Bebês reborn: interpretação psicanalítica

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Fábio Belo
00:00 a 07:59 - Estranho familiar 08:00 a 09:54 - brincar para psicanálise 09:55 a 12:00 - o bebê...
Video Transcript:
Olá, pessoal. Hoje nós vamos conversar sobre os bebê [Música] [Aplausos] [Música] reborn. Pessoal, tá na moda aí os bebezinhos Reborn, né?
desses bonequinhos hiper realistas de silicone, assim, um negócio bem assustador quando eu vi assim me pareceu esquisito. Vou começar por isso, o estranho, a coisa meio esquisita que eu senti que me parece remeter a um texto do Freud, o estranho familiar, um Heimless. É uma palavra interessante.
Ele vai conversar bastante sobre essa palavra, origem dela, um texto longo sobre essas sensações esquisitas, né? O duplo, por exemplo, é um dos elementos estranhos que o Freud vai examinar nesse texto, né? Quando a gente se depara, por exemplo, com o nosso reflexo ou com um outro eu nosso fora do nosso corpo, por assim dizer, né?
O Saramago tem um romance maravilhoso sobre isso, Dostoyevski também, né? um conto maior sobre o duplo. Enfim, foi um exemplo literário muito explorado por vários autores.
Aparece essa coisa do esquisito também, do estranho, quando a gente trabalha com seres inanimados que ganham vida. De repente, o boneco certamente é um dos elementos mais presentes, né, dessa produção de sensação do Heimless. O que que é o estranho familiar?
Então, primeira definição aí pra gente pensar numa interpretação psicanalítica do bebê reborn. O estranho familiar é aquilo que deveria ter permanecido recalcado, mas veio à tona, trouxe algo que tava reprimido. O que que pode ter sido trazido por esses bebês reborn, esses bonecos quase perfeitos, de imitação muito, muito bem feita da pele, do olhar?
Muitas vezes posso imaginar agora muito brevemente, né, com a inteligência artificial, bebês que podem falar alguma coisinha, se alimentar, fazer xixi, fazer cocô, enfim, algo que a gente vai desenvolver certamente como tem desenvolvido no Japão, na China, enfim, esses robôs e bebês que vão alimentar ainda mais essa sensação esquisita, estranha. o que que tá sendo trazido à tona, o que que tava recalcado, reprimido, que tá voltando, porque é simples interpretar o bebê Reborn como o desejo de continuar brincando de boneca, que aliás é uma interpretação super válida e super legal. A gente continua brincando mesmo, né?
E, aliás, o brincar pro Freud, né? O Freud vai dizer isso textualmente, né? no texto dele Os escritores criativos e devaneio, quando ele diz o seguinte: "Seria errado supor que a criança não leva esse mundo a sério, ao contrário, leva muito a sério a sua brincadeira e dispende na mesma muita emoção.
" A antítese do brincar não é o que é sério, mas o que é real. Então, tem uma seriedade aqui do brincar que eu acho que a gente vai encontrar no bebê Reborn, né? das pessoas que vão ali pros parques, né?
Tem encontros de todo mundo que tá também colecionando esses bebês. Geralmente não é um bebê só, são vários, né? Então assim, tem uma coisa séria que eu acho uma brincadeira como qualquer outra que os adultos continuam a brincar.
Então, a princípio, gente, inclusive importante destacar isso, não há nada a princípio que seja psicopatológico, né, numa ação como essa, brincar ou colecionar bonecos, né, enfim, livros, o que quer que seja. Não tem nada patológico nisso a princípio. O que seria patológico, claro, pros nossos padrões em termos de psicose, por exemplo, acreditar que o boneco tem vida.
Aí sim, mas a maioria das pessoas, claro, sabe que aquilo ali é uma brincadeira, mesmo que leva essa brincadeira muito a sério, né? É muito caro, compra roupinha, sai para passear com bonequinho, etc. Então, mas a princípio eles sabem que é um boneco, mesmo que eles gostem muito dos seus bonecos, né?
