todas as áreas né então não é mais uma descul Graças essas políticas pú educação e eu acho que não só as políticas de cotas que foram fundamentais mas a política de expansão das Universidades públicas paraa une e a política de expansão porque eu estudei numa num Campus que foi fundado em 2007 Uhum eu sou da turma de 2008 em
Santos agora tem um campus da federal de São Paulo em guarulos de Adema essa expansão das Universidades públicas e dos institutos federais foram muito importantes Eu lembro que em 2019 fazer um um lançamento em Mossoró no Rio Grande do Norte e aí uma professora viu que eu estaria em Mossoró me mandou um e-mail perguntando se eu não iria na cidade vizinha chamada Apodi que eu nunca até então não nunca tinha ouvido falar e aí a gente foi até Apodi chegando em Apodi a gente foi recebido pelos estudantes do Instituto Federal cantando Nordeste independente ah gente
e eles estavam trabalhando nos meus livros lá e foi muito bonito ouvir a história daqueles estudantes eles dizendo Olha que uma comunidade Rural a podi antes não tinha esse Instituto Federal com ensino médio e profissionalizante Os estudantes tinham que ir paraa capital para Natal para estudar então significava que tinha um número muito grande de estudantes que não conseguia concluir o ensino médio porque tinha que ir pra capital e como aquele Instituto no interior do Rio Grande do Norte possibilitou que aquela comunidade de Apodi tivesse acesso a uma educação pública de qualidade e assim pudesse sonhar
em pleitear a universidade ter muito importante quando a gente fala das ações afirmativas inegavelmente que eu sou uma defensora mas aliada a essas políticas de expansão que foram fundamentais para aumentar o número de oportunidades para esses jovens no interior de cidades não só na capital mas no interior quando você tem um campus da Universidade eh da Unilab que é da Integração né da dos países africanos em cidades do interior da Bahia sim quando você tem Campos então essa expansão ela foi muito importante para pra educação pública e eu sou fruto dessas políticas de expansão das
Universidades públicas eu acho muito importante da gente reconhecer o quanto que isso quebra ciclos de exclusão que a universidade chegando onde a população tá onde a maioria tá né E que as empresas muitas vezes não chegam e quando abrem vagas dizem Ah mas não tive candidatos negros ou indígenas Talvez porque você esteja procurando no lugar errado né porque não chega e é muito importante como você falou da Universidade a gente vê muitos sotaques né no em várias áreas que tão leg e a gente muda as vidas mesmo né porque o ciclo do trabalho doméstico ele
foi quebrado na minha geração e eu sou a primeira pessoa da minha família a ter acesso à universidade Então as políticas públicas elas quebram com esses ciclos e nos dão de fato oportunidades porque o debate não é sobre capacidade capacidade Todos nós temos o debate é sobre oportunidades e quando essas oportunidades vem Isso muda porque hoje a minha filha eu fui estudar ela já tinha 3 anos defendi o mestrado ela já tinha sete mas o quanto o fato de eu ter estudado possibilita que hoje ela parta de uma outra realidade que foi diferente da minha
da minha mãe da minha avó da minha bizavó e assim por diante exatamente Jamila eu sei que o nosso tempo tá acabando de tantos assuntos que que eu podia ficar conversando aqui com você te ouvindo por muito muito tempo mas eu queria saber assim de do que a gente conversou do do seu papel na sociedade da sua luta O que que você gostaria realmente que as pessoas escutassem que a abrissem realmente né parassem Não não só para ouvir mas para escutar com o objetivo de compreender essa essa luta e essa necessidade de de transformação do
Brasil eu acho que é justamente o nome desse podcast entender a importância do lugar da escuta e não ter medo do que vai escutar e aí aprender a lidar com essas verdades agradáveis incômodas que vem quando a gente se coloca nesse lugar porque é muito importante que a gente Eu por exemplo fui criada numa sociedade homofóbica então durante muito tempo na minha vida eu reproduzir isso então eu tive que aprender todo mundo pode aprender e eu gosto de falar isso no porque o lugar da escuta ele vem eh ele é ligado à empatia mas não
a empatia nessa visão que as pessoas pensam que empatia se colocar no lugar do outro eu não acredito nessa construção de empatia porque eu nunca vou saber Adriana como uma mulher heterossexual o que que é de ter medo de apresentar a pessoa que eu amo paraa minha família o que é ter medo de ser expulsa de casa eh eu tenho amigas lésbicas que elas TM códigos quando elas andam na rua que ela tem que soltar a mão da companheira porque às ve Elas têm medo às vezes um um cara olhou eu não sei o que
que é isso porque eu sempre me relacionei com homens Então como é que eu vou dizer que é só me colocar no lugar do outro e ir para casa então eu entendo a empatia como uma construção intelectual como um processo que eu tenho que começar escutando eu fui aprender como escutando que as mulheres Lés porqueas tinham de dizer os homens gays eu fui ler sobre então exige de você um empenho exato um trabalho eu tive que matar o opressor dentro de mim eu tive que entender que muitas vezes eu fui a pessoa que produziu a
aquilo e que eu fui agente de dor para essas pessoas eu tenho que admitir isso porque aí quando eu vou entendendo a empatia como uma constituição política uma constiuição intelectual que orienta a minha prática política eu entendo a empatia com uma constiuição intelectual e política sim aí eu consigo entender que eu quero ser agente de transformação e não mais agente de dor então terminaria dizendo isso Se lugar da escuta ele vem acompanhado com um processo que vai exigir empenho esforço seu que não vai ser que muitas vezes você vai se chocar vai ser difícil mas
não há outro caminho possível e essa empatia ela passa necessariamente por a gente escutar por a gente ler por a gente assistir outras coisas pra gente compreender aceitar porque aí isso orienta aí você vai saber o que fazer exato quando você entende que essa escuta vem acompanhada de todo esse processo que vai exigir de você empenho e esforço Jamila Muito obrigada agora também como mãe por ser representatividade para minha filha por ser motivo de orgulho pra gente e e para todos os brasileiros obri Obrigada foi um [Música] prazer
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