Isso vai valer para praticamente todos os objetos de afeto que a gente tem também. Não é uma coisa exclusiva, né, dos bebê Reborn. livros muito caros, por exemplo, de colecionadores, vão ser tratados, né, com uma devoção enorme.
Então, não quer dizer que o sujeito seja psicótico porque tá adorando um pedaço de papel, não. Tem algo ali simbólico, importante que tá sendo investido, tem um investimento libidinal acontecendo ali. Então, a primeira coisa que tá vindo à tona, talvez, seja esse brincar infantil que deveria ter permanecido recalcado.
É estranho ver pessoas adultas brincando de boneco, pessoas que supostamente deveriam já est preocupadas com bebês reais, né, seres humanos e, enfim, atividades adultas, consideradas adultas, estejam ali brincando como crianças. Talvez esse seja o elemento primeiro, estranho, esquisito, que vem à tona. E a gente se pergunta, mas por que que aquele casal, às vezes, um casal gay, eu vi uma reportagem pesquisando sobre o tema, um casal gay, dois homens adultos adotando um bebê reborn, né, e saindo para passear e trocando a roupinha.
Mas seria mais interessante adotar um bebê, né, ou sei lá, ir para um orfanato e ajudar uma criança a pagar a escola, né, ser um pai adotivo de escola, sei lá, alguma coisa nesse sentido adulto do que um bebê de silicone? essa sensação que é meio já de julgamento, né, assim, é um julgamento meio que a gente também endereçou muito aos pais de pet, famoso pai de pet, né, assim, pô, a pessoa trata melhor um cachorro, um gatinho do que uma criança de rua, né? Ele não adota uma criança, mas paga sua festa de aniversário, um bolo de aniversário para um cachorrinho.
Tem um julgamento, óbvio, que faz parte da nossa moralidade burguesa, de que a gente tem que tratar bem os seres humanos, em especial as crianças humanas. Mas tirando esse julgamento que obviamente pode ser contestado, né? Cada um brinca do que quiser, na hora que quiser, gasta o seu próprio dinheiro como quiser.
Então, o estranho é de fato alguma coisa que deveria ser reprimido em termos da nossa moralidade, que é esse brincar que a gente não considera adulto, um brincar com um boneco, mas tem tanto brincar que a gente vai considerar normal e que, de um outro ponto de vista pode ser considerado meio bobo, por exemplo, né? Muita gente considera colecionar pequenos objetos ou pequenos bonequinhos que não sejam os bebês também um excesso, alguma coisa excessiva, estranha, algo que produz muito investimento para pouco sentido, por assim dizer. Mas cada um vai ter um estilo, cada um vai ter também um modo de gozar que é muito singular.
Não tem como pegar esses elementos e simplesmente dizer: "Ah, né, existe um brincar adulto que deve ser seguido por todos nós, sem exceção. " Isso seria perverso, na verdade, né? Obrigar todo mundo a brincar da mesma forma.
Mas enfim, a primeira interpretação que me veio foi essa. Tem algo do infantil, brincar de boneco, brincar com alguma coisa que deveria ser, né, da criança. E eu me aproprio disso enquanto adulto, de tal maneira a não abandonar, né, alguma coisa que deveria ter permanecido já reprimido, já no campo do infantil.
Brincar para psicanálise significa corrigir a realidade de alguma forma. Quando a gente brinca, essa é uma tese do Freud que tá lá, escritores criativos e devaneio, a gente tá, na verdade, transformando a realidade para realizar os nossos desejos. Então, eu pego duas canetinhas como essas aqui, né, e falo que esse é um soldadinho que vai matar o outro e eu consigo transformar por um momento isso aqui em soldadinhos e numa guerra para assassinar, para torturar, etc.
E esses desejos, matar, torturar, por exemplo, ou amar e dar beijinhos, etc. , esses desejos, que podem ser quaisquer desejos, tem a ver com os nossos desejos mais ou menos reprimidos, mais ou menos recalcados, que a gente acaba realizando na brincadeira. O Freud é genial apontar que o brincar vai continuar ao longo de toda a nossa vida.
Vai continuar, por exemplo, na escrita criativa, na literatura, na arte, no cinema. É uma maneira adulta de continuar brincando. Quando a gente lê um romance bem escrito, né?
Vai ao cinema, vê uma obra de arte, a gente tá continuando a brincar nesse sentido fradiano, transformando a realidade, realizando desejos por meio de fantasias, que é uma continuidade do brincar. O fantasiar é uma continuidade do brincar. O sonhar é uma continuidade do brincar.
A gente inventa histórias para realizar desejos. Ora, quais desejos a gente tem e tá realizando quando tem um bonequinho praticamente verdadeiro, um desejo de ter um bebê. Vamos começar pelo óbvio, né?
Essas pessoas desejam ter um bebê. Mas qual o bebê? Aí a gente pode continuar essas interpretações a partir desse desejo.
Então, o bebê reborn significa, a pessoa tem um desejo de ter um bebê, mas qual? Um bebê perdido, por exemplo, a gente pode imaginar algum caso trágico de uma mãe, um pai que perde o seu bebê e fabrica um bebê de silicone, às vezes com a mesma imagem do seu bebê, por exemplo, né? Aliás, eu acho que tem um livro do José de Alencar, acho que é encarnação, não é isso que chama?
Depois eu vou pesquisar esse livro, um romance do Jess Elencar, onde, por exemplo, você pode estar ali apaixonado por uma estátua, uma imagem da mulher amada que você perdeu. Os mitos certamente trabalharam com isso, né? A gente produzia a imagem, a estátua, né?
o outro, um duplo desse objeto perdido. Talvez esse bebezinho seja a impossibilidade de fazer um luto, a dificuldade, a recusa de fazer o luto por um bebê perdido. Então, mais uma interpretação do bebê reborn.
Ah, um bebê perdido que eu não gostaria de ter perdido. Qual bebê? O bebê que eu tive, perdi.
O bebê que eu fui e que eu não gostaria de ter deixado de ser. o bebê que eu gostaria de ter tido, mas escolhi não ter, então eu vou ter esse bebê de qualquer maneira. Então vamos interpretar o bebê Reborn assim pela valor de face que ele tem, né?
É um bebê, então é um bebê que eu gostaria de ter tido. É uma problemática do luto num certo sentido, que o bebê Reborn traz pra gente. Então isso também vai aparecer na literatura e outras formas de brincar, né?
a gente pode escrever um livro, escrever um romance para recuperar objetos também perdidos, objetos que a gente gostaria de ter tido e não pôde ter e daí por diante. Isso pode se dar também no brincar com um bonequinho de verdade e pode inclusive se dar quando a gente tem um bebê de verdade. Eu vou ler uma passagem da Melanic Line para vocês, pra gente ver isso, né?
Quando a gente tem um bebê também, a gente pode voltar a brincar com esse bebê, inclusive usando os bonecos, enfim, usando o próprio bebê como boneco, de tal maneira recuperar coisas infantis lá da nossa história. Esse bebê Reborn é um bebê curioso, né? Assim, um bebê que não vai crescer nunca, é um bebê também que não vai demandar das coisas, né?
Um bebê sem alteridade, por assim dizer, né? Uma alteridade muito sob controle. Isso aumenta, a meu ver, esse grau de estranheza, né, que eu disse no início do vídeo, esse estranho familiar, né, porque é familiar, é um bebê, mas é completamente estranho ao funcionamento de um bebê, porque o bebê é, como a Lisa Barister vai nos ensinar, é aquilo que produz uma ética da interrupção, né?
Aquilo que vai fazer com que a gente interrompa os nossos processos, né? O bebê acorda, a gente no meio da noite, modifica o nosso corpo, né, na amamentação, no sono, no dia a dia. Uma ética da interrupção ininterrupta, né?
A gente não vai almoçar do mesmo jeito, não vai dormir do mesmo jeito, a gente tem que brincar e parar o tempo, enfim, a gente não tem mais a mesma rotininha antes do bebê, porque aquela alteridade, a alteridade do bebê é uma alteridade disruptiva. Ela tá sempre demandando, ela tá sempre rompendo os nossos processos que estavam ali muito estabilizados na vida adulta. Então o bebê estabelece isso que a barista chama de uma ética da interrupção.
Eu gosto muito disso. Um bebê reborn jamais vai produzir isso. Você cansou de brincar, você coloca no guarda-roupa, você deixa lá na caminha, né?
Mais uma vez, a gente pode aí pensar nos graus de saúde psíquica. Se o sujeito ouve, alucina esse bebê convocá-lo, né, chorando no bercinho, aí a gente começa a conversar sobre outras coisas. Mas de maneira geral, tô imaginando que esse sujeito vai brincar com esse bebê como uma criança brinca.
Tá na hora de brincar, tá na hora de brincar. Então eu vou fingir que eu que ele tá chorando, que ele tá com fome, que eu quero trocar a fraldinha. Ótimo.
Parou de brincar, deixou lá. Eu não tô ouvindo o bebê mais à noite, não vou acordar com o neném chorando. Se eu acordar com o neném chorando, o bebê reborn chorando, então a gente pode começar a falar de outros problemas, inclusive sobre as psicoses.
Mas insisto, a princípio, não tem por associar essa brincadeira às psicoses ou a qualquer outro tipo de psicopatologia. É um brincar como outro qualquer. O que é salientado, né, nessa brincadeira é esse bebê sem caos.
é o bebê sem afeto produzido por essa alteridade que a gente não consegue controlar. E aí para quem já teve neném de verdade, a gente não consegue controlar esses afetos, né? O bebê chora, né?
O bebê tem cólica, o bebê tá com fome, a gente não sabe exatamente o que fazer. É muito difícil essa rotininha da gente entendendo essa alteridade nova que vai aparecendo, é uma nova subjetividade que vai aparecendo. Então assim, é sempre um pouco caótico, nunca é absolutamente estável, absolutamente tranquilo.
É uma alteridade que vai aparecendo o tempo todo. Nesse sentido, esse bebê sob controle, né, assim, totalmente controlável, talvez alimente essa sensação do estranho familiar aqui no sentido de uma relação onde o controle, a onipotente esteja no centro da coisa, que é algo estranho, familiar, nesse sentido de que talvez muitos de nós já tenhamos experimentado isso, seja como os pais, seja como criança, de que alguém quer de fato controlar a gente de maneira onipotente. né?
Esse desejo dos pais de controlar o bebê, às vezes paraa segurança do próprio bebê, eu quero saber se tá com fome, se fez cocô, que que ele tá sentindo, etc. Mas é um desejo onipotente infantil. A gente nunca vai controlar um bebê, a gente nunca vai saber tudo que ele tá fazendo, acontecendo, etc.
, né? Da mesma forma que a gente pode se sentir controlado de forma onipotente, isso é muitas vezes muito bom. Haja visto, por exemplo, nossa relação com Deus, né?
A maioria das pessoas acha isso muito bom. de Deus tá me vendo, Deus tá, ele é fiel, ele não deixa de me proteger, né? Meus pais também, né?
Meus pais sempre sabem o que fazer, etc. Essa onipotência muitas vezes é boa, mas é muitas vezes é invasiva, terrível, alguma coisa horrorosa. É esse um Heimless que volta também a algo da onipotência, algo do controle absoluto que tá voltando nessa relação.
Eu costumo brincar com uma frase do Lacã, uma frase muito famosa, né, na qual ele fala que a relação sexual não existe. Eu costumo dizer que o que há em toda a relação é o sexual. Eu acho que é o justo oposto disso, né?
Eu entendo a o sentido da frase do Lacan. Obviamente deve ter outros sentidos e queria que vocês me explicassem aí no comentário. O sentido mais ou menos, né, que eu atribuo a essa frase do Lacan é que a diferença sexual estabelece uma série de diferenças também, né?
Diferenças entre singularidades que tornam impossível a relação sexual. A gente tá sempre se relacionando com a fantasia um do outro, nunca diretamente com o objeto, né? A gente tá sempre fantasiando aquilo que o outro quer da gente, aquilo que a gente espera do outro, o outro espera algo de nós que a gente não é ou que a gente nem tem.
Outra frase muito associada a essa relação sexual que não existe é amar é dar o que não se tem. Então o Lacan é bem radical e trágico, né, nesse sentido, né, porque assim, a gente ama a partir de outro lugar, a gente ama a partir do inconsciente, né? Então, a relação sexual no sentido pleno do encontro, daquilo que, nossa, existe uma complementariedade completa e vai dar tudo certinho, isso aí realmente não existe.
O Lacan, eu acho que tá querendo então salientar, né, com esse estilo dele bem hiperbólico, é que a relação sexual não existe. Não existe uma complementariedade, um desejo tão pleno assim. O que eu quero enfatizar quando eu digo que o que há em toda a relação é o sexual, é com Laplanche aí, né?
Um outro autor que eu gosto bastante é pensar que em toda a relação a gente vai ter a presença de fantasias, excitações, algo do inconsciente que inevitavelmente vai invadir aquela relação e vai determinar aquelas relações. Então o sexual é o que há de toda relação. Mesmo com o bebê reborn, eu tô retomando minhas fantasias infantis.
Eu realizo de fato algo de sexual. Portanto, o que há nas relações são as relações sexuais, né? A relação sexual é o que existe na relação com o objeto, porque o sexual tá ali sempre presente.
É inevitável que ele esteja presente. A gente sempre vai realizar algum desejo, vai repetir algum desejo. A transferência sempre vai acontecer quando a gente tá se relacionando com o objeto.
Quando a gente tá se relacionando com o objeto bebê reborn, a gente tá se relacionando com o bebê que a gente gostaria de ter tido, com o bebê que a gente teve, com o bebê higienizado, idealizado e sem caos, no controle dos afetos que a gente gostaria de produzir. O sexual tá lá. Esse objeto que eu tô produzindo, investindo, é uma realização de uma relação afetivo sexual estabelecido pelas minhas fantasias inconscientes.
Tá acontecendo de fato, talvez para não deixar acontecer outras relações, relações, por exemplo, com um bebê de verdade ou com uma pessoa de verdade, etc. Ou para deixar ela acontecer, produzir com outras relações de verdade a partir desse bebezinho reborn. Então, com o meu marido, eu posso adotar esse bebê aqui.
Um bebê de verdade a gente não daria conta, mas a gente dá conta de brincar com esse bebezinho reborn. Ótimo. E algo do sexual aparece.
Algo se movimenta do carinho, do brincar, de estar junto ali com esse bebezinho reborn. Qual que é o problema, né? nas entrevistas que eu vi, né, fazendo pesquisa sobre o tema, uma senhora que era cega, por exemplo, brincava com os seus bebês.
E se foi o único bebê que ela se autorizou e deu conta e ficou tranquila de ter, foram esses bebês reward, qual que é o problema? Ali se realizou algo do sexual, ali se realizou algo da sua fantasia, então é por ali que ela deve se autorizar mesmo. Algo do sexual se realiza de fato, algo do inconsciente se realiza quando a gente tem esse bebezinho.
Então, a princípio, é claro que a gente vai interpretar no sentido de, ah, é uma relação que quer poupar o sujeito do mal-estar, de tá ali se relacionando com o outro. De fato, Freud, no livro dele, O Mal-estar na civilização, aponta a presença do outro como sendo de verdade uma das grandes fontes do mal-estar humano. É a relação com o outro.
O que há é o sexual em toda relação. Por isso que o mal-estar é inevitável, porque desencontra, porque a gente quer realizar as nossas fantasias usando o outro como objeto, né? Muitas vezes não encaixa mesmo, né?
Então queria sugerir aqui que de fato uma interpretação pode ser essa mesmo, uma interpretação que diz: "O bebê reborn é uma relação com o bebê a prova de mal-estar, a prova de caos". Sim, mas acho que isso é psicopatologizar muito rápido um brincar que também é um brincar que pode trazer satisfação, que pode trazer um contato com fantasias que sejam fantasias que o sujeito só se autoriza a brincar dessa maneira. Então me parece OK também.
Não tem nada, insisto, psicopatológico, né, em querer evitar um pouquinho o mal-estar que as relações humanas podem produzir. Se você tá me acompanhando até aqui, lembre-se, você tá num projeto de extensão da UFMG, um projeto que se chama Conversas Virtuais sobre a Psicanálise, que tem como objetivo divulgar a pesquisa psicanalítica produzida aqui no Brasil e no mundo e que também tá a fim de discutir a psicanálise em termos científicos paraa divulgação científica popular de maneira didática, aberta, pública e gratuita. Para esse projeto continuar existindo, se inscreva aí no canal, comente, curta, compartilhe, né?
Converse com os amigos, indique o canal, por favor. É muito importante pra gente continuar a crescer. Para terminar, queria falar de duas coisas.
Ah, primeira sobre esse elemento sinistro agora, né, mais pro campo maligno que pode aparecer ligado a esses bonecos e uma citação da Melanie Kleine com a qual eu vou terminar esse vídeo pra gente interpretar também de maneira pormenorizada alguns desejos que podem estar presentes aí no bebê Reborn. Então primeiro ponto é lembrar também, gente, assim, recomendo aqui o vídeo da Tatavernec chamado Juju Carente, que eu acho que é um dos elementos assim mais engraçados, um dos vídeos mais engraçados dela, uma excelente comediante brasileira que fez a Juju Carente, né, que é uma bonequinha que fica ali perseguindo a menininha, perguntando: "Você me ama? Você me ama?
Você me ama? " obviamente fazendo referência a uma tonelada de filmes nos quais os bonecos ganham vida e ganham vida para matar, né? para matar, para assassinar, para ser violento, ser agressivo.
Então, vamos lembrar ao lado de Toy Story, por exemplo, que eu acho que é uma das grandes invenções, né, do cinema contemporâneo. Lindo, lindo a, né, a ideia do Toy Story dos brinquedos que ganham vida, que conversam, que brincam, que ajudam o menininho, mostrando, né, a vivacidade, né, imaginativa e fantasística da criança. Essa série de filmes é simplesmente maravilhosa, né, pra gente entender como é viva a criatividade da criança.
Ao lado disso, a gente tem esses brinquedos sinistros, né? Chuck é o grande bonequinho sinistro que a gente tem. Não sei se vocês lembram, se vocês são dessa época do fofão, dos mitos que circulavam em torno do fofão.
Eu tinha o fofão e ficava com medo dele de vez em quando de ter uma faca enterrada ali no fofão, né? alguma coisa terrível do Fofão, que o fofão ia acordar de noite, ia matar as pessoas. Então, essa mítica em volta dos bonecos assassinos, os bonecos que vão ser vingativos ou sádicos com a criança, dizem respeito a esse elemento sinistro do estranho familiar.
Algo da criança pode de repente aparecer projetado ali naquele boneco e os desejos muito maus, né, os desejos sádicos da criança serem realizados por meio daqueles bonequinhos. É uma interpretação bem cliniana que a gente pode fazer desse tipo de lógica, né, dos bonecos. Os bonecos estão ali querendo matar também, querendo assassinar a gente, querendo partir a gente em pedaços.
A criança tá fantasiando essas coisas. Basta ler Melanic Line, vocês vão ter acesso a essas fantasias sádicas, esquisoparanoides, muito violentas das crianças, né? A criança não tá só querendo ser boazinha, tá tranquilinha, né?
E tudo ser bonitinho. Não. A criança também tá passando por coisas muito terríveis, né?
Tendo fantasias muito terríveis de de laceramento, de violência. Isso de maneira geral é recalcado, né? Isso de maneira geral é reprimido.
Isso volta. O reprimido volta. recalcado retorna e muitas vezes retorna na fantasia, no cinema, no sonho, no fantasiário e no brincar.
Então, o brinquedo pode ganhar vida e se tornar também algo persecutório, violento. Então, tô trazendo esse tema aqui no bebê Reborn, porque o bebê Reborn ele é de alguma maneira sinistro pra gente, estranho familiar também, porque ele remete a algo que pode ser muito nocivo, que é isso assim, essa ideia do hipercontrole, da unipotência do bebê, etc. Então, é nesse sentido que eu tô pensando toda essa lógica aqui que tá circulando em torno do bebê reborn.
Para terminar, eu queria ler um parágrafo da Melanie Klein, um dos meus textos prediletos, amor, culpa e reparação, que tá aqui nessa edição da Melanie Klein, editada pela imago, amor, culpa e reparação, na página 358. A Melanie Klein diz o seguinte: "Pode-se observar todos os dias que as meninas pequenas brincam com bonecas como se estas fossem seus bebês? A criança muitas vezes demonstra uma devoção apaixonada pela boneca, que a seus olhos se torna um bebê real, uma companheira, uma amiga que faz parte de sua vida.
Além de carregá-la consigo, a menina pensa sempre nela, começa o dia ao seu lado e a entrega a contragosto quando é obrigada a fazer alguma outra coisa. Esses desejos experimentados na infância permanecem até a idade adulta e contribuem em muito paraa força do amor que a mulher grávida sente pela criança que cresce dentro de si e pelo bebê que ela dá à luz. Queria parar aqui.
Observem como a Melanie Kly é genial. O desejo que a menininha tem pela bonequinha permanece e isso vai ser utilizado inclusive para que ela ame o seu bebezinho de verdade, tal como amou aquela bonequinha lá atrás. Então vocês vejam como que as coisas são complexas, né?
O o bebezinho que a gente brinca no início da vida. Por isso que é importante, né? Que os meninos também brinquem de bonecas, brinquem com os bonequinhos, né?
principalmente de cuidar dos bonequinhos pra gente aprender a ser pai de maneira mais tranquila depois, né? Importante autorizar os meninos a brincarem de cuidar, né? Porque depois para ser pai a gente vai ter que aprender isso e que a gente nunca foi autorizado a brincar disso antes, né?
Então, quando eu vejo esses bebês reborns assim sendo cuidados pelos homens, também imagino esse tipo de desejo sendo satisfeito. Agora eu posso brincar, agora eu posso ser autorizado a brincar com os bonequinhos que eu queria ter brincado de cuidar lá atrás. Então, olha só, a Melanie Klein apontando pro brincar com a boneca que permanece ao longo da vida adulta.
Vamos seguir com ela. A gratificação de finalmente ter esse filho alivia a dor da frustração sentida na infância quando queria ter um bebê do pai e não pôde. A realização adiada de um desejo tão importante tende a torná-la menos agressiva e aumentar a sua capacidade de amar o filho.
Além disso, o caráter indefeso da criança e sua grande necessidade dos cuidados da mãe exigem mais amor do que pode ser dado a qualquer outra pessoa, o que fornece um objetivo para todas as tendências carinhosas e construtivas da mãe. Aqui a Melanie Klein dá aula sobre o desejo que tá ali reprimido, o desejo da menininha de ter tido um filho do pai, complexo de Éspo, bem clássico aqui lido pela Melanie Klein, de como que o desamparo do bebê se articula um pouquinho ao desamparo da mãe e como que isso mobiliza as forças construtivas, as forças ligadas à dádiva, né, que a mãe vai colocar em ação para acolher o bebê e amar o bebê. Então, queria grifar também essa ideia aqui dessa necessidade de cuidado do bebê.
Alguma coisa disso é retomada quando a gente brinca com o bebê reborn. a, o desamparo, a dependência, a gente entra em contato com essas coisas de tá ali tentando analisar ou elaborar, perlaborar alguma coisa da dependência, alguma coisa da insuficiência da vida do bebezinho, que brincando com isso a gente consegue elaborar um pouco. É como se fosse uma terapia mesmo, um certo sentido, desses elementos ligados à dependência, ao desamparo, que agora a gente consegue brincando, elaborar, simbolizar.
Continua Melanie Cle. Algumas mães, como já sabemos, exploram esse relacionamento para a gratificação dos seus próprios desejos. Isto é, o seu sentimento de posse e a satisfação de ter alguém que dependa totalmente delas.
Essas mães querem que os filhos se prendam a elas e detestam quando eles crescem e adquirem sua própria individualidade. Então, a ideia aqui da Melanie Klein, termino a leitura dessa citação com essa passagem para vocês verem que isso pode acontecer com os próprios bebês humanos. E isso é terrível quando isso acontece.
esse tipo de insexualidade na qual uma mãe determina o fim da individualidade ou da autonomia dos seus filhos, porque elas desejam muito a dependência dos seus filhos, desejam muito que esses bebês continuem bebês para sempre. Então, o bebê reborn talvez traga à tona o recalcado mais terrível que a gente tenha experimentado na relação com os nossos pais, em especial com as nossas mães. A gente poderia ter ficado preso lá como um bebê para sempre.
Isso é o sexual, esse elemento sexual na maternidade de que elas poderia nos prender ali para sempre na dependência, num aparente cuidado que nos colocaria para sempre no avesso da autonomia, no desamparo, na dependência absoluta. Esse é o horror, nunca crescer. Então essa ideia de tá ali preso na terra do nunca é absolutamente apavorante.
Por isso traz um certo mal-estar também esse bebêborn muitas pessoas. Isso produz uma certa aversão. As pessoas vão xingar as pessoas de loucas e psicóticas e não sei o quê por conta dessa aversão.
Então peço especial cuidado com isso, né? Tem nada de loucura em si, né? Nesse tipo de brincadeira de forma nenhuma.
O que tá trazendo à tona são esses elementos sexuais das fantasias inconscientes que brincar com um bebê produz. Sempre vão produzir algo muito muito poderoso na gente. É esse o ponto que o bebê Reborn traz, né?
dessas múltiplas fantasias que eles vão trazer, desde as fantasias muito gostosas, muito importantes da recuperação do brincar, de um luto que tá para ser feito e que tá sendo feito nesse brincar, né? Às vezes um luto impossível, né? Que tem que tá ali simbolizado com o bebezinho de brinquedo, mas que é super importante, né?
Então, algo muito muito impactante do ponto de vista simbólico na vida de alguém até obviamente as psicoses, né, aquilo que é avesso, a a alteridade de verdade, né, o caos dos afetos que as relações humanas podem trazer. Então assim, a gente tá falando de um fenômeno, gente, como sempre, né, todo fenômeno humano multifacetado, com muitas razões, com muitas causas afetivas que não devem ser reduzidas a um elemento só. A gente tá sempre aberto aqui a pensar em como que o sexual, os afetos, as fantasias mobilizam qualquer brincar, qualquer atividade humana.
Essa é mais uma delas. Então, sempre muito cuidado, muita cautela para interpretar esse tipo de fenômeno como algo psicopatológico. Não é de jeito nenhum, né, assim, pode ser, né, mas não é imediatamente algo patológico, né, algo que tem a ver com o brincar, que tem a ver com a recuperação de alguns elementos das nossas fantasias infantis.
Então, era isso. Se você gostou, mais uma vez eu peço que compartilhem, curtam, se inscrevam no canal, ajudem esse canal a crescer. A gente tá num projeto de extensão da Universidade Federal de Minas Gerais, uma universidade pública, gratuita e de qualidade, laica e de todos nós.
Espero vocês na próxima. Até lá.
